Ao abrir a Assembleia Geral da ONU nesta terça-feira (24), o presidente Jair Bolsonaro exibiu contradição ao criticar o acordo que permitiu em 2013 a vinda de médicos cubanos para o programa Mais Médicos. No discurso, ele afirmou que os profissionais foram proibidos pelo governo brasileiro de trazer as famílias para o país. Todavia, o próprio Bolsonaro foi contra a vinda de parentes dos médicos para o Brasil e tentou impedi-los de trabalhar no território nacional.
— Em 2013, um acordo entre o governo petista e a ditadura cubana trouxe ao Brasil 10 mil médicos sem nenhuma comprovação profissional. Foram impedidos de trazer cônjuges e filhos, tiveram 75% de seus salários confiscados pelo regime e foram impedidos de usufruir de direitos fundamentais, como o de ir e vir. Um verdadeiro trabalho escravo, acreditem... — disse o presidente na tribuna do principal fórum de discussões globais.
Não era esse o pensamento do então deputado em 2013, quando o governo Dilma Rousseff lançou o Mais Médicos. Em 8 de agosto daquele ano, Bolsonaro discursou na tribuna para alertar sobre o que considerava um risco à nação:
— Prestem atenção. Está na medida provisória: cada médico cubano pode trazer todos os seus dependentes. E a gente sabe um pouquinho como funciona a ditadura castrista. Então, cada médico vai trazer 10, 20, 30 agentes para cá. Podemos ter, a exemplo da Venezuela, 70 mil cubanos aqui dentro.
Além da contradição, Bolsonaro cometeu um equívoco em seu discurso. Ao contrário do que disse o presidente na ONU, não havia impedimento à vinda das famílias. A Lei 12.871/2013, que criou o Mais Médicos, trazia no artigo 18 a permissão ao Ministério das Relações Exteriores para concessão de visto temporário “aos dependentes legais do médico intercambista estrangeiro, incluindo companheiro ou companheira, pelo prazo de validade do visto do titular”.
Lá em 2013, o parlamentar considerava os parentes dos médicos uma ameaça à democracia e aos empregos dos trabalhadores brasileiros.
— Esses agentes podem adquirir emprego em qualquer lugar do Brasil com carteira assinada, inclusive cargos em comissão. Olhem o perigo para a nossa democracia — alertou.
Em 2016, quando outra medida provisória (MP) prorrogava por mais três anos o prazo dos vistos dos médicos do programa, bem como o prazo para revalidação dos seus diplomas, Bolsonaro voltou à carga. Desta vez, tentou impedir que os parentes dos profissionais pudessem trabalhar no país. Em emenda à MP, ele incluía na lei um dispositivo que proibia a emissão de carteira de trabalho aos familiares.
"Os dependentes legais do médico intercambista estrangeiro não poderão exercer atividades remuneradas, com emissão de Carteira de Trabalho e Previdência Social pelo Ministério do Trabalho e Emprego", dizia o texto de autoria de Bolsonaro. A emenda, também assinada pelo filho e deputado Eduardo Bolsonaro, acabou rejeitada em plenário.