O surto de dengue em Bento Gonçalves chama atenção para uma série de medidas que já estão sendo tomadas no município para conter o número de focos do mosquito e o avanço da doença. Atualmente são 120 casos confirmados, sendo 117 autóctones, ou seja, o maior número é de pessoas que foram infectadas dentro da própria cidade. Dados do Painel de Casos de Dengue do Rio Grande do Sul, com informações do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), mostram a cidade como a mais afetada de toda a região da Serra. Em comparação com o Estado, o município aparece em 23º lugar no número de casos confirmados.
De acordo com o secretário de Saúde de Bento Gonçalves, Gilberto Júnior, não é possível afirmar o que pode estar contribuindo para a alta de casos neste ano, mas que o trabalho de conter o avanço do mosquito depende, também, da colaboração dos moradores. As medidas estão sendo tomadas tanto com relação aos pontos que já registraram focos do mosquito quanto em ações para conscientizar os moradores a cuidarem com água parada e acúmulo de entulhos, que acabam potencializando a criação desses focos.
— Estamos trabalhando fortemente para reduzir esse surto, é uma questão que a gente precisa pensar como comunidade. Eu vejo que nosso município está abraçado, nós fazemos ações diretas, conversamos com a comunidade dos bairros com maior número de casos confirmados, vamos nos postos de saúde para entender o que está acontecendo. Mas a dengue é um assunto de conscientização de todos, de moradores, de famílias, vizinhos, é um trabalho em equipe — menciona o secretário.
Entre as ações comumente feitas pelo município, estão limpezas e manutenção de bairros com pontos de resíduos acumulados e retirada de lixo e entulho. As ações de conscientização ocorrem em escolas, empresas e, em breve, terão o auxílio do Exército na divulgação de como limpar terrenos, calhas e fazer descartes corretos.
Os 120 casos registrados em 2023 em comparação representam um aumento de 380% em relação ao todo o ano passado no município, que teve 25 pacientes com dengue (sendo 10 autóctones). Na comparação com 2015 (início da contagem do Painel de Casos de Dengue), em que houve cinco confirmações e nenhum caso autóctone, o quadro atual na cidade representa um aumento ainda mais significativo, de 2.300%.
Pelas ruas de Bento Gonçalves, agentes de combate às endemias circulam rotineiramente para falar com moradores e conferir se nas áreas abertas das residências existe algum possível reservatório de água que possa contribuir com a criação do mosquito. As equipes orientam sobre cuidados com baldes, vasos de plantas, caixa d'água e calhas. Conforme os agentes, por causa da estiagem que atinge o Rio Grande do Sul, muitos moradores acabam fazendo reserva de água da chuva e esses pontos, se não estiverem corretamente fechados e cuidados, podem contribuir com a criação do mosquito.
— Sempre fazemos a ação de bota-fora contra a dengue, o fumacê, e orientamos os moradores sobre o descarte correto de entulhos e recolhemos lixo e entulhos maiores. Quando vemos que os terrenos têm algum balde, caixa d'água ou calha, nós olhamos e orientamos os moradores sobre o que fazer. É importante sempre verificar a calha porque quando cai alguma folha, essa folha pode entupir a calha e fazer a água da chuva ficar parada, então é preciso ficar atento porque isso potencializa a criação do mosquito — ensina a agente de combate às endemias Kellin Skibinski.
No caso de entulhos maiores, estão móveis velhos, itens em geral capazes de segurar água ou pneus, que acabam sendo descartados incorretamente, abandonados em terrenos ou na parte de fora de residências. Conforme os agentes, a água da chuva acumulada nesses locais contribui para a criação das larvas do mosquito, que precisam de água limpa, não necessariamente potável, para se desenvolver.
A quantidade de larvas, conforme a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), depende da quantidade de sangue ingerido pelas fêmeas. O sangue é necessário para a manutenção desses ovos, que variam de 100 a 200 a cada desova.
Para a doméstica Simone Lemes de Morais, que mora no município, o trabalho em equipe mencionado pelo secretário de Saúde é essencial, principalmente, pelos pontos que acumulam lixos e entulhos, que acabam prejudicando toda a comunidade.
— Já aconteceu de eu recolher garrafas, sacolinhas e outros lixos que sempre param no meu portão. As pessoas sabem o que estão fazendo quando jogam o lixo na rua, então é só pegar o próprio lixo e jogar no lugar certo porque jogar no chão acaba prejudicando todo mundo, não só a gente que cuida e limpa certinho, mas eles também. Espero que uma hora eles comecem a colocar a mão na consciência e cuidem um pouco mais — diz Simone.
Outra medida adotada pelo município para monitorar a dengue são as armadilhas, conhecidas como ovitrampas. Conforme a Fiocruz, as armadilhas são baldes ou vasos de flor deixados com água em pontos estratégicos para que as fêmeas depositem os ovos. Dentro desses recipientes, são colocadas palhetas de eucatex para fazer a contagem de ovos e controlar a proliferação.
Segundo explica Kellin Skibinski, em Bento Gonçalves as ovitrampas são deixadas nas quintas e sextas-feiras, e retiradas nas segundas e terças. Depois de recolhidas, as armadilhas são analisadas em laboratório, onde é feita a contagem de ovos na palheta. Após a análise, elas são incineradas e recolocadas. Ao todo, são 100 ovitrampas distribuídas em todo o município.
O trabalho de combate à dengue no Estado
Conforme Marcelo Vallandro, diretor adjunto do Centro Estadual de Vigilância em Saúde, os casos de dengue não são novidade no Estado. Em 2022, o Rio Grande do Sul vivenciou o pior ano epidêmico e registrou cerca de 67 mil casos e 66 mortes. Este ano já é considerado o segundo pior, com 17 mil casos e 35 mortes, conforme os dados do Painel de Casos de Dengue.
— Trabalhamos fortemente com a transparência e divulgação de informações. É essencial que toda a população esteja ciente do que está acontecendo e da gravidade da dengue. Elaboramos e divulgamos comunicados sobre os riscos. A dengue é uma luta que nós precisamos lutar em conjunto, tanto município quanto Estado e população — pontua o diretor.
Ainda conforme o representante do Estado, é essencial que pessoas que apresentem alguns sintomas busquem atendimento médico imediato e não se mediquem sozinhas. Marcelo menciona ainda que muitos pacientes acabam confundindo os sintomas da dengue com os da gripe e só vão aos postos de saúde quando os sintomas já estão mais graves. A procura de atendimento, assim que surgem os primeiros sintomas, pode contribuir para que o caso não se agrave para o quadro de dengue hemorrágica, responsável por grande parte das mortes.
Quais são os sintomas de dengue e o que fazer
Conforme a Secretaria de Saúde do Estado, entre os principais sintomas apresentados por pacientes infectados pelo mosquito Aedes aegypti nos postos de atendimento estão: mialgia, que é uma dor muito forte e ocorre em todo o corpo, febre alta e repentina acima de 39ºC, manchas vermelhas no corpo, mal-estar geral, náusea, vômito e diarreia. Além disso, os sinais podem se agravar para a dengue hemorrágica, ocasionando o extravasamento de plasma e/ou hemorragias, que podem levar a pessoa ao choque grave e morte.
Em média, cada pessoa infectada demora entre três e 15 dias para apresentar os sintomas. O ideal, conforme apontado por Vallandro, é que pacientes que apresentem os sintomas busquem as unidades de saúde dos próprios bairros, para que recebam o atendimento adequado. É ideal ainda, após a confirmação do caso, a ingestão de muita água e que o paciente evite fazer uso de medicamentos por conta própria, sem a recomendação de um profissional.