Em um país rachado pela polarização, abatido pela crise econômica e desconfiado de uma elite política envolvida em suspeitas de corrupção, um grupo de intelectuais organiza, desde o final de abril, um movimento apartidário em busca de alternativas. O Projeto Brasil Nação tem como objetivo unir trabalhadores, empresários e classe média em torno de um consenso que passa pela retomada do desenvolvimento econômico, a diminuição das desigualdades e a proteção ambiental.
Lançado inicialmente em São Paulo, o movimento será apresentado e debatido nesta quinta-feira (29) na Assembleia Legislativa, em Porto Alegre, com a presença de seu principal líder, o economista Luiz Carlos Bresser-Pereira. Ex-ministro dos governos José Sarney e Fernando Henrique Cardoso, ele articulou as primeiras reuniões com acadêmicos, advogados, artistas e políticos. Esses encontros resultaram no Manifesto do Projeto Brasil Nação, documento que resume as ideias do grupo e já conta com mais de 10 mil signatários, entre os quais o físico Rogério Cezar de Cerqueira Leite, a psicanalista Maria Rita Kehl, o jurista Fábio Konder Comparato, o bispo emérito dom Pedro Casaldáliga e Mario Bernardini, dirigente da Associação Brasileira de Máquinas e Equipamentos (Abimaq). Do Rio Grande do Sul, lideram a iniciativa os economistas Cláudio Accurso e Pedro Cezar Dutra Fonseca e o cientista político Benedito Tadeu César.
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O manifesto, que gira em torno da ideia de fortalecimento da nação, constata que o Brasil deixou de ser o país coeso da década de 1980, que buscava a democracia e a justiça social, e se tornou pátria do ódio e de uma sociedade dividida. Uma crise econômica de longo prazo, a descoberta de um amplo esquema de corrupção e a agenda controversa de um governo que não nasceu nas urnas completam o cenário de beco sem saída.
"Cabe a nós repensarmos o Brasil para projetar o seu futuro – hoje bloqueado, fadado à extinção do empresariado privado industrial e à miséria dos cidadãos. Nossos pilares são: autonomia nacional, democracia, liberdade individual, desenvolvimento econômico, diminuição da desigualdade, segurança e proteção do ambiente – os pilares de um regime desenvolvimentista e social", diz o documento. O movimento é crítico à agenda econômica do atual governo, considerada radicalmente neoliberal, mas também rechaça práticas populistas de esquerda e de direita. O grupo formulou uma pauta econômica alternativa (veja detalhe no fim da matéria), com foco em retomada do investimento público, reforma tributária, juro baixo, taxa de câmbio que promova competitividade a empresas brasileiras e política fiscal que assegure prioridade à educação e à saúde.
Busca de consenso
De acordo com Pedro Fonseca, a intenção do movimento agora é ampliar a participação e o debate nos Estados, a partir da formação de núcleos compostos por representantes de entidades sociais e sindicais.
– Os partidos não conseguem formular um projeto para o país e estão imersos também na crise, pois esta não é só econômica, mas também política. A crise tem múltiplas dimensões, tira esperanças e força que pensemos o curto prazo, soluções imediatas, quando a maioria das questões a resolver é complexa – avalia o economista, ressaltando que políticos, independentemente de filiação partidária, são bem-vindos no movimento para que possam estabelecer pontos de diálogo.
Fonseca afirma ser necessário ao país romper a polarização que causou um fosso na sociedade e buscar consenso em torno de uma pauta mínima que aponte caminhos para o futuro.
– Acreditamos que, mesmo se mantendo as diferenças e as divergências, podemos chegar a alguns objetivos com que a maioria se identifique, embora se possa manter as divergências quanto a meios e prazos. Evidentemente, consenso não é factível e talvez nem desejável, mas isso não impede que se busquem alternativas e soluções de compromisso – afirma Fonseca, observando que os organizadores esperam influenciar candidatos nas próximas eleições.
– Nossa proposta não está atrelada e nem deve se atrelar a uma candidatura específica, embora os participantes sejam livres para apoiar as forças que julgarem adequadas. O projeto não é plano de governo, é mais do que isso: é uma agenda para o futuro do país – completa o economista.
SERVIÇO
Lançamento do "Projeto Brasil Nação"
Local: Teatro Dante Barone da Assembleia Legislativa
Data: 29 de junho
Horário: a partir das 18h30min
Entrada gratuita
Para saber mais, visite www.bresserpereira.org.br
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A PAUTA MÍNIMA DO MOVIMENTO
O manifesto do Projeto Brasil Nação traz uma agenda para a área econômica com cinco diretrizes:
1 - Regra fiscal que permita a atuação contracíclica do gasto público e assegure prioridade à educação e à saúde.
2 - Taxa básica de juros mais baixa, compatível com o praticado por economias semelhantes à do Brasil.
3 - Superávit na conta corrente do balanço de pagamentos, necessário para uma taxa de câmbio que assegure competitividade a empresas eficientes.
4 - Retomada do investimento público em nível capaz de estimular a economia e garantir investimento rentável para empresários e salários que reflitam uma política de redução da desigualdade.
5 - Reforma tributária que torne os impostos progressivos.