Conteúdo verificado: Publicações de deputado paulista questionam a razão pela qual a enfermeira Mônica Calazans recebeu a primeira dose da CoronaVac se ela já estaria imunizada por ter participado dos testes da vacina do Butantan.
É falso que a enfermeira Mônica Calazans, primeira pessoa a receber a vacina contra a covid-19 no Brasil, já estivesse imunizada por ter participado dos testes da vacina do Butantan, como diz o deputado paulista Gil Diniz (PSL) em postagens no Facebook e Twitter.
De fato, Mônica participou como voluntária dos estudos clínicos feitos no Brasil da vacina CoronaVac, desenvolvida pelo Instituto Butantan em parceria com o laboratório chinês Sinovac. Ela recebeu duas aplicações dos testes entre julho e agosto de 2020. No entanto, no dia 17 de janeiro, ela foi informada que estava no grupo que recebeu placebo e não as doses do imunizante.
Durante o processo de pesquisa, um grupo recebia a vacina e outro grupo recebia placebo. Nenhum dos participantes sabia de qual grupo fazia parte. Apenas após a conclusão das pesquisas é divulgado quem faz parte de cada grupo.
A enfermeira, além de integrar a linha de frente, faz parte do grupo de risco para o coronavírus – é obesa, hipertensa e diabética. Mônica foi auxiliar de enfermagem por 25 anos e se graduou em Enfermagem aos 47 anos. Segundo reportagem da CNN Brasil, Mônica foi aprovada em concurso público para a área da saúde em fevereiro de 2015 e foi chamada em regime de emergência no início da pandemia pelo governo de São Paulo.
A postagem ainda afirma que a própria enfermeira postou em suas redes sociais que estava na praia no final do ano. A foto foi postada no Facebook pessoal de Mônica. Em entrevista ao programa Encontro com Fátima, da TV Globo, ela disse que, às vezes, vai à praia, mas que não participa de aglomerações. Ela afirmou que “o fato de uma pessoa sair, andar na praia, entendo que não é aglomeração”.
Como verificamos?
Procuramos Mônica Calazans para esclarecer sua participação nos testes da vacina em julho e agosto de 2020. Confirmamos ser dela o perfil no Facebook onde foi publicada em 19 de dezembro de 2020 uma foto de Mônica, com duas amigas na praia. Essa imagem foi reproduzida no post de Diniz.
Na publicação do deputado também consta a imagem de uma notícia veiculada no último dia 8 de janeiro, no site do Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo (Coren-SP). Nela, há relatos de profissionais da área da saúde sobre a vacinação. O depoimento da enfermeira Mônica Calazans está entre eles.
Realizamos buscas no Google por outras reportagens sobre Mônica.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 18 de Janeiro de 2020.
Verificação
A participação de Mônica Calazans nos testes da CoronaVac
Mônica Calazans tem 54 anos e é enfermeira da unidade de terapia intensiva (UTI) do Hospital Emílio Ribas, em São Paulo. Ela realmente participou como voluntária dos estudos clínicos feitos no Brasil da vacina CoronaVac, desenvolvida pelo Instituto Butantan em parceria com o laboratório chinês Sinovac. No entanto, estava no grupo que recebeu placebo, substância sem efeito, e não as doses do imunizante.
Em contato com o Comprova, a enfermeira confirmou que tomou as duas aplicações dos testes entre julho e agosto de 2020. Apesar disso, somente no último domingo, dia 17 de janeiro, ela foi informada que estava no grupo que recebeu placebo, e que havia sido escolhida para, desta vez, receber a vacina, se tornando a primeira brasileira a ser imunizada contra a covid-19 em território nacional.
Quem é Mônica Calazans e por que ela foi escolhida para receber a primeira dose da vacina?
Mônica Aparecida Calazans, 54 anos, moradora de Itaquera, zona leste de São Paulo (SP), é enfermeira na unidade de terapia intensiva (UTI) do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, em São Paulo. Além de fazer parte da linha de frente, ela também faz parte do grupo de risco para o coronavírus, é obesa, hipertensa e diabética.
Mônica foi auxiliar de enfermagem por 25 anos e se graduou em Enfermagem aos 47 anos. Segundo reportagem da CNN Brasil, Mônica foi aprovada em concurso público para a área da saúde em fevereiro de 2015 e foi chamada em regime de emergência no início da pandemia pelo governo de São Paulo.
Mônica foi escolhida para ser a primeira brasileira vacinada por ser trabalhadora de saúde e atuar na linha de frente da covid-19, e também por pertencer ao grupo de risco. Também ficou conhecida depois que foi personagem de reportagens na imprensa e venceu o prêmio Notáveis CNN, premiação do canal de notícias que contemplou pessoas que lutam contra o coronavírus. Ela foi a vencedora na categoria Heroína do Ano e representou os profissionais da saúde que atuam durante a pandemia.
— É toda uma história de vida. Diante dos prêmios e toda minha trajetória profissional e principalmente na pandemia, eu fui a escolhida. Havia outros cem profissionais lá — afirma.
Sobre o como foi o procedimento para receber o imunizante, Mônica conta que as pessoas que fazem parte do grupo que participou da pesquisa recebem um telefonema semanalmente para saber o estado de saúde de cada um:
— Eu tive todo um aparato dos profissionais para qualquer problema que eu tivesse poderia fazer contato, eu tive um respaldo e isso sempre me deixou muito tranquila.
As imagens usadas no post do deputado
O deputado Gil Diniz reproduziu duas imagens na publicação investigada pelo Comprova. São capturas de tela de uma notícia e de uma postagem da enfermeira feita em seu perfil no Facebook.
A primeira imagem é a reprodução de uma notícia veiculada no dia 8 de janeiro de 2021 no site do Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo (Coren-SP). A matéria, intitulada “Covid-19: profissionais de enfermagem contam experiência como voluntários nos testes da vacina”, traz o relato de três profissionais da área da saúde, incluindo a enfermeira Mônica Calazans. Eles contam como foi o processo de vacinação e de monitoramento após receberem as doses. A reportagem informa que que os voluntários não sabem se receberam vacina ou um placebo.
A segunda imagem publicada pelo deputado, a reprodução de um post feito por Mônica em seu perfil de Facebook, mostra a enfermeira na praia ao lado de duas mulheres, com a legenda “Oiii, vcs [vocês] que lutem”, em registro de 19 de dezembro de 2020.
Ao Comprova, Mônica disse que a foto é de um dia de folga com outras duas amigas também profissionais da saúde na Praia Grande, município de São Paulo.
— Eu tenho um apartamento na praia, por isso eu fui. Acho que um banho de mar tinha o direito de tomar e foi o que eu fiz.
Ela também reforça que optou por um horário com pouco movimento, pois não participa de aglomerações, e disse acreditar que o maior risco são baladas, encontros com muitas pessoas e festas clandestinas que desrespeitam as normas de distanciamento social.
O perfil no Facebook divulgado no tuíte do deputado é a conta pessoal da enfermeira. Desde o domingo, no entanto, Mônica relata que foram criadas diversas contas e postagens falsas em redes sociais com o nome dela.
Quem é Gil Diniz?
Gildevanio Ilso dos Santos Diniz, conhecido também como Gil Diniz, é deputado estadual de São Paulo (sem partido). Foi filiado ao Partido Social Cristão (PSC) de 2015 a 2018. Após sua saída do PSC, foi filiado ao Partido Social Liberal (PSL), até ser expulso em 2020 por disseminação de notícias falsas e ataques a instituições democráticas, como o Supremo Tribunal Federal (STF). Antes de ingressar na carreira política, Gil trabalhava nos Correios, como carteiro na zona leste de São Paulo.
Gil Diniz tem ligação com Eduardo e Carlos Bolsonaro desde 2014. No período em que esteve filiado ao partido PSC, Diniz foi assessor da equipe de Eduardo Bolsonaro. Em 2018, foi eleito deputado estadual pelo PSL em São Paulo com 214.037 votos.
Por que investigamos?
Em sua terceira fase, o Comprova investiga conteúdos duvidosos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia do coronavírus que tenham grande alcance nas redes sociais. O conteúdo que motivou esta verificação teve, até o fechamento desta reportagem, 4,1 mil compartilhamentos no Twitter e 19 mil no Facebook.
Após muita repercussão sobre a eficácia da vacina e estudos e testes na preparação da CoronaVac no Brasil, o post é problemático pois põe dúvida na efetividade do plano de imunização contra a covid-19. Além disso, usa de informações pessoais de Mônica Calazans – como a foto na praia, por exemplo – para validar seu argumento.
O G1 – Fato ou Fake publicou na segunda-feira (18) uma verificação a respeito de mensagem nas redes sociais afirmando que a enfermeira Mônica já havia tomado anteriormente a dose da vacina, e que portanto não precisaria de outra dose. A Agência Lupa, também fez checagem da postagem de Diniz.
Falso, para o Comprova, é conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Projeto Comprova
Depois de um período especial de 75 dias dedicado exclusivamente à verificação de conteúdos suspeitos sobre o coronavírus e a covid-19, o Projeto Comprova começou em 10 de junho a terceira fase de suas operações de combate à desinformação e a conteúdos enganosos na internet. O objetivo da iniciativa é expandir a disseminação das informações verdadeiras.
Nesta terceira etapa, o Comprova retoma o monitoramento e a verificação de conteúdos suspeitos sobre políticas públicas do governo federal e eleições municipais, além de continuar investigando boatos sobre a pandemia de covid-19. Fazem parte da coalizão do Comprova veículos impressos, de rádio, de TV e digitais de grande alcance.
Este conteúdo foi investigado por Niara - Coletivo Negro da Universidade Federal do Pampa (Unipampa) de São Borja, Estadão, NSC Comunicação e Alma Preta, e verificado por GZH, Jornal do Commércio, Jornal Correio, Rádio Noroeste e Favela em Pauta.
É possível enviar sugestões de conteúdos duvidosos e que podem ser verificados por meio do site e por WhatsApp (11 97795-0022). GZH publicará conteúdos checados pela iniciativa. O Comprova tem patrocínio de Google News Initiative (GNI), Facebook Journalism Project, First Draft News e WhatsApp e apoio da Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP). A coordenação é da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji).