O histórico comprova que reagir mesmo sem intenção durante assaltos pode ser fatal. Dos 17 latrocínios (roubos com morte) em Caxias do Sul desde 2014, 14 casos tiveram o desfecho trágico apenas porque o refém fez algum movimento brusco que foi interpretado como "provocação" ou porque a vítima decidiu fugir ou lutar contra bandidos. Os quatro assaltantes mortos por civis neste ano seriam uma exceção num ciclo onde o cidadão só tem desvantagem.
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Cinco das vítimas de latrocínio desde 2014 eram vigilantes. A lista ainda inclui um policial militar, que fazia segurança de uma pizzaria e uma servidora do Instituto Geral de Perícias (IGP). Ou seja, mesmo para quem está armado e treinado, enfrentar bandidos quase sempre tem um resultado desfavorável.
– O elemento surpresa está a favor do assaltante, o que deixa o sucesso de uma reação por parte da vítima bastante limitado. Mesmo policiais treinados precisam avaliar muito bem a situação. A BM sempre orienta que o mais importante é preservar a vida – aconselha o major Jorge Emerson Ribas, comandante do 12º Batalhão de Polícia Militar.
Outro fator que preocupa é a mudança no perfil dos criminosos, cada vez mais inconsequentes. O "amadorismo" pode ter vitimado o florista Fernando Osvaldo Weber, 43 anos, no início do mês. As imagens do crime mostram que o Nissan Tiida do empresário ainda estava em movimento quando os bandidos atacaram. Em depoimento, o autor do crime, Jones Martins da Fonseca, 23, alegou que o tiro foi acidental: alega que bateu com a arma no vidro do motorista e ocorreu o disparo. É esse "despreparo" dos bandidos mais jovens que serve de alerta para a população.
– Antigamente havia um razoável grau de consciência da gravidade (do fato) por parte de criminosos. A inconsequência, temperada com o consumo de drogas, parecer ter eliminado esse freio. Já não se observa nenhum receio da pena alta do latrocínio (20 a 30 anos). O comportamento mais cruel resulta em agressões sem motivo – aponta o delegado Mário Mombach, titular da Delegacia de Furtos, Roubos, Entorpecentes e Capturas (Defrec).
Dicas
:: Os ladrões se valem de nossos momentos de descuido. Em caso de assalto, não reaja.
:: Mesmo que você tenha curso de tiro, o ladrão sempre vai estar mais preparado do que você.
:: Evite movimentos bruscos durante os ataques, pois os criminosos podem entender que você vai tentar uma reação.
:: Adote medidas de segurança.
:: Observe a movimentação de suspeitos perto de sua casa ou empresa.
:: No trânsito, observe se não está sendo seguido.
:: Evite guardar muito dinheiro na empresa ou em casa.
:: Ao ser vítima de assalto ou qualquer outro tipo de crime, acione a Brigada Militar e registre a ocorrência.
‘O treinamento é para repelir ações impulsivas’, diz instrutor
O avanço da criminalidade faz com que cada vez mais pessoas busquem algum tipo de preparo ou proteção para um eventual confronto com assaltantes. Mesmo sem divulgar números, o movimento na Casa das Armas quadruplicou desde 2014. O interesse está maior, porém, a venda de armas esbarra na legislação.
– A crise potencializa o sentimento de insegurança. A violência está batendo na porta de todo mundo e estão todos convencidos que precisam fazer algo. Também há muita procura de quem foi vítima de algum caso recente. Nossa primeira tarefa é fazer essa pessoa distinguir o ímpeto de fazer justiça e a legítima defesa – explica o instrutor de tiro Gustavo Cassina.
Por outro lado, os cursos de tiro estão com turmas extras. São pessoas que querem estar preparadas para qualquer situação, segundo Cassina.
– Sou contra o senso comum da não reação. Não é dizer para enfrentar qualquer bandido. É a capacidade de manter a calma e avaliar os riscos. O que faz toda a diferença no sucesso de uma ação de defesa é o preparo psicológico – opina.
O especialista sugere muito treinamento e o desenvolvimento de uma arte marcial. Outro ponto chave é o estado de alerta.
– Nenhum bandido surge do nada. O que acontece é as pessoas estarem distraídas. É preciso ter extrema atenção ao que acontece a nossa volta quando estamos na rua. O treinamento é para repelir ações impulsivas – complementa.
Para Cassina, a defesa pessoal é saber que reagir num assalto é assumir riscos, inclusive de provocar uma tragédia. Por isso, a regra é manter a calma e avaliar toda a situação.
– Ele só quer levar bens materiais? Deixe. Uma coisa é a opção de colocar a minha vida em risco. Outra é expor mais pessoas. Tudo é discernimento.