No dia 15 de março, quando o governo estadual apresentou a chegada do reforço de 550 policiais militares – 350 vindos do Interior e 200 da Força Nacional – para patrulharem as ruas de Porto Alegre, o evento foi ofuscado pelo latrocínio (roubo com morte) que vitimou o estudante universitário Gabryel Delgado, 20 anos, na madrugada anterior. Passados 50 dias daquela solenidade, os números de assassinatos na Capital demonstram: a estratégia está funcionando.
Em comparação com o mesmo período de 2016, conforme levantamento dos jornais Zero Hora e Diário Gaúcho, houve redução de 23,5% nos crimes. Foram 68 vítimas – incluindo um latrocínio – contra 89 em 2016, com quatro pessoas mortas em assaltos.
A meta do remanejamento de policiais do Interior para a Capital, segundo o comando da Brigada Militar (BM), era frear a tendência de alta nos assassinatos verificada na arrancada de 2017. Desta forma, a eficácia no comparativo com os 50 dias anteriores, se confirma. Houve queda de 52,7%. Ao considerar só os latrocínios, a redução é ainda mais significativa. No período anterior à chegada dos PMs, aconteceram sete roubos com mortes. Uma redução de 85,7% nestes casos.
– Com mais policiais nas ruas, conseguimos nos antecipar à ação dos bandidos e prevenir com mais eficiência. Isso é fundamental para reduzir os latrocínios – acredita o comandante do policiamento da Capital, coronel Jefferson de Barros Jacques.
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Com mais PMs, a Operação Avante mudou a roupagem em relação ao ano anterior. Se até o final de 2016 a principal característica estava nas blitze pela cidade – o que provocou redução no ritmo dos latrocínios e nos números de roubos de veículos (veja gráficos abaixo) –, agora, a ação aumentou o seu alcance.
– A estratégia é saturar com policiamento ostensivo as áreas mais sensíveis que levantamos criteriosamente, a partir dos nossos dados, e garantir a permanência desse efetivo. Porque o homicida espera a oportunidade para agir. Se o policiamento só entra no lugar e depois abandona, os crimes continuam acontecendo. A partir daí é que fazemos operações ou barreiras estratégicas e em pontos determinados – explica o coronel Jacques.
Logo na arrancada deste ano, a disputa entre facções criminosas se acirrou na Zona Norte. Nos 50 dias anteriores à chegada do reforço de PMs, pelo menos 28 pessoas foram assassinadas entre os bairros Rubem Berta, Mario Quintana e Passo das Pedras. No período posterior, foram oito vítimas.
– Até uns meses atrás, isso aqui era um horror toda a manhã. Lá naquela escadaria, encontraram dois corpos. Na outra rua ao lado, era desova de carros roubados. De que jeito as pessoas iriam aproveitar a praça? – conta o morador Carlos Roberto Santos, 60 anos.
Morador há 30 anos do bairro Rubem Berta, ele havia abandonado a Praça México, que é um dos principais pontos de encontro da região. De uns 15 dias para cá, voltou a conviver com aquele espaço. Na manhã de sexta-feira, passeava com os dois cachorros e era um dos frequentadores que, literalmente, contribuíram para mudar a paisagem da área.
Para o casal Jorge Luís Silva e Neusa Maria Silva, ambos de 64 anos, o retorno à Praça México tem explicação lógica:
– Agora a gente vê polícia por aqui e não fica mais com aquele medo de ter um tiroteio a qualquer momento. Todos os dias, no final da tarde, tem viaturas da Força Nacional entrando e saindo do bairro.
Para o diretor de investigações do Departamento de Homicídios, delegado Gabriel Bicca, a maior presença do policiamento ostensivo foi fundamental não apenas na redução dos assassinatos nos últimos dias, mas na solução de crimes anteriores.
– Com policiamento nas ruas, aquele "bonde" que pensava em atravessar a cidade para executar um rival já vê um obstáculo para a sua ação. Eles estariam dispostos a um confronto ou à prisão? Essa sensação também passa às pessoas que vivem nos ambientes conflagrados. Quando elas percebem que criminosos estão sendo presos e ficando na cadeia, tendem a quebrar o silêncio – acredita.
Ousada meta de redução de mortes violentas no horizonte
Porto Alegre foi estabelecida como prioritária na arrancada das ações do Plano Nacional de Segurança. E o Ministério da Justiça determinou meta de redução de 7,5% nos índices de assassinatos na Capital neste ano em relação a 2016, quando, de acordo com o levantamento dos jornais Zero Hora e Diário Gaúcho, pelo menos 778 pessoas foram mortas. Mesmo com a melhora nos resultados a partir da metade de março, um comparativo com os números do ano passado até o final de abril demonstra leve alta de 1%.
– É difícil fazer projeção segura quando se fala em homicídios, e a meta é ousada. Mas acredito que o caminho tomado agora nos leva ao certo. Precisamos manter esse policiamento ostensivo e a qualidade nas apurações dos crimes. Não acho impossível atingirmos a meta – afirma o diretor do Departamento de Homicídios, Paulo Grillo.
Opinião semelhante tem o comandante-geral da BM, coronel Andreis Dal'Lago.
– A chegada de mais viaturas, mais coletes balísticos, armas e a redistribuição de efetivo, tudo contribuiu para resultados positivos. Mas a Brigada vai continuar avançando.
A partir de junho, teremos novos servidores nas ruas para reforçar ainda mais a sensação de segurança – afirma o oficial.
Os 350 PMs do Interior devem retornar as suas unidades até a metade do ano. Eles serão substituídos no policiamento da Capital por novos agentes. Já a Força Nacional fica até agosto, com prazo renovável.
Mudança no papel da Força Nacional
A atuação dos agentes da Força Nacional foi revista na tentativa de reduzir os índices de homicídios em Porto Alegre. Se os policiais empregados no policiamento ostensivo passaram a agir diretamente no foco dos conflitos entre facções, e não mais em barreiras nos pontos centrais da Capital, os agentes que atuam nas investigações de homicídios também ocupam outra posição.
São 20 policiais civis que agora, depois da entrada de 30 agentes recém formados na corporação, estão atuando nas investigações de casos antigos do Departamento de Homicídios.
– Chegamos à conclusão de que, colocando os agentes da Força nos locais dos crimes, poderíamos perder um conhecimento importante. Porque, quando eles forem embora, não ficará aqui além do que está nos relatórios. Melhor seria empregarmos os nossos novos policiais nos locais de crime para produzirem conhecimento. Isso resultará em mais informação, que é fundamental na conclusão de investigações com qualidade – explica o delegado Gabriel Bicca.
Nos primeiros quatro meses deste ano, 180 pessoas foram presas pelo Departamento de Homicídios, uma média de três capturados a cada dois dias. Média 9% superior ao ano passado, quando 500 foram presos.
Destes, 75% seguem na cadeia. Desde o início do reforço nas ruas, a BM também aumentou a frequência das prisões em Porto Alegre. Foram 1.487 capturados nos últimos 50 dias – 17,7% a mais do que nos 50 dias anteriores.