Com apenas duas edições realizadas, mas previsão de ocorrer até que se ache a cura da lesão medular espinhal, a Wings for Life World Run subverte lógicas e tem tudo para atrair cada vez mais participantes. Só na versão brasileira, o número de inscritos mais do que dobrou de 2014 para 2015. Na semana passada, a convite da organização, estive em Brasília, onde conversei com atletas que promovem a causa - todo o valor arrecadado nas inscrições é aplicado em financiamento de pesquisas sobre lesões na medula. Também pude participar da prova, que já tinha me deixado muito curiosa no ano passado.
Para começar, é uma corrida realizada ao mesmo tempo em diferentes localidades, nos cinco continentes. Neste ano, foram 35 locais de 33 países. O horário oficial de largada foi marcado para as 11h de Greenwich. Com isso, em alguns locais, como no Japão e na Austrália, a imagem do início da corrida era um monte de pontinhos luminosos no meio da noite - atletas começaram a prova equipados com headlamps. No Brasil, o horário correspondeu às 8h.
Além disso, ainda que global, a prova tem um único vencedor final, e a distância é definida unicamente pelo seu preparo físico. Como isso ocorre? Em cada local de disputa, após 30 minutos de prova, um carro sai a 15km/h na direção dos corredores. Aos poucos, vai aumentando a velocidade. Na medida em que alcança um participante, elimina este corredor. Cacá Bueno conduziu o veículo por 52,61 quilômetros, distância que o carioca Juan Pablo de Lima Costa Salazar conseguiu percorrer sem ser alcançado pelo pentacampeão de Stock Car.
Os corredores percebem que o carro "perseguidor" se aproxima conforme se pode ouvir as sirenes das motos que o acompanham. Com isso, essa se torna uma das partes mais divertidas, já que, nesse momento, todos tentam correr mais rápido, sob a adrenalina de tentar fugir de Cacá. Ao serem ultrapassados pelo veículo, os corredores são recolhidos por um ônibus que os transportam de volta ao ponto inicial. No caso de Brasília, próximo ao estádio Mané Garrincha.
Mas eu já tinha terminado a prova, sido recolhida pelo ônibus, conversado com os embaixadores da iniciativa, chegado ao hotel, tomado banho e escrito a reportagem que foi publicada segunda-feira em ZH quando o etíope Lemawork Ketema, vencedor global, ainda corria. Ele não apenas conseguiu a façanha de ganhar a primeira e a segunda edição da Wings For Life World Run, como correu mais neste 3 de maio do que no ano passado. Completou um percurso de 79,9 quilômetros em 5h05min, na Áustria - 1,4 quilômetro acima da distância que o tornou vencedor em 2014.
Engana-se quem pensa que tamanha distância é um caminho quase solitário. Ao lado de Ketema, o peruano Remigio Quispe correu até o quilômetro 70. Os dois se conheceram na edição anterior, quando a diferença entre eles também foi muito pequena. O prêmio - uma viagem ao redor do mundo - não podia ser desfrutado por Ketema, até então refugiado político. Com isso, Remigio viajou com o filho mais novo. A campeã mundial feminina também levou esse prêmio. Desse dia, nasceu a amizade entre dois corredores quase anônimos, agora mundialmente conhecidos pela nobre atitude esportiva.
Em vídeo, saiba como foi a corrida: