O prédio de uma das mais tradicionais instituições de ensino do Estado, berço de personalidades políticas, intelectuais e cientistas, terá seu valor histórico reconhecido. O prefeito de Porto Alegre, José Fortunati, homologará nesta quinta-feira o tombamento do Colégio Estadual Júlio de Castilhos. A cerimônia, na sede do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) na Capital, marcará o centenário de nascimento de Demetrio Ribeiro, responsável por projetar a construção.
O arquiteto e urbanista morto em outubro de 2003, aos 87 anos, deixou seu nome marcado na história do Rio Grande do Sul por obras importantes, participação na elaboração de planos diretores de cidades e pela carreira docente. A concepção do prédio do Julinho na Avenida Piratini, inaugurado em 1958, deu-se após Demetrio e sua mulher, Enilda (falecida em 2010), vencerem um concurso. A antiga sede, na Avenida João Pessoa, havia sido parcialmente destruída por um incêndio em 1951.
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Trabalho considerado importante por representar a implantação de modelos modernistas na arquitetura de Porto Alegre, a construção era orgulho para Demetrio por contemplar espaços de convivência para os estudantes. É o que conta um de seus ex-alunos, o arquiteto Ivan Mizoguchi, ressaltando a capacidade que o professor tinha de conduzir críticas.
– Hoje, seria uma pessoa considerada rara em função das defesas de princípios, das questões morais e éticas. Ouvia atentamente qualquer interlocutor e podia mudar de opinião, mas não seus princípios. Muitos admiradores ficavam encantados com a defesa intransigente que ele fazia – relata Mizoguchi, que foi secretário-geral nacional do IAB durante a presidência de Demetrio (1977-1979).
Centro de debates e de formação de gerações
Membro do Partido Comunista, o arquiteto e urbanista sofreu perseguições durante o Estado Novo e a ditadura civil-militar – perdeu o cargo de professor na UFRGS em 1964, assim como sua mulher. Retornou à universidade com a Anistia, em 1979, e recebeu o título de professor emérito mais de 10 anos depois.
A professora Wrana Maria Panizzi, que começou a carreira de quatro décadas na UFRGS pela Faculdade de Arquitetura, o define como uma figura emblemática:
– O professor Demetrio faz parte da história da universidade, da arquitetura e do urbanismo. Soube muito bem associar a obra arquitetônica à construção da cidade. Foi um grande defensor de fazer com que a arquitetura pudesse ajudar a tornar as cidades um direito e um espaço de todos.
Ex-reitora da universidade, Wrana salienta que a preservação do Julinho tem um significado especial pelo fato de o colégio ter formado gerações e se constituído em um centro de debates.
– Representou aquilo que entendo como educação efetiva, que é fazer com que as pessoas aprendam a pensar. O Julinho não só formou as pessoas do ponto de vista das habilidades, das competências, mas, sobretudo, formou pessoas que sabiam pensar – avaliou.
Caráter original precisa ser retomado
O projeto de tombamento do prédio foi elaborado pela Coordenação da Memória Cultural da Secretaria Municipal da Cultura (SMC) de Porto Alegre e contou com apoio do IAB-RS.
– A importância do tombamento se dá pelo fato de haver uma descaracterização de alguns aspectos originais do edifício que precisam ser retomados para garantir esse caráter original, que representa um período histórico importante para a arquitetura e para a história do Rio Grande do Sul – analisa o vice-presidente do IAB-RS, Rafael Pavan dos Passos.
Tiago Holzmann da Silva, presidente do instituto no Estado, frisa a robustez do currículo de Demetrio, membro da comissão de criação da Faculdade de Arquitetura da UFRGS em 1952:
– É um dos mais importantes urbanistas do Estado, quem sabe do Brasil. Trata-se de um dos grandes responsáveis pela escola de arquitetura do Rio Grande do Sul, do ensino do urbanismo, um teórico, parceiro de diversos outros arquitetos e urbanistas de sua época na elaboração de planos diretores e discussão das questões urbanas.
Avô deu nome à rua
Demetrio Ribeiro carregou o mesmo nome do avô, importante fazendeiro, político e engenheiro gaúcho, homenageado com a denominação de uma rua no Centro Histórico de Porto Alegre. O avô, que viveu entre 1853 e 1933, foi o primeiro ministro da Agricultura no Brasil República.
– Ele tinha sido constituinte, no começo da República, e acabou comprando briga com meio mundo. Foi por isso que ele decidiu se mudar para Paris e morou lá o resto da vida – contou o neto a ZH em junho de 2003.
Homenagem
> O que: cerimônia de homenagem ao centenário de Demetrio Ribeiro, com homologação do tombamento do prédio do Colégio Estadual Júlio de Castilhos
> Quando: nesta quinta-feira
> Horário: 19h30min
> Onde: Ponto de Cultura Solar do IAB-RS (Rua General Canabarro, 363, Centro Histórico, Porto Alegre)
> Quanto: entrada franca