A acessibilidade é um dos temas levados para os palcos da sexta edição da Gramado Summit, que está no segundo dia de evento nesta quinta-feira (13). No encerramento do primeiro dia, a influenciadora digital Pequena Lo, contou como a deficiência causada pela displasia óssea não a impediu de se tornar um fenômeno na internet, com mais de 12 milhões de seguidores. No palco Share, Amanda Lyra, líder do time de acessibilidade i-cherry, conversou com os participantes.
Em uma 'motinha', como chama carinhosamente a influenciadora Lorrane Silva, chamada de Pequena Lo, subiu no Palco Atitus (principal) e contou para os cerca de 3 mil participantes sobre a forma como o humor e as brincadeiras da infância contribuíram para que houvesse o carinhoso encontro profissional entre ela e a produção de conteúdos voltados para o entretenimento.
Com 26 anos e formada em psicologia, Pequena Lo conta quando os amigos, que achavam graça das brincadeiras que ela fazia, davam incentivo para que ela começasse a gravar vídeos para a internet. Em 2015, a jovem decidiu dar ouvidos à ideia e, na época, não imaginava que fosse proporcionar à ela fama e influência para milhares de pessoas.
— Eu sempre via graça em tudo, desde pequena eu via graça ou piada em coisas cotidianas. Tudo tinha graça e comecei a pensar nessas coisas para tornar em vídeo. A ideia de quando o câmera que está gravando um casamento começa a te filmar e você está comendo e precisa disfarçar foi um sucesso e, a partir disso, o cotidiano começou a ser transformado em vídeo e o engajamento veio. 100 mil pessoas, 200 mil, um milhão. Todo esse engajamento, seguidores, viralização me tornaram refém daquilo. E com a fama chegam as partes negativas, os haters e nós nem sempre estamos preparados para receber. Pouco tempo depois dessa repercussão toda, eu estava no salão com a minha mãe, para fazer o cabelo, e comecei a passar mal e ninguém entendeu o que podia estar acontecendo comigo. Quando voltei para casa eu entendi que era a internet que estava me fazendo mal — revelou a influenciadora.
Logo após o episódio no salão de beleza, Pequena Lo foi diagnosticada com ansiedade, burnout e síndrome do pânico. A partir daquele momento, a jovem psicóloga, que na época estava morando em São Paulo, decidiu se recolher e voltar para o conforto de casa e o colo da família, em Minas Gerais.
Conforme conta a influenciadora para os ouvidos atentos do público da Gramado Summit, ela precisava se reconectar com a criança que tinha como humor uma característica marcante na personalidade. Sem a reconexão, poderiam não haver mais vídeos e os problemas se tornariam maiores.
— Quando consegui me reconectar com ela foi especial, porque se não fosse a Lorrane criança, eu acho que não estaria aqui. É dela que veio esse humor, essa vontade de criar, essa vontade de fazer as pessoas rirem. Então, a Pequena Lo veio através dela. Acho que, de uma forma geral, não é legal se comparar e se diminuir por causa dos outros. Você nunca vai ser igual a ninguém e é ai que pode estar o seu diferencial. Entendendo ele você pode se desenvolver. O meu (diferencial) era fazer rir. Quando fui perdendo isso, vi que não estava legal. Acho que o essencial que eu trouxe para o evento é mostrar que as pessoas precisam se reconectar com elas quando acharem que estão se perdendo porque o diferencial delas precisa estar sempre ali para que elas possam se realizar — contou a influenciadora para a reportagem.
Para a mãe coruja, Rosimare da Silva Batista, o sucesso da filha, o processo de recolhimento para a reconexão e o retorno às plataformas, é visto com carinho por saber que a filha vive o sonho que sempre teve e que pode contar com o apoio dos pais e família em todos os momentos de tensão.
— Nós somos muito amigas e ela fala tudo comigo. Um dia ela chegou e disse que precisava de ajuda e foi para Minas, onde toda a nossa família mora, e realmente descobriu que estava com todos aqueles problemas. O melhor é que ela conseguiu voltar a fazer tudo o que sempre quis, que era se tornar uma pessoa reconhecida e que leva o sorriso e alegria para todos. É emocionante e gratificante ver que ela leva esse carisma e que as pessoas tem muito carinho por ela. Às vezes, a gente encontra seguidores e eles choram e eu choro junto. Ela fala "mãe, em vez de você me ajudar você tá assim" (risos). É gratificante ver esse carinho e saber que minha filha consegue proporcionar alegria e tocar tantas pessoas por causa do carisma — afirmou Rosimare.
O amor e o cuidado dos pais está presente durante todos os momentos da vida da influenciadora. A educação que recebeu quando criança e o amor protetivo a fizeram entender que é capaz de realizar coisas por conta própria, como morar sozinha, fazer faculdade em outra cidade e, mesmo com a deficiência, ter autonomia para fazer por ela mesma o que tem vontade. Pequena Lo já foi capa de diferentes revistas como Vogue e Elle, e também está em produções da Netflix.
A influenciadora destaca que uma das coisas primordiais para pessoas que também tem deficiência e querem produzir conteúdos para a internet é não se limitar. E deixa um recado para os pais de crianças com deficiência.
— O que me ajudou muito foi a educação dos meus pais. Da minha mãe, que sempre me apoiou. Meu pai era meio receoso porque a gente sabe que a sociedade é muito maldosa, mas eles nunca demonstraram medo, por mais que tivessem. Eu sabia que eu era diferente, sabia que eu precisava de mais cuidados, mas isso não fez com que eu não fosse atrás dos meus sonhos. Fez com que minha mãe e meu pai sempre apoiassem e falassem que eu conseguiria, por mais limitação que eu tivesse. A internet tem seus pontos negativos, mas é um lugar onde você pode ser quem você é e que os pais também podem aprender a não esconder os filhos. Sei que a sociedade é ruim, mas demonstrem seus diferenciais e deixem os filhos mostrarem esse diferencial, mesmo que eles tenham alguma limitação — destacou.
Pensando em uma conversa que poderia ter com a criança Lorrane, caso uma máquina do tempo fosse criada e elas pudessem se reencontrar, Pequena Lo conta que explicaria o universo de coisas por trás da internet, positivas e negativas, mas que ela poderia confiar no que queria porque aconteceria no tempo certo.
— Diria que acho que ela não está preparada para as coisas que estão para vir, porque a gente nunca imagina capa de revista ou estar na Netflix e em outras plataformas e na televisão. Mas falaria para ela continuar do jeitinho que ela era e nunca desistir porque pode demorar, mas ela vai conseguir chegar onde quer — afirmou.
Nos palcos da acessibilidade
Para Amanda Lyra, que além de líder da i-Cherry, é especialista e consultora de Acessibilidade Digital, Artista Musical e Palestrante, a importância de incluir o tema em um evento como a Gramado Summit é uma forma de torná-lo cada vez mais abrangente e, aos poucos, contribuir com a maior inclusão de pessoas com deficiência em todos os ambientes da sociedade. No Palco Share, ela abordou o tema a acessibilidade dentro das plataformas digitais.
Fazendo uma analogia com um prédio de muitos andares, a líder do time de acessibilidade i-cherry, que tem atrofia muscular espinhal (AME), faz o público se colocar no lugar das milhões de pessoas que sofrem diariamente com a falta de acessibilidade.
— Imagine um conteúdo que você esteja produzindo. Você fez todo o esforço para fazer aquilo, para que acontecesse, e que você vai expor esse produto para as pessoas no 20º andar. Você vai contratar uma equipe, pintura, decoração, mas as pessoas não conseguem chegar porque só tem escadas, não tem placas, não tem sinalização, nem nada. Quando você precisa chegar no 20º andar de um prédio, o que você faz? Você pega o elevador. Na web, a acessibilidade vai funcionar como um elevador digital, que vai levar todo mundo, inclusive quem não tem uma deficiência, mas que vai gerar maior facilidade para a vida. Um exemplo: já usou o celular ou computador no sol e não conseguiu ver nada na tela? Isso acontece quando o contraste mínimo estipulado pelas diretrizes internacionais de acessibilidade não é respeitado. Se é respeitado, você consegue ver — pontuou Amanda.
A profissional menciona ainda a importância da inclusão e acessibilidade, até mesmo para o ambiente corporativo, que devem estar presentes em diferentes meios que compõem a sociedade. Amanda diz que milhões de brasileiros têm algum tipo de deficiência, como TDAH, dislexia, autismo e neurodiversidade.
— Quando a gente não pensa em oferecer formas de acesso para essas pessoas, deixamos de impulsionar o nosso negócio. Um dos propósitos da Gramado Summit é ser um evento para que as pessoas consigam enxergar novas formas de inovação. Então, nada melhor que oferecer o acesso para que mais visões diferentes consigam atender, mostrar outros prismas para a galera que está modificando os negócios no Brasil — afirmou.
Em relação a números de plataformas acessíveis, a líder traz um estudo da BigData Corp, em parceria com o Movimento Web Para Todos, que fez em 2022 um mapeamento e mostrou que dos 21 milhões de sites ativos no Brasil, menos de 1% é acessível para pessoas com deficiência. Conforme o estudo mencionado por Amanda, dos 2 mil aplicativos que tiveram 10 milhões de downloads no Brasil, quatro foram minimamente acessíveis para pessoas com deficiências mais severas.
Após agradecimentos ao público, que entendeu a importância de promover acessibilidade em todos os ambientes, Amanda reforçou a necessidade de implementar mudanças nas redes sociais mais populares entre os usuários para que ninguém seja prejudicado ou acabe se sentindo excluído.
— Não legendar um vídeo, não fornecer tradução em libras, vai prejudicar milhares de pessoas que querem acessar aquele conteúdo. A partir do momento que as pessoas pensam no todo, a gente consegue expandir e mostrar que o caminho ainda é bem longo, mas a gente já começou. E começamos bem, em um evento que tem algo que está sendo ocupado por pessoas com deficiência, com propriedade, com local de fala, e com competência técnica para estar ali falante, dando força, abrangência. Isso é algo inovador, isso é dar acesso — concluiu.
Conforme a organização da Gramado Summit, os ingressos para participar do evento continuarão sendo vendidos, mesmo que a edição deste ano já tenha começado. Na abertura do evento, que ocorreu na manhã desta quarta-feira (12), o CEO Marcus Rossi abriu as vendas para a edição do ano que vem, que será realizada nos dias 10, 11 e 12 de abril. Os ingressos já estão sendo vendidos por R$ 990.