Após dois anos e sete meses, a Força Nacional deixou o Rio Grande do Sul em comboio na sexta-feira (22). Segundo especialistas e autoridades ligadas à área da segurança pública, a partida repentina dos "boinas vermelhas" deixa um desafio às polícias locais de preencher imediatamente e com recursos próprios três lacunas que vinham sendo os pontos positivos da Força no policiamento da Capital: experiência, ostensividade e equipamentos.
Na visão de Chales Antonio Kieling, professor nos cursos de Gestão Pública e Segurança Pública da Universidade Feevale, houve um componente político importante na saída da tropa.
— Secretário algum gostaria de arcar com o ônus de mandar a Força Nacional embora. Daí os pedidos sucessivos de renovação, até que um deles, enfim, fosse recusado pelo governo federal. No entanto, isso não quer dizer que o Estado já não tenha condições de suprir a sua falta. O desafio da polícia é mostrar agora que pode substituir esses agentes, que já nem eram tantos assim, por serviços de inteligência. E vejo boas sinalizações do atual governo nesse sentido — observa Kieling, destacando o interesse da atual gestão por investimentos em softwares na área.
O número de agentes já vinha em queda desde o final de 2018, quando passou de 207 para 168. Ainda que o convênio tenha sido renovado em janeiro passado por mais dois meses, a parceria entre os governos Eduardo Leite e Jair Bolsonaro se deu com um efetivo ainda menor. Na sexta-feira, a parceria se encerrou com a partida de 54 policiais militares e nove civis e uma nota do vice-governador e secretário da Segurança Pública, Ranolfo Vieira Júnior, agradecendo "o empenho e o auxílio". Procurada, a assessoria da Secretaria de Segurança Pública declarou que o secretário não se manifestaria além da nota de sexta-feira (22).
No comunicado, Ranolfo afirmou que a saída "não deve causar grande impacto na segurança" e reforçou que, em agosto, 2,4 mil policiais serão formados para atuar na segurança do Estado.
A Força Nacional atuava, sobretudo, por meio de barreiras surpresa em bairros conflagrados da Capital, especialmente os da Zona Sul. Com 10 viaturas próprias e equipamentos equivalentes aos batalhões de choque da Brigada Militar, os agentes definiam seus cronogramas pouco antes de sair a campo, por volta das 19h, e se estendiam até as madrugadas. As barreiras eram montadas e desmontadas em cerca de 20 minutos, e não raro voltavam ao mesmo lugar mais de uma vez na mesma noite, a fim de surpreender criminosos que também monitoravam a movimentação dos agentes.
É essa efetividade que o Comando de Policiamento da Capital tem o desafio de suprir. Até o final de 2018, a Força Nacional realizou mais de 300 mil abordagens, aproximadamente 400 prisões em flagrante (somadas a mais de 150 apreensões de adolescentes) e 130 apreensões de armas.
Secretário de Segurança Pública durante o governo José Ivo Sartori, Cezar Schirmer atenta para o recurso que o Estado economizava com a presença da tropa. Entre 2016 e 2018, a presença da Força Nacional em solo gaúcho custou R$ 24 milhões aos cofres federais entre diárias, equipamentos e combustível.
— Se tratavam de agentes experientes, bem equipados e que representavam custo-zero para os cofres do Estado. São benefícios difíceis de substituir de uma hora para outra, mesmo que haja nomeações de novos PMs, porque o pessoal entra verde. Não se tem como estimar com precisão, mas tenho convicção de que a presença da Força Nacional teve um papel significativo na redução dos índices de violência — opina Schirmer.
O ex-secretário destaca ainda que, entre as medidas tomadas pela gestão passada para suprir a vindoura saída da Força Nacional, esteve a formação de uma tropa nos mesmos moldes dentro da própria Brigada Militar. A Força Gaúcha de Pronta Resposta teve ação experimental desde agosto passado e foi regulamentada em 13 de dezembro, no apagar de luzes do governo Sartori. A maioria do grupo de 75 agentes era de policiais aposentados que voltaram à ativa de forma temporária. O modus operandi foi utilizado pela própria Força Nacional em 2016, quando recrutou agentes aposentados há menos de cinco anos.