Moradores acordaram nesta quinta-feira com muitos tiros, gritos de "põe a cara na rua", e quatro casas em chamas, no bairro Vila Ipiranga, em Porto Alegre.
Era 1h30min quando cinco veículos e duas motos com cerca de 20 pessoas encapuzadas e fortemente armadas entraram no beco da Rua Marajó a fim de escancarar, mais uma vez, a disputa entre duas facções rivais pelo controle do tráfico de drogas na região. Apesar de ninguém ter sido morto ou ferido, ficou o lamento das famílias que tiveram de deixar suas residências às pressas com a roupa do corpo, sem tempo de salvar qualquer bem material.
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Quem mora na área garante que a casa foi criminosamente incendiada por engano pelos traficantes. As chamas se alastraram e atingiram outras três residências, sendo que duas foram destruídas por completo. Em uma delas, morava um homem que, por medo, pede para não ter a sua identidade revelada. Ele estava com a mulher, três crianças e um adolescente quando o fogo alcançou a casa dele.
– Tivemos que quebrar a janela e pular para sair de casa – disse.
Já na rua, percebeu que os quatro moradores da casa alvo dos traficantes, incluindo uma cadeirante, continuavam no seu interior, acuados.
– Eles não saíam da casa com medo de ser metralhados. Só saíram quando reconheceram a minha voz. Não fosse isso, morreriam queimados. Perdemos tudo – desabafou.
Não se sabe ainda para onde estavam apontadas as armas – se para o alto ou para as casas –, mas o que não resta dúvida é que quem ateou fogo na casa voltará, mais cedo ou mais tarde, para novos enfrentamentos.
– De 15 em 15 dias acontece isso. Ontem (quarta-feira) à tarde eu até falei que deixaria uma mangueira pronta, pois se não matassem ninguém, eles (traficantes rivais) iriam tocar fogo nas casas – comentou outro morador.
Moradores temem caminhar pela rua
De acordo com vizinhos, a violência se intensificou no último ano, quando caminhar no entorno da Rua Marajó passou a ser desafiador, independente do horário.
– Não dá para ficar na rua, porque não tem hora para eles (traficantes) chegarem aqui. Antes havia criança correndo, agora, as pessoas chegam do serviço e se trancam em casa. É perigoso até de receber visitas – reclamou um homem.
Conforme o comandante do 11º Batalhão de Polícia Militar, tenente-coronel Valdeci Antunes dos Santos, viaturas da Brigada Militar chegaram a ser deslocadas para o local, mas a corporação não foi informada dos disparos. Nesta quinta-feira, acrescentou o comandante, foi reforçado o policiamento na área.
Na 14ª Delegacia de Polícia, localizada a 550 metros do incêndio, também não foi registrada ocorrência policial. O delegado Cleber Lima diz que isso se dá pelo medo de vingança da população ou por haver ligação das vítimas com algum grupo criminoso.
– Essa guerra entre as facções é mais comum do que se imagina. É uma disputa entre traficantes das vilas Bom Jesus e Jardim. Eles vão continuar se matando, cortando a cabeça um do outro, esquartejando – resumiu o delegado, dizendo saber qual facção cometeu o crime, mas que os autores ainda não foram identificados.
Segundo o delegado, há mais de 200 integrantes nessa facção.
– Vamos investigar, mas não temos bola de cristal. A população não vem registrar a ocorrência. Não podemos arrastar as vítimas para depor, porque, se for assim, elas não vão nos dizer nada – finalizou.
As soluções apontadas por ele são rever as leis que permitem a soltura dos criminosos condenados e aumentar o policiamento ostensivo, alternativa rechaçada pela Brigada Militar.
– Não falta policial. O problema é que tem muito bandido. A solução é manter detido aqueles que foram presos e acabar com os detentos comandando de dentro dos presídios – rebateu o comandante do 11º BPM.