Poucas expressões representam tão bem o drama de Rodrigo Batista Linden como "correr atrás do tempo perdido". A sentença, para o trabalhador informal de Gravataí, é a síntese perfeita da profissão emergencial que o tem ajudado: o homem com fôlego de garoto corre contra os 50 segundos de um movimentado semáforo de Porto Alegre na tentativa de pendurar o máximo de pacotes de bala nos retrovisores. Sem o privilégio do descanso, completa o ciclo em ao menos uma dezena de carros e retorna aos automóveis da linha de frente, torcendo para enxergar qualquer mão estendida.
— Estou com 42 anos. Tenho esposa, tenho filho no colégio particular. Não posso parar. Sou uma pessoa bem objetiva. Não importa de que forma, sendo honesto, o trabalho dá resultado — explica o maratonista da esquina das avenidas Azenha e Ipiranga.
Recheado com uma dezena de balas, a embalagem carrega um bilhete rabiscado a mão. No pedaço de folha pautada, a súplica de R$ 2 vem acompanhada das palavras "desemprego" e "ajude". A estratégia das "embalagens que falam", colocada em prática por outros Rodrigos em inúmeros cruzamentos da Capital, foi retirada do YouTube e adotada por ele como "algo fora da curva". A necessidade surgiu após as escolas entrarem em férias. Sem os estudantes famintos nas calçadas, ficou sem clientela para os salgados vendidos próximo aos colégios.
— Assisti a um vídeo que ensina a colocar no máximo de carros, com uma mensagem junto. Sabe que fiquei dois dias pensando "será que eu vou?". Senti vergonha no início, mas como a vida não tem sido de muita sorte, eu encarei. Não posso ficar parado — afirma, antes de deliberadamente sair correndo para os veículos que reduzem a marcha de forma gradual.
Faculdade de história interrompida
Nos anos anteriores, a vida não foi menos corrida. Rodrigo cursou história em uma universidade privada da Região Metropolitana, mas abandonou o sonho devido ao valor da mensalidade. Quando decidiu empreender, a barraca de cachorro-quente aberta na cidade em que reside não resistiu a falta de clientes e ao alto custo de manutenção. O emprego de corretor imobiliário também não prosperou. Apesar da má sorte aparente, o humor do doceiro se mostra inabalável.
— A prefeitura às vezes recolhe minhas coisas. Eu sei, sou irregular, mas eu volto, estou trabalhando. Os (motoristas) de aplicativo precisam de bala para os clientes, não é? — replica, sem resignar-se sobre os percalços.
Quando o sinal verde ganha cor, uma pequena parada, escorado ao guarda-corpo da ciclovia. A reidratação vem de garrafas de água trazidas congeladas de casa. Mesmo iniciando as vendas antes das 7h, o abafamento do verão se mostra implacável. Rasgado pelo uso excessivo, o jaleco azul ganho quando atuava como vendedor de picolé segura o suor dos dias mais quentes de fevereiro. Com temperatura de 37ºC no domingo (16), Porto Alegre foi a capital mais quente do Brasil, segundo a Somar Meteorologia.
— Eu até vendia picolé na praia, mas lá tem muita concorrência. Aqui é a Capital, onde tudo acontece — justifica.
Nove quilos a menos
O corre-corre deu resultado na balança: quase nove quilos perdidos desde dezembro, situação comemorada apesar dos esforços ao sol. Após o meio-dia, já sem forças, retorna de ônibus a Gravataí — o carro adquirido com a renda de ambulante descansa na garagem da residência. Nos turnos de maior sucesso, leva na carteira o resultado de 60 pacotes vendidos. Otimista, não informa a estimativa dos dias ruins, preferindo exaltar as gratas surpresas do sinal.
— Sabe que um senhor parou e me deu R$ 10. Voltou outro dia e deu R$ 100. E adivinha? Voltou de novo com outra nota de R$ 100. Correndo atrás, as coisas acontecem — finaliza, partindo mais uma vez ao encontro da sorte nos poucos vidros que não estão fechados, conservando o ar-condicionado.