Há cerca de três meses, uma notícia falsa de que a ex-presidente Dilma Rousseff teria um namorado provocou rebuliço nas redes sociais. Hoje, o episódio é visto com bom humor – ao menos por parte do "consorte", o brasilianista norte-americano James Green, professor de história latino-americana na Brown University e ativista dos direitos LBTG.
Green, 65 anos, fora surpreendido em maio passado com uma avalanche de mensagens. Algumas o questionavam: "Então é você o novo affair de Dilma?". Noutras, havia recomendações: "Cuide bem dela". Mais suscintamente, outro tipo de texto vibrava: "Aeeee Dilminha!". Apareceu até "Mais amor, menos golpe", ele conta, divertindo-se.
– Mas não tem nada a ver – adverte o historiador, em conversa com ZH por telefone.
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Afinal, como surgiu essa história?
– Dilma era amiga de Herbert Daniel (guerrilheiro mineiro, como a ex-presidente, que lutou contra o regime militar e dividiu apartamento com ela em 1969) – explica Green. – Ambos participavam de uma organização chamada Colina. Como estava escrevendo um livro sobre Daniel (Brazilian Gay Revolutionary: The Life and Times of Herbert Daniel, que será lançado em 2018 pela Duke University Press), eu quis entrevistá-la. Fui ao Palácio do Alvorada com um grupo de historiadores que a apoiava no ano passado. E tivemos uma empatia muito grande. Depois disso, eu a convidei para fazer um tour nos Estados Unidos, quando ela já estava afastada da presidência. Foi quando nos fotografaram juntos e surgiu o boato de que estávamos namorando.
Perguntado se era só amizade, mesmo, o historiador é enfático:
– É claro! Sou casado há 24 anos com um israelense (Moshe Sluhovsky).
Também autor dos livros Apesar de Vocês, sobre a resistência à ditadura brasileira originária dos EUA, e Carnaval: Uma História da Homossexualidade Masculina no Brasil do Século 20, Green ainda leciona na Universidade Hebraica de Jerusalém – ele e o companheiro dividem residência entre os EUA e Israel. Diz que o episódio com Dilma acabou servindo para "consolidar uma grande amizade" com a ex-presidente. Ele, que é um notório defensor de causas de gênero e sexualidade, exaspera-se apenas ao falar sobre o que revela a disseminação dessa notícia falsa:
– O episódio reflete a misoginia que ronda Dilma. Uma mulher não pode ser livre e independente; tem que ter sempre um homem para apoiá-la. Quando ela aparece com alguém, surge uma especulação imediata sobre um relacionamento romântico. É ridículo.
Green integrou o Convergência Socialista, grupo de esquerda do PT que, depois de divergências dentro o partido, fundou o PSTU. Diz-se admirador de Dilma "por uma série de motivos", incluindo a tentativa de implementar uma agenda social e o fato de ter lutado contra a ditadura militar.
– Admiro todos os que lutaram – sintetiza o historiador.
Dilma o surpreendeu, afirma, quando demonstrou que conhecia melhor do que ele próprio os artistas do movimento impressionista que teve lugar na França a partir do século 19 – algo no que Green se diz entendedor. Mas logo volta a brincar sobre o suposto e desmentido namoro:
– Meu companheiro ficou enciumado. E Dilma dizia ver razão para esse ciúme...
Portais chegaram a publicar detalhes do affair apenas amparando-se em fotografias dos dois amigos. As imagens, que os mostravam abraçados em um restaurante em frente ao Lincoln Center, em Nova York e folheando livros no sebo The Strand, demonstravam afeto – o que foi suficiente para manchetes dizendo que os dois estariam inseparáveis na turnê que a ex-presidente fazia por nove universidades da costa leste norte-americana, entre elas a Brown, onde Green leciona, Harvard e City University of New York.
– Nós conversamos pelo telefone e sempre queremos nos encontrar – conta Green. – Espero vê-la quando lançar meu livro (sobre Herbert Daniel) em Porto Alegre – complementa o amigo de Dilma.