O andamento do processo envolvendo o assassinato de Maria Elizabeth Rosa Pereira, 65 anos, presidente da Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul (Agergs), depende de uma perícia psiquiátrica. O policial militar da reserva José Pedro da Rocha Tavares, 50 anos, que responde em prisão domiciliar pelo feminicídio da namorada, ocorrido há mais de um ano, passará pela avaliação de saúde mental. A advogada foi morta em 17 de abril, na casa do réu, no bairro Partenon, em Porto Alegre. A defesa nega que ele tenha cometido o crime por questões de gênero.
A defesa do réu pediu que ele passe por exames para verificar se tinha capacidade mental de compreender os fatos na época do crime. O pedido foi acatado pela Justiça, que considerou na decisão o longo histórico do acusado em relação a tratamentos da saúde mental, bem como utilização de medicação controlada. Por isso, em outubro do ano passado, foi instaurado o chamado incidente de insanidade mental. Enquanto isso, segundo a 4ª Vara do Júri, o processo se encontra suspenso.
A criminalista Karla Sampaio, que atua no caso representando uma irmã da vítima, questiona a necessidade de o réu passar por perícia psiquiátrica. Segundo nota encaminhada pela advogada, menos de um ano antes do crime, o PM — que estava aposentado — havia sido aprovado em avaliação de aptidão psicológica para o porte de arma de fogo junto à Brigada Militar. A assistente de acusação entende que esse pedido busca "apenas atrasar o processo".
A avaliação que será realizada pelo Instituto Psiquiátrico Forense (IPF) foi agendada para 3 de maio. Após, em geral, são necessários cerca de 30 dias para elaboração do laudo com o resultado. Depois que ele for recebido, serão decididos os rumos do caso. Caso, ao final do incidente de insanidade, seja declarado que o réu não tinha capacidade de compreender os atos que cometeu, a Justiça pode determinar a sua internação para tratamento psiquiátrico.
Por outro lado, caso o desfecho do incidente seja pela compreensão de que o réu tinha condições, o processo criminal seguirá seu curso. Serão agendadas audiências para ouvir as testemunhas de acusação e de defesa, além de interrogar o réu. O Ministério Público (MP) indicou 11 pessoas para serem ouvidas e a defesa outras oito, num total de 19 testemunhas.
Tavares, que estava aposentado havia quatro anos quando aconteceu o crime, permaneceu custodiado pela Brigada Militar durante o período em que esteve hospitalizado. Em julho do ano passado, a defesa dele pediu que permanecesse preso em casa após a alta, em razão das sequelas causadas pelo disparo que o atingiu na cabeça no dia do crime. Desde então, o réu permanece em prisão domiciliar.
A assistente de acusação também pediu à Justiça que fosse realizada nova perícia no local do crime e reprodução simulada dos fatos, popularmente conhecida como reconstituição, por meio da qual se poderia entender a dinâmica do crime. O pedido foi atendido pela Justiça, mas a data ainda não foi agendada. "Essas avaliações são imprescindíveis para entender o que houve no local do crime e como foi a dinâmica dos fatos", afirmou a advogada na manifestação.
A vítima
Advogada, técnica tributária aposentada e ex-diretora-executiva do Procon-RS, Beth, com era conhecida, atuava também como presidente da Agergs e acumulava longa dedicação ao serviço público. Na vida pessoal, tinha como principal hobby a pintura de quadros e era apaixonada pelos netos. Em fevereiro, havia viajado para Amsterdam, na Holanda. O objetivo era visitar o filho e o casal de netos. Beth era natural de Cachoeira do Sul, na Região Central, divorciada e mãe de filho único.
GZH entrou em contato com a família de Maria Elizabeth, que preferiu encaminhar nota sobre o caso. Na manifestação, a irmã Ana Luiza Rödel afirma que a espera por respostas se soma à ausência e à saudade. "Além da falta que sentimos da Beth, que era uma mãe, irmã e amiga maravilhosa, não saber o que de fato ocorreu naquele dia é motivo de muita tristeza para todos nós", disse a irmã. "Depois de tudo o que aconteceu, o réu ainda não foi ouvido pela justiça, está em prisão domiciliar justamente dentro do local onde ocorreu o assassinato, e o tempo corre a favor dele. Queremos justiça, mas quando ela se mostra tardia, nada mais é do que uma grande injustiça", afirmou.
O caso
Na noite anterior ao crime, o irmão do policial militar teria sido chamado por Maria Elizabeth para que fosse até o local porque o companheiro dela não estava querendo tomar uma medicação de uso controlado. Os três teriam permanecido juntos na casa até por volta de 6h. O irmão contou à polícia que deixou o local e cerca de 15 minutos depois ouviu os tiros.
A advogada foi encontrada alvejada com um tiro e Tavares também, com um disparo na cabeça. Uma pistola de calibre 9 milímetros, que pertencia ao policial da reserva, foi apreendida. A motivação do crime não ficou esclarecida pela investigação, já que não havia indicativo de brigas. Os dois mantinham uma relação havia cerca de 20 anos, mas não residiam na mesma casa.
O Ministério Público denunciou Tavares pelo crime de homicídio triplamente qualificado, devido ao motivo torpe, uso de recurso que impossibilitou a defesa da vítima e pelo feminicídio — ou seja, pela morte acontecer em contexto de gênero. O PM estava aposentado havia quatro anos por tempo de serviço e, segundo consta em decisão da Justiça, fazia uso de remédios antidepressivos e para epilepsia.
O que diz a defesa do réu
A advogada Andrea Garcia Lobato afirmou que a defesa acredita na inocência de José Pedro e que o caso não se trata de um feminicídio. Segundo a criminalista, há mais de uma década o cliente fazia tratamento psiquiátrico e tinha episódios de sonambulismo. A advogada afirma ainda que o réu está acamado, com necessidade de cuidados constantes, em razão da sequela deixada pelo disparo, o que em seu entendimento justifica a prisão domiciliar.
Confira a nota encaminhada pela advogada:
"A defesa provará, no curso do processo, que os fatos não ocorreram como o Ministério Público narrou na Denúncia e acredita firmemente na inocência de José Pedro. A defesa também tem a convicção que a perícia provará as questões físicas que envolvem a saúde de José Pedro, que se encontra extremamente debilitado."