BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A comissão de ética nacional do PDT oficializou nesta quarta-feira (17) a decisão de abrir processo contra a deputada Tabata Amaral (SP) e outros sete parlamentares que contrariaram o partido e votaram a favor da reforma da Previdência, no primeiro turno, na Câmara.
Pelo estatuto da legenda, as punições variam desde uma advertência até a expulsão. A comissão tem 45 dias para elaborar um parecer consultivo e a decisão cabe ao diretório nacional do PDT, que só deve ser convocado entre setembro e outubro.
No dia da votação, 8 dos 27 deputados presentes votaram a favor da reforma: Tabata, Alex Santana (BA), Subtenente Gonzaga (MG), Silvia Cristina (RO), Marlon Santos (RS), Jesus Sérgio (AC), Gil Cutrim (MA) e Flávio Nogueira (PI).
Eles desrespeitaram o chamado "fechamento de questão". No jargão político, quando uma sigla fecha questão, significa que determinou que aquela decisão deve ser cumprida por todos os seus integrantes, sob risco de punição.
O presidente nacional do PDT, Carlos Lupi, disse esperar que estes deputados mudem de posição no segundo turno da votação da reforma na Câmara, em agosto.
"Como o processo não está esgotado, tem o segundo turno, e acreditamos que o ser humano é capaz de evoluir, quem sabe alguns evoluem, ouvem o que está se fazendo de maldade com a base da sociedade que ganha até R$ 2.500 e voltem atrás e votem com o partido", disse Lupi.
O encontro na sede do partido, que reuniu a executiva nacional da sigla, decidiu que estes oito estão com suas atividades partidárias suspensas até a deliberação do diretório. Ou seja, nos próximos meses, esses parlamentares não podem usar o partido e perdem as funções que têm por causa da legenda.
Eles podem, inclusive, ser retirados das comissões que integram na Câmara. Tabata, por exemplo, faz parte da Comissão de Educação. A indicação de membros para esses colegiados é prerrogativa do líder da bancada.
"Os oito parlamentares estão com suas atividades partidárias, de representação na Câmara suspensas. Nenhum desses oito pode falar em nome do partido, ter função em nome do partido, pode participar da direção do partido até a decisão final do diretório nacional", disse Carlos Lupi.
Nesta quarta, em seminário em Salvador, o ex-governador do Ceará Ciro Gomes, uma das principais lideranças do PDT, evitou comentar a abertura do processo contra os deputados da legenda.
"Não vou falar mais daquilo que eu falei. [O processo] vai ao Diretório Nacional e, como sou membro do Diretório e tenho certa ascendência no partido, não seria ético que eu antecipasse qualquer tipo de opinião", disse a jornalistas.
Minutos depois, quando respondeu a pergunta de militantes do partido, afirmou que quem votou a favor da reforma deveria "ir para a rua à procura de outro partido".
"Você tem partido pra todo gosto no Brasil. Mas você não pode ser trabalhista, ser de um partido que criou o sistema de Previdência e seguridade social do Brasil e vir agora votar contra o povo", afirmou.
Outra decisão que ainda precisa ser aprovada pelo diretório é a de não dar legenda a candidatos que sejam apoiados por grupos como o Acredito, do qual Tabata faz parte.
"Vamos encaminhar ao diretório nacional que o partido não dará legenda a filiado que tenha financiamento clandestino, patrocinado por organizações pessoais, privadas, particulares, de gente muito poderosa que se utiliza de grupos para financiar e ter o voto de parlamentares dentro da sigla do PDT", disse Lupi.
"Não queremos. Quem quer seguir com patrocínio privado de sistema financeiro, de homens muito ricos, muito poderosos tem 36 partidos para ir", insistiu pedetista.
O Acredito é um movimento visto como de centro, que tem como bandeiras o combate à desigualdade e a rejeição à polarização. Segundo o grupo, as atividades são bancadas com contribuições de pessoas físicas. A organização não participa do financiamento de campanhas, mas dá visibilidade aos membros, o que ajuda na atração de doações.
A assessoria da deputada informou que não iria comentar o caso. Em texto publicado na Folha no domingo (14), ela criticou a falta de "democracia interna" nas estruturas partidárias. Em resposta, Lupi disse que a Tabata pratica "democracia da conveniência".
O RenovaBR, entidade suprapartidária que capacita candidatos e que teve Tabata entre as alunas da turma de 2018, divulgou nota nesta quarta em defesa da parlamentar e dos movimentos de renovação. No texto, o fundador do programa, Eduardo Mufarej, afirma que a iniciativa "não é clandestina".
"Causa estranheza que oito deputados federais do PDT tenham votado a favor da reforma da Previdência, mas os ataques sejam centrados na deputada federal Tabata Amaral e nos movimentos cívicos de renovação política. Certamente há muita gente se perguntando o que incomoda tanto", diz o comunicado.
Sem citar nenhum dirigente, Mufarej sustenta que "partidos políticos não deveriam ter donos, e congressistas não devem se submeter a ninguém que se julgue proprietário da consciência alheia". Afirma ainda ser urgente repensar o ambiente das legendas para garantir democracia interna.
"Há partidos políticos que, nos últimos 15 anos, estão sob o comando da mesma pessoa. Talvez, a permanência de um só político na mesma posição por tanto tempo tenha o acostumado a imaginar que os cargos públicos devam ser exercidos pelos mesmos indivíduos sem renovação", diz a nota.
Lupi assumiu a presidência do PDT interinamente em 2004. Ele se licenciou do cargo em períodos específicos, mas retomou a função em 2012, sendo reeleito desde então.
O PSB também abriu processo contra deputados que desrespeitaram o fechamento de questão. Estão na mira os 11 dos 32 deputados do partido que estavam no plenário da Câmara e votaram a favor da reforma da Previdência.
Como a Folha mostrou, as legendas poderão ter impacto no repasse de valores do fundo eleitoral caso percam os integrantes das bancadas. A parcela destinada a cada sigla é hoje decidida de acordo com o número corrigido de parlamentares no Congresso, e não o número de eleitos.
Como PDT e PSB correm o risco de perder cerca de 30% das cadeiras se a expulsão dos dissidentes for a decisão final, os dois partidos poderão ter direito a um percentual menor no fundo público que financia campanhas.
RELAÇÃO ENTRE DEPUTADOS E PARTIDOS
Fidelidade partidária
A Constituição e as leis brasileiras estabelecem a fidelidade partidária como princípio e asseguram às siglas o direito de estabelecer regras para o cumprimento, bem como sanções em caso de desobediência
Fechamento de questão
O fechamento de questão é quando uma instância da sigla estabelece a forma como os parlamentares devem votar um determinado projeto. O descumprimento pode acarretar as punições previstas no estatuto
Mandato
O entendimento do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) é que o partido não pode requerer o mandato de um parlamentar que tenha sido expulso por ele. O político que foi afastado pode se filiar imediatamente a outra legenda
Expulsão
Geralmente o processo é aberto após alguma representação. A direção do partido encaminha o caso à comissão de ética, que instaura um procedimento e deve garantir amplo direito de defesa. A direção recebe o relatório e dá a palavra final
Outras sanções
As punições para infidelidade, como no caso de desobediência ao fechamento de questão, estão no estatuto da legenda. Há gradações que vão de advertência e censura pública até expulsão. No caso de parlamentares, a lei admite, por exemplo, desligamento temporário da bancada, suspensão do direito de voto nas reuniões internas e perda de funções