O nome escolhido para comandar o sistema penitenciário no Brasil a partir de janeiro é aposta na integração para tentar conter o crime organizado nas cadeias. Conhecido por ser um homem de diálogo, o delegado da Polícia Federal (PF) Fabiano Bordignon será chefe do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), na equipe escolhida por Sergio Moro, futuro ministro da Justiça. O policial une experiência no meio carcerário, na cooperação internacional e no combate às facções criminosas.
Na última quinzena deste ano, deixou o comando da PF de Foz do Iguaçu, no Paraná, posto que ocupava há três anos. Durante a troca de chefia, na quinta-feira (20), disse que pretende enfrentar os problemas do sistema prisional, que amarga falta de quase 360 mil vagas, sem dar detalhes, e enfatizou as ações conjuntas.
— Não é esforço de uma pessoa ou de um grupo de pessoas, é da sociedade. Dos órgãos de execução penal, do poder Judiciário, do poder Executivo e do preso. É um desafio de toda a sociedade brasileira, que tem déficit histórico na atenção à questão prisional. Precisamos e vamos melhorar — prometeu.
Natural de Palmas, município de 50 mil habitantes no sul do Paraná, Bordignon é filho de professores universitários. Formado em Direito na capital paranaense, tem especialização em criminologia e ciência política. Iniciou carreira como delegado federal em 2002, a 3 mil quilômetros de casa, em Porto Velho, Rondônia. De volta ao Estado natal, em 2005, por dois anos foi chefe da PF na litorânea Paranaguá, mais antiga cidade do Paraná.
A proximidade de Bordignon com o sistema carcerário se estreitou entre 2009 e 2013, quando, por dois períodos, foi diretor da primeira prisão federal de segurança máxima do país. Muralha de pedra, em município de 10 mil habitantes, a Penitenciária Federal de Catanduvas é destino dos chefes do crime organizado. Recebeu, entre eles, os traficantes Márcio dos Santos Nepomuceno, o Marcinho VP, e Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, ligados ao Comando Vermelho, facção com base no Rio de Janeiro.
Longe da realidade da superlotação, Catanduvas, que usa alta tecnologia para vigiar criminosos, tem capacidade para até 208 apenados, em celas individuais. A penitenciária tem sistema de escutas das conversas entre presos e advogados ou familiares. Moro, que à época era juiz de execução penal no Paraná e corregedor da prisão, foi um dos responsáveis por autorizar as gravações. Neste período, Bordignon manteve estreito relacionamento com o futuro ministro.
Foi também nesta época que conheceu o amigo e delegado federal Mozart Fuchs, que assume agora o cargo deixado por ele em Foz. Enquanto Bordignon dirigia a penitenciária, o colega era chefe substituto da PF de Cascavel. Na fronteira, atuaram juntos por três anos.
— Ele conhece a situação que enfrentará. Não se trata de um aventureiro, pois entende o funcionamento do sistema penitenciário federal e, consequentemente, tem capacidade e conhecimento para sua gestão — analisa Fuchs.
A escolha por Bordignon pode indicar ainda a opção por ampliar a interação internacional no combate ao crime organizado. O delegado é um dos representantes no Comando Tripartite, órgão criado para promover integração das polícias brasileiras, argentinas e paraguaias na desarticulação de quadrilhas e localização de criminosos.
— Em meus 20 anos de trabalho nas fronteiras brasileiras, não conheci alguém com tanta dedicação a promover a integração policial entre os países vizinhos. Além ser excelente técnico, estudioso, Fabiano possui grande senso humanitário — avalia o presidente do Instituto de Desenvolvimento Social de Fronteiras (Idesf), Luciano Barros.
Atuação na fronteira
Nos três anos em que atuou na fronteira, Fabiano Bordignon comandou ofensivas para desarticular facções criminosas. Em Foz, investigou a rota do crack no país. Em abril de 2017, foi um dos chefes da operação integrada entre polícias do Brasil e do Paraguai para prender parte da quadrilha que atacou uma empresa de valores em Ciudad del Este. O grupo usou explosivos para destruir as paredes do prédio.
Também encabeçou projetos regionais. Foi responsável pela instalação da base da Polícia Federal no Rio Paraná e liderou iniciativa para o monitoramento eletrônico da Ponte da Amizade, na fronteira com o Paraguai. Transitam pela estrutura quase 80 mil pessoas por dia. À reportagem, Bordignon informou que só se manifestará após assumir o cargo sobre as políticas que pretende adotar.
O delegado esteve à frente de operações que cruzaram a fronteira do Brasil, como a que investigou uma quadrilha especializada em ataques a bancos, em outubro de 2011. O bando, que atuava no Paraguai, tinha ramificações no Rio Grande do Sul. A mulher de um preso da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc) foi presa em São Leopoldo.
O delegado também participou de força-tarefa, em 2008, para investigar fraudes em benefícios de auxílio-doença em Curitiba. No ano anterior, durante a Operação Kakapo liderou a prisão de uma quadrilha em quatro Estados (Paraná, São Paulo, Pará e Rondônia) por tráfico internacional de drogas. O grupo comprava cocaína na Bolívia e transportava até Paranaguá, onde a droga era levada em navios para a Europa.