A presidente do Conselho Municipal de Políticas Públicas sobre Drogas (Compod) de Caxias do Sul, a assistente social Juliana Marcon, lamenta que a força-tarefa contra as cracolândias de 2012 não teve continuidade. Ela representou a prefeitura naquela iniciativa e concorda com a impressão do comandante da Brigada Militar (BM) caxiense de que houve resistência de outros setores.
Leia mais
Brigada Militar disponibilizará levantamento de cracolândias de Caxias do Sul para a prefeitura
Quase invisíveis, cracolândias persistem e geram insegurança em Caxias do Sul
Aumento de dependentes em Caxias do Sul prova que política de combate a droga é insuficiente
Pioneiro: O que pode ser feito para resolver as cracolândias?
Juliana Marcon: Infelizmente, existe dentro de algumas políticas públicas uma ideia que esse público não adere ao tratamento. Este pensamento que "depende do usuário querer o tratamento". Sim, os tratamentos com adesão têm muito mais sucesso. Por isso que precisamos descobrir como ampliar esta adesão. Sou uma assistente social e não acho que devemos aceitar passivamente que a pessoa escolha ficar na rua. Ninguém nasceu, como ser humano, para viver naquelas condições. Nós, como sociedade, precisamos criar algum equipamento, de saúde ou social, que ajude esta pessoa a tomar a decisão de sair da rua. O que temos hoje, não está resolvendo.
O que aconteceu em 2012?
Naquela época, o pessoal da saúde condenou este trabalho. Sofri críticas de colegas por ir junto com a polícia. Argumentavam que ir com a polícia estraga o vínculo criado. São discursos que se arrastam há muito tempo. Que tal, então, conversar com o pessoal da segurança e buscar uma outra abordagem? O que não dá mais é cada um trabalhar do seu jeito. O que um faz acaba desconstruído pelo que o outro faz. As problemáticas sociais e de saúde desta população nunca foram resolvidas. Os projetos não tem continuidade. Dá aquele primeiro impacto, uma resposta para sociedade e depois? O povo continua na rua, continua drogado, cada vez mais.
Saúde, assistência social e polícia precisam agir juntos?
Precisamos conversar e definir o que Caxias precisa. Hoje, ninguém diz o que Caxias precisa. Cada um decide e faz sua autogestão: "eu só posso fazer isso aqui". E a parte que ninguém está fazendo? O agente da saúde e assistência social não vai com a polícia porque irá comprometer a sua visão de cuidador, mas também não vai sozinho porque tem medo. Então, quem irá? A polícia não sabe fazer uma orientação de saúde. Em 2012, eu fui junto e fazia uma orientação motivacional, tanto que alguns deles ouviram e tentaram o tratamento. Pelo menos um deles teve sucesso e nunca mais voltou para a droga.
O que o Compod defende?
O Conselho defende a criação de uma política municipal contra drogas, o que ainda não existe. Hoje temos várias pessoas fazendo um trabalho fragmentado e desarticulado, que não dá resultado. É uma articulação insuficiente, principalmente entre saúde e assistência social, que é o que este público que está na rua mais precisa. Precisamos unir as práticas e procurar coisas diferentes.
Há um exemplo para Caxias seguir?
No Brasil, há algumas cidades que conseguem (um bom trabalho), mas é muito complicado. Porque a sociedade não acredita no usuário de drogas. Houve uma pesquisa, não lembro quando, onde queriam saber qual grupo social recebia mais aversão da sociedade. Descobriram que os mais rechaçados pela população são os usuários de drogas. Infelizmente, mesmo dentro do serviço de saúde, muitos pensam que "estes drogados não têm mais volta, não querem se ajudar". Na sociedade, há muito mais com este pensamento. É uma causa que ninguém quer se engajar, que as pessoas querem esconder, as famílias têm vergonha e a sociedade não acredita na recuperação. Cada vez empurramos eles para mais longe e mais agravos vão se desenvolvendo. O usuário fica marginalizado e encontra este mundo de pessoas que matam e roubam para conseguir uma droga, encontram as facções criminosas, etc.