A proximidade com os homens fortes da política nacional e a condição de representante da Odebrecht foram herdadas de berço por Cláudio Melo Filho, o novo delator da Operação Lava-Jato que, em depoimento ao Ministério Público Federal, pôs a República em colapso. Ele cita como beneficiários de repasses ou doações de campanha, registradas ou via caixa 2, lideranças como o presidente Michel Temer, os senadores Renan Calheiros, Romero Jucá e Eunício Oliveira e os ministros Eliseu Padilha e Moreira Franco, todos do PMDB.
Natural da Bahia, Melo Filho, 49 anos, nutre relação de amizade com vários políticos de alto escalão do Nordeste e do Norte. Ele foi introduzido nesse mundo de poder por seu pai, Cláudio Melo, que era diretor de Relações Institucionais da Odebrecht até 2004. Um grave problema de saúde impediu o patriarca de seguir na função, que acabou sendo assumida por filho.
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Antes de ascender ao cargo que o levou a tramar pautas de interesse da Odebrecht a partir de pagamentos a políticos, Melo Filho já havia ocupado diferentes funções na maior empreiteira do Brasil. Ingressou em 1989, como estagiário de uma obra em Luziânia (GO). Depois, atuou na construção do metrô do Distrito Federal. Ao se graduar em Administração de Empresas, passou a trabalhar com contabilidade e, entre 1993 e 1998, foi transferido para um setor de planejamento da Odebrecht.
Em agosto de 2004, enfim, se mudou para Brasília para assumir a direção de Relações Institucionais da empresa. De largada, desfrutava de relacionamentos com homens poderosos que havia conquistado devido à atuação do pai. Um desses interlocutores era Geddel Vieira Lima (PMDB), também da Bahia, ministro poderoso do governo Temer até dias atrás.
"Minha relação com Geddel Vieira Lima vem da amizade dele com meu pai. Em 2004, após a doença de meu pai, nossas relações se aproximaram mais, quando assumi em Brasília a função de diretor de Relações Institucionais.
Como narrarei abaixo, desde o ano de 2006 até o ano de 2014 participei dos pagamentos que foram realizados a Geddel Vieira Lima. Eu era o principal elo de comunicação entre Geddel e a Odebrecht. Eu e Geddel nos falávamos com muita constância, seja para tratar de assuntos da empresa, seja para tratar de assuntos pessoais, pois criamos uma relação muito próxima", narrou Melo Filho na sua delação premiada, registrada em primeira pessoa.
Nas 82 páginas de depoimento, o executivo relata a proximidade com políticos proeminentes e detalha como eram feitos os pagamentos a eles, muitas vezes por intermédio de doações eleitorais registradas. Se enquadra nesse perfil a relação com Hugo Napoleão (PSD), ex-governador do Piauí, ex-senador e amigo do pai de Melo Filho. "Era amigo de meu pai, ambos piauienses, e foi governador do Estado do Piauí. Em razão da sua relação com meu pai, solicitou-me pagamento para a campanha de 2014, que foi aprovado", diz o delator.
Laços de parentesco também costuram a história de interferência do ex-diretor da Odebrecht em assuntos da República. "Conheço Wellington Moreira Franco há muitos anos, pois possuo parentesco distante com ele. Figura expoente do PMDB, esteve presente em vários momentos importantes do país. Tenho uma relação pessoal com Moreira Franco e a utilizei nos momentos que precisei. De forma constante, nos reunimos profissionalmente e também por amizade. Moreira Franco possui aproximação qualificada com Michel Temer e isso foi relevante para meu relacionamento com ele", relatou o ex-diretor da empreiteira.
Melo Filho diz que, na condução do relacionamento da empresa com o Congresso, garantiu pagamentos a 51 políticos de 11 partidos. Seu principal interlocutor era o senador Romero Jucá (PMDB-RR), com quem discutia a tramitação de pautas de interesse da Odebrecht na Câmara e no Senado. Em troca, é claro, de recursos que eram repassados aos parlamentares. O foco, narra Melo Filho, era manter sempre azeitada a relação com os mais influentes e decisivos homens da política nacional.
O delator está em liberdade. Em março, prestou depoimento à Polícia Federal na 26ª fase da Lava-Jato, batizada Xepa, que apurou a existência de um setor clandestino na Odebrecht destinado ao pagamento de propinas. Dois meses depois, em maio, Melo Filho foi denunciado pelo Ministério Público Federal sob acusação de oferecer R$ 5 milhões ao ex-senador Gim Argello (ex-PTB-DF) para blindar executivos da Odebrecht na CPI da Petrobras. O juiz Sergio Moro, contudo, considerou as evidências frágeis e não aceitou a denúncia.