A vacina já chegou a milhares de pessoas pelo mundo, mas os cientistas buscam outras formas de lidar com o coronavírus, e uma dessas apostas é o tratamento terapêutico com anticorpos monoclonais. Essa abordagem tem avançado e demostrado bons resultados. Na segunda-feira (12), o laboratório americano Regeneron e seu sócio suíço Roche revelaram que o tratamento experimental feito com essa técnica demonstrou 81% de eficácia na proteção contra a covid-19. O medicamento se destaca como mais um importante aliado na luta contra a pandemia, mas tem suas limitações de aplicação, principalmente, no Brasil, afirmam especialistas.
Antes de tudo, é preciso entender o que são os anticorpos monoclonais. Funciona da seguinte maneira: quando o corpo identifica a presença do coronavírus, produzimos anticorpos e mobilizamos células de defesa para aniquilar esse invasor. Isso é importante para que ele não entre em nossas células, impedindo a infecção viral e sua disseminação no organismo.
Os anticorpos monoclonais não são nada mais do que cópias sintéticas, feitas em laboratório, a partir de um clone de um anticorpo de defesa contra a covid-19, explica Moises Bauer, professor titular de Imunologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
— Depois que o anticorpo monoclonal é sintetizado, é possível produzi-lo em litros. A ideia, com essa técnica, é fazer soro terapêutico para tratar pessoas com covid-19 para neutralizar a infecção. Essa, talvez, seria uma das poucas alternativas para curar pacientes do coronavírus, por exemplo, e não os deixar progredir para o quadro grave — afirma.
Luciano Goldani, infectologista do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), afirma que esse tipo de terapia não deixa a proteína Spike do coronavírus se grudar no receptor das células humanas. Os anticorpos monoclonais bloqueiam esse elo entre o vírus e nossos receptores. Quando essa ligação é impedida, os mecanismos do corpo não chegam a ser “sequestrados” pelo invasor para que ele se reproduza.
— Essa é uma abordagem que, além de promissora, é a única que temos até agora e que tem mostrado bons resultados. O problema é que ela é fora da nossa realidade. Primeiramente, essa é uma técnica cara por envolver engenharia molecular. Além disso, ela não se aplica à realidade do nosso sistema de saúde brasileiro por exigir infusão do medicamento nas pessoas. Quer dizer, demanda que o paciente vá até um hospital para ter acesso a esse medicamento que deve ser ministrado de forma intravenosa. A alternativa é ótima, mas, para o Brasil, precisaríamos de algo que pudesse ser prescrito por via oral para o indivíduo tomar em casa — observa o infectologista do HCPA.
Apesar das perspectivas caras de fabricação e de aplicação dos fármacos em território brasileiro, atualmente, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) avalia dois pedidos de uso emergencial de medicamento contra a covid-19 com base nessa tecnologia. No final de março, a empresa Eli Lilly do Brasil Ltda. solicitou análise do coquetel formado pelos remédios biológicos banlanivimabe e etesevimabe. E, na primeira semana de abril, a Roche também entrou com pedido de análise da combinação dos medicamentos biológicos casirivimabe e imdevimabe.
Bauer afirma que existem, basicamente, dois tipos de anticorpos monoclonais. Uns ajudam a bloquear inflamações e têm seu uso aconselhado para casos gaves. A outra modalidade, que é a dos medicamentos em avaliação na Anvisa, é voltada para pacientes com casos leves e moderados de covid-19:
— Essas duplas de fármacos trabalham na redução do risco de agravamento da doença e, consequentemente, de internação em Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Como o vírus não se conecta aos nossos receptores, ele não se multiplica, temos menos infecção e menos casos da doença.
O que evidenciam os estudos
Um artigo publicado na revista científica The New England Journal of Medicine, em janeiro deste ano, revelou resultados animadores quando foram pesquisados somente os efeitos do banlanivimabe no combate ao coronavírus. O estudo evidenciou que, entre os positivados que tomaram o remédio, somente 1,6% precisaram ser hospitalizados. Enquanto isso, no grupo placebo, essa taxa subiu para 6,3%. Isso mostra que o medicamento derruba a gravidade da doença e também a taxa de internação.
Outro estudo, na Cell – renomada revista científica norte-americana –, em abril, revelou dados não tão animadores. Na pesquisa, foram testados in vitro três anticorpos monoclonais: o banlanivimabe, o casirivimabe e o imdevimabe. O objetivo era aferir o nível de bloqueio oferecido por eles quando em contato com amostra não mutada do coronavírus e com as variantes brasileira, inglesa e sul-africana. O resultado foi que eles foram parcialmente capazes de impedir a entrada das variantes.
— Esse foi um experimento in vitro, pode ser que realmente não seja eficaz nas pessoas, contudo, temos mais de 50 anticorpos monoclonais sendo testados. Podem achar um que seja capaz de bloquear o acesso do coronavírus às nossas células — explica o professor titular de Imunologia da PUCRS.
Goldani destaca, por fim, que os prós são maiores do que os contras em relação à tecnologia:
— Os efeitos adversos ainda estão sendo estudados, mas, do que apareceu até o momento, nada despontou como paraefeito grave. Os benefícios têm se mostrado maiores porque mostram que esses anticorpos monoclonais têm boa resposta terapêutica, porque ele evita a progressão do quadro clínico. O tratamento da Regeneron e Roche, por exemplo, reduz as hospitalizações e mortes em torno de 70%.