O polêmico general gaúcho Antonio Hamilton Mourão voltou a ser assunto nacional neste fim de semana após afirmar, em palestra realizada na sexta-feira (15), em uma loja maçônica de Brasília, que uma "intervenção militar" pode ser adotada no país caso o Poder Judiciário "não solucione o problema político" — a crise generalizada de corrupção nos altos escalões governamentais. Segundo Mourão, seus "companheiros do Alto Comando do Exército" entendem que essa "imposição não será fácil" e avaliam que ainda não é o momento para a ação, mas admitem que ela poderá ocorrer.
Natural de Porto Alegre, Mourão foi exonerado do Comando Militar do Sul, na Capital, em outubro de 2015, depois de fazer duras críticas públicas à então presidente, Dilma Rousseff (PT). À época, o general permitiu que ocorresse em Santa Maria uma homenagem de subordinados ao coronel Brilhante Ustra. Já falecido, Ustra é considerado um dos símbolos do regime militar (1964 a 1985) – nos "anos de chumbo", ele comandou o DOI-Codi do II Exército, em São Paulo, onde teriam morrido 45 prisioneiros. Como consequência, Mourão acabou transferido para Brasília, na função de secretário de Economia e Finanças do Exército, cargo burocrático que não lhe confere poder sobre efetivos armados.
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De acordo com Mourão, em sua palestra de sexta-feira na capital federal, o Exército já teria "planejamentos muito bem feitos" sobre uma possível intervenção no país.
— Até chegar o momento em que, ou as instituições solucionam o problema político, pela ação do Judiciário, retirando da vida pública esses elementos envolvidos em todos os ilícitos, ou então nós (militares) teremos que impor isso (intervenção) — afirmou o general, em uma exposição que durou quase uma hora. — Então, se tiver que haver, haverá (intervenção). Mas hoje nós consideramos que as aproximações sucessivas terão que ser feitas.
Durante a palestra, realizada após o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, denunciar pela segunda vez o presidente Michel Temer por participação em organização criminosa e obstrução de Justiça, o general falou por três vezes na possibilidade de intervenção militar diante da crise enfrentada pelo país.
O general Mourão afirmou que "os Poderes terão que buscar uma solução. Se não conseguirem, chegará a hora em que teremos que impor uma solução e essa imposição não será fácil, ela trará problemas". Por fim, acrescentou lembrando o juramento que os militares fizeram de "compromisso com a Pátria, independente (sic) de sermos aplaudidos ou não". E encerrou:
— O que interessa é termos a consciência tranquila de que fizemos o melhor e que buscamos, de qualquer maneira, atingir esse objetivo. Então, se tiver que haver, haverá.
Posição de Mourão causa desconforto no comando do Exército
A atitude do general causou desconforto em Brasília. Oficiais-generais ouvidos pelo jornal O Estado de S. Paulo criticaram a afirmação de Mourão, considerada desnecessária neste momento de crise.
O comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, foi enfático e disse que "não há qualquer possibilidade" de intervenção militar.
— Desde 1985, não somos responsáveis por turbulência na vida nacional e, assim, vai prosseguir — afirmou Villas Bôas, acrescentando que a Força defende "a manutenção da democracia, a preservação da Constituição, além da proteção das instituições".
Depois de salientar que "internamente, já foi conversado e o problema está superado", o comandante do Exército insistiu que qualquer emprego de Forças Armadas será por iniciativa de um dos Poderes. No sábado (16), o ministro da Defesa, Raul Jungmann, conversou com o comandante do Exército, que telefonou para o general Mourão para saber o que havia ocorrido. O general, então, explicou o contexto das declarações.
Questionado, Mourão diz que não defendeu a tomada de poder pelos militares
Procurado neste domingo (17), Mourão disse que "não defendeu (a tomada de poder pelos militares), apenas respondeu a uma pergunta". Para o general, "se ninguém se acertar, terá de haver algum tipo de intervenção, para colocar ordem na casa". Sobre quem faria a intervenção, se ela seria militar, ele responde que "não existe fórmula de bolo" para isso. E emendou:
— Não (não é intervenção militar). Isso não é uma revolução. Não é uma tomada de poder. Não existe nada disso. É simplesmente alguém que coloque as coisas em ordem, e diga: "atenção, minha gente vamos nos acertar aqui e deixar as coisas de forma que o país consiga andar e não como estamos". Foi isso que disse, mas as pessoas interpretam as coisas cada uma de sua forma. Os grupos que pedem intervenção é que estão fazendo essa onda em torno desse assunto.
Mourão explicou, no entanto, que não estava "insuflando nada" ou "pregando intervenção militar" e que a interpretação das suas palavras "é livre". Ele afirmou que falava em seu nome, não no do Exército, embora estivesse fardado durante a palestra.
O general permanece no serviço ativo no Exército até março do ano que vem, quando passará para a reserva. O general Mourão disse ao jornal O Estado de S.Paulo que não vai se candidatar, apesar de existir página nas redes sociais sugerindo seu nome para presidente da República.
— Não. Não sou político. Sou soldado.