O presidente do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), embaixador Luiz Augusto de Castro Neves, aponta vantagens e desvantagens para os cubanos com a nova situação. Concebido por um grupo de diplomatas, acadêmicos e empresários, o Cebri dedica-se a analisar o continente. Confira a entrevista concedida via telefone por Castro Neves, que esteve na ilha quatro vezes.
Qual é a sua expectativa sobre o futuro de Cuba?
Com a normalização das relações diplomáticas, é evidente que a vida em Cuba se tornará mais amena. Haverá um melhor convívio com os países do hemisfério. É de se lembrar que Cuba sempre foi ligada, historicamente, aos Estados Unidos. Cuba deve sua independência à vitória americana na guerra com a Espanha.
Cuba teria algo a perder com a abertura?
Não acredito. Eles perderam muito com o fechamento a que foram condenados desde 1961. O problema é que Cuba passou a ser um peão no xadrez da Guerra Fria (1945 - 1989), entre União Soviética e Estados Unidos. O peão cubano quase levou a uma guerra nuclear, em 1962. Acabada a Guerra Fria, Cuba ficou como uma espécie de anomalia no mapa.
Entre a população cubana, algum segmento perderia com as mudanças em curso?
A turma mais velha, sim, que já não tem muita perspectiva. Os velhos quadros do partido, os revolucionários, esses não engolirão eventuais liberalizações do regime.
Cuba terá de desmantelar o aparato estatal que garante indicadores diferenciados na saúde, na educação e nos esportes?
Não acredito muito. Esses bons indicadores, que de fato existem, já estão saturando. Cuba eliminou o analfabetismo, propiciou saúde e educação básicas. Mas é um país pequeno. Chega-se a um determinado momento em que outras profissões começam a ser mais rentáveis. É comum, em Cuba, encontrar um engenheiro, um arquiteto, um médico trabalhando como garçom ou chofer de táxi. Com gorjeta, ele ganha muito mais do que na profissão de origem.
Entre os cubanos, quem ganha com as mudanças?
A turma mais nova, essa que procura fugir para os Estados Unidos e se vincular a outros países por meio da internet e das redes sociais. Tenho a impressão de que está ansiosa para ser reintegrada à comunidade mundial. Para os cubanos com razoável nível de educação, se abrem inúmeras oportunidades. Poderão trabalhar em empresas estrangeiras, ganhar o seu dinheiro diretamente. Não será como hoje, que o Estado se apropria do salário e paga apenas uma fração a quem trabalha.
Como ficará o modelo político de Cuba, centrado no partido único?
É um modelo em extinção. Outra coisa curiosa, a ser observada, são as tratativas entre EUA e Cuba, que duraram 18 meses, segundo a imprensa. Foram feitas com a interveniência do Canadá e do Vaticano, pelos bons ofícios do Papa. Mas os EUA não fizeram nenhuma participação aos governos do hemisfério, o que evidencia que a América Latina é uma prioridade baixa para os americanos.
A abertura econômica pode acelerar uma abertura política?
É um processo lento, complicado, como acontece na China. A prosperidade chinesa está criando uma enorme classe média urbana, que frequenta a internet, tem celular e iPad e quer dar cada vez mais palpites nos assuntos públicos. Imagino que possa ocorrer algo similar em Cuba.
Cuba pode se tornar uma pequena China no Caribe, com economia aberta, mas sob regime comunista?
Não acredito. O comunismo cubano é mais caudilhesco que o chinês. No fundo no fundo, foi mais um regime de caudilhos. Por força da Guerra Fria, passou para o lado de lá. Foi um peão capturado pelo bloco socialista.