As marcas do tempo, aliadas à falta de manutenção, são visíveis em diversas escolas públicas de Caxias do Sul. Basta circular pela cidade para identificar problemas estruturais que, muitas vezes, provocam até mesmo sensação de abandono. O quadro se intensificou durante a pandemia e, com o retorno dos estudantes ao formato presencial há mais de um mês, as comunidades esperam por solução. São situações que se somam à falta de professores, funcionários e vagas para receber estudantes, conforme a reportagem vem mostrando em uma série de reportagens sobre os desafios da educação em Caxias do Sul.
Há escolas interditadas tanto na rede municipal quanto na estadual, o que faz com que os alunos tenham aulas em outros colégios ou que sigam no ensino remoto. Os apontamentos vão desde a falta de luz, provocada por roubo de cabos, até a inexistência de quadra de esportes, pátios inadequados, deterioração de telhados — com risco iminente de queda — e uma série de problemas na rede elétrica.
De acordo com levantamento da Secretaria Municipal de Educação (Smed), das 83 escolas municipais de Ensino Fundamental, 34 têm problemas de infraestrutura. O mapeamento mostra o que é necessário para cada uma delas. Além disso, em fevereiro desse ano, foi lançado o primeiro lote de escolas municipais contempladas pelo pacote de obras do Plano de Prevenção e Proteção Contra Incêndios (PPCI), o que significa esperança de melhorias para a comunidade escolar. Serão beneficiados mais de 4,2 mil alunos nas escolas Alberto Pasqualini, Caetano Costamilan, Caldas Júnior, Giuseppe Garibaldi, João de Zorzi, José de Alencar, Machado de Assis, Mário Quintana, Osvaldo Cruz e Prefeito Luciano Corsetti.
Falta quadra coberta na Alberto Pasqualini
Localizada na Avenida Maurício Sirotsky Sobrinho, no bairro Bela Vista, a Escola Municipal Alberto Pasqualini tem apenas uma quadra de esporte aberta. É por lá que os alunos entram e saem da escola, ficam no recreio, fazem educação física e todas as demais atividades ao ar livre. Há anos, a comunidade escolar luta para melhorar a infraestrutura do colégio, onde estudam 460 alunos. A principal demanda é ampliar o pátio e encaminhar a cobertura da quadra.
— Temos muitas crianças para pouco pátio. No recreio, o espaço é dividido por cordas. Os professores colocam uma corda na quadra para dividir os alunos conforme a idade. Imagina essas crianças correndo no intervalo. Meu filho Arthur tem 11 anos e ele reza para não chover no horário da educação física. É o nosso sonho ver essa quadra coberta porque em dias de chuva as crianças não saem das salas — explica o presidente do Círculo de Pais e Mestres (CPM), Fernando Roberto Vergani, 41 anos.
Um terreno ao lado do colégio, hoje usado como estacionamento, foi comprado pela prefeitura em 2011 para ampliar o pátio da instituição. Essa obra deve sair do papel agora, assim que começarem os projetos dos planos de prevenção de incêndio. Já a cobertura da quadra precisa de um investimento maior, que não está contemplado na proposta — não há valor definido. Por isso, a ideia é tentar garantir ao menos o projeto via município, para depois mobilizar a comunidade em busca de parcerias para construir a quadra.
— O terreno que foi doado fica na rua lateral da escola e com a ampliação do pátio os alunos vão ter dois acessos. A avenida onde está a escola é movimentada, então, com essa obra já teremos mais segurança para as crianças. Ali, terá que ser feito o piso, obras de acessibilidade com rampas de acesso para os nossos alunos cadeirantes. Isso está contemplado com a obra do PPCI. Depois vamos nos mobilizar para arrecadar verba para a quadra coberta. A ideia é fazer almoços, jantas, rifas para levantar os recursos — conta Fernando, que é pai de Arthur, aluno da 6º série do Alberto Pasqualini.
Escolas municipais sem sede e infraestrutura que deixa a desejar
Os estudantes da EMEF Carlin Fabris, na Conceição da Linha Feijó, também estão à espera de melhorias na escola. Hoje, os alunos fazem as atividades em áreas da comunidade. A instituição não tem pátio ou quadra de esporte para os alunos. Já na Afonso Secco, no bairro Parada Cristal, a situação é ainda mais precária. O colégio foi aberto em 1972. Parte da escola foi transferida em 2006 para um prédio provisório e, a outra, em 2011.
— O pátio é de cascalho, as crianças tomam chuva para ir ao banheiro, não temos a menor infraestrutura — ressalta a diretora, Angela Honorato.
Ainda na rede municipal, os alunos das escolas Laurindo Formolo, João de Zorzi e Atiliano Pinguelo têm aulas em outros prédios. A estrutura da Laurindo, no bairro São Ciro II, sequer existe mais: foi demolida pela prefeitura. Com problemas estruturais, o espaço foi desativado em julho de 2021, após a transferência dos estudantes para as instalações do Colégio Mutirão, no bairro Nossa Senhora de Lourdes.
Os 324 estudantes João de Zorzi, do bairro Centenário, esperavam há mais de 10 anos por obras de revitalização. Depois de uma intervenção do Ministério Público, o colégio entrou no primeiro lote dos prédios que vão passar pelo processo de adequação do PPCI. Também será construído o parquinho, o refeitório e a cobertura da entrada. O investimento deve ultrapassar os R$ 3 milhões. A previsão de entrega das melhorias é para o final deste ano. Agora, os alunos da manhã estudam no prédio da Faculdade Anhanguera, no Desvio Rizzo, que firmou parceria com a prefeitura e, os da tarde, na Escola Evaristo de Antoni, no bairro São José.
Smed avalia cenário
A secretária municipal de Educação, Sandra Negrini, lembra que os prédios são antigos, e ao longo dos anos, precisaram de adaptações e nem sempre tiveram as obras de manutenção necessárias. Ela ressalta que o município foi demandado para outras questões, como a implantação do nono ano no Ensino Fundamental e os anos obrigatórios da Educação Infantil, e são recursos que saem do mesmo orçamento.
Quantos às escolas fora das sedes, a secretária ressalta que a Afonso Secco não está em um prédio projetado para ela, e por isso, enfrenta problemas. Contudo, naquela região da cidade há espaço para a construção de uma escola de Ensino Fundamental para onde, no futuro, a Afonso Secco deverá ser transferida. Sandra afirma que Smed tem feito levantamentos para identificar as gravidades, urgências e necessidades desde o ano passado. Algumas reformas estão incluídas nos lotes dos PPCIs:
— Não é só o projeto de prevenção contra incêndios. Também é projetado para deixar a escola o mais próximo do ideal. Nossas equipes têm trabalhado incessantemente para organizar da melhor forma possível. Nós também temos incentivado as escolas a fazer as pequenas manutenções que são preventivas. Porque se não faz esses pequenos reparos isso vai se problematizando. Reorganizamos algumas questões para dar mais celeridade às obras. Vamos deixar para os próximos governos levantamentos com as obras prioritárias.
A secretária destaca ainda que o município precisa de novas escolas em regiões como Desvio Rizzo, Serrano e Esplanada.
—Iniciamos o levantamento de todos os terrenos públicos que nós temos e que não exigem muitos investimentos devido à topografia dos terrenos. Também vamos deixar pronto esse catálogo para futuros investimentos.
Quadro de obras na rede municipal
:: Ensino Fundamental
EMEF João de Zorzi: a obra já foi licitada e o vencedor está para iniciar a obra.
EMEF Atiliano Pinguelo: a obra começou no ano passado. A previsão é que fique pronta em dezembro deste ano.
EMEF Machado de Assis: passará por reforma e está incluída na licitação da João de Zorzi.
EMEF Professora Ester Justina Troian Benvenutti: a reforma ficará a cargo da Secretaria Municipal de Obras.
EMEF Presidente Tancredo de Almeida Neves: a licitação ocorreu em 17 de fevereiro para reforma da quadra de esportes. Contrato está sendo elaborado.
EMEF Arlinda Mafro: aguarda o início da obra de PPCI.
EMEF Érico Cavinato: obras em execução. A previsão de entrega é abril deste ano.
EMEF Luiz Covolan: a assinatura da ordem de início das obras ocorreu em 15 de dezembro de 2021. As obras estão em andamento.
EMEF Alberto Pasqualini: tem previsão de ampliação do pátio usando o terreno que fica ao lado do prédio da escola.
EMEF Governador Roberto Silveira: a obra está parada.
:: Educação Infantil
EEI Alaíde Monteiro: passa por reforma geral.
EEI Campos da Serra: o prédio de 775 metros quadrados terá capacidade máxima para 188 crianças. A escola deve ficar pronta em maio de 2022.
EEI Serrano: a ordem de início será assinada em 24 de março deste ano.
Na rede estadual, problemas são semelhantes
Na rede estadual também há exemplos marcantes de escolas que precisam de obras. O prédio do Instituto Estadual de Educação (IEE) Cristóvão de Mendoza foi construído em 1961. A estrutura passou pela última intervenção em 2001, quando as redes hidráulica e elétrica foram reformadas. Desde 2009, o prédio espera por reformas estruturais. Em 2012, o Estado, por meio do Programa de Necessidades de Obras (PNO), apontou a necessidade de revitalização da escola, o que até o momento não se concretizou.
Já os estudantes da Escola Renato Del Mese, no distrito de Vila Cristina, estão fora do prédio da escola pela terceira vez em menos de 10 anos. Em 2013, o antigo prédio foi interditado, e depois foi completamente abandonado. Os alunos permaneceram meses frequentando salas da subprefeitura. Em 2014, o Estado entregou um novo prédio para os estudantes, que agora apresenta problemas estruturais.
O saguão da EEEM Alexandre Zattera, no bairro Desvio Rizzo, está interditado desde 14 junho de 2021. Lá, há risco de o teto desabar e o local alaga quando chove. Os alunos entram e saem da escola por uma porta lateral, que era usada para acesso dos professores.
A integrante do CPM da Zattera, Carla Márcia Freitas, 48, lamenta a situação. Ela é professora e tem dois filhos estudando no colégio. Márcia ressalta que o teto do saguão apodreceu e hoje representa riscos aos alunos.
— É uma entrada estreita. Tem que ser turma por turma para entrar e sair. Apenas uma porta. Se acontecer uma emergência ali como fica? Como vão sair? Vão se pisotear? Eu fico indignada. Vão esperar acontecer uma tragédia? São mais de 900 alunos.
Há outros exemplos de problemas na rede estadual: na Abramo Randon, o retorno dos alunos para o presencial não foi possível porque eles estão sem energia elétrica depois de furto de cabos. Na Irmão José Otão, um vazamento de água causa transtornos há três anos — o encanamento é de 1975.
O diretor do 1° Núcleo do CPERS, David Orsi Carnizella, avalia que as escolas estão há anos sem reformas, o que só vai agravando a situação:
— Geralmente se ataca só os problemas quando eles surgem, então, não são feitas reformas há muito tempo. Como são prédios antigos, tem problemas de acessibilidade. Sem as obras menores, acontecem problemas mais graves. A fiação elétrica é antiga, faltam quadras, pátios e laboratórios de cada área. Os modelos de sala de aula ainda precisam avançar. As escolas são ainda aquelas pensadas na década de 70. Se os pais e avós entrarem nessas escolas percebem que as mudanças que tiveram são muito pequenas.
As escolas estaduais receberam verba da chamada autonomia financeira que podem ser aplicadas em reformas. No entanto, as direções precisam cumprir processo de licitação e, para isso, apresentar três orçamentos. A burocracia atrasa as melhorias.
Situação estrutural das escolas da rede estadual
A reportagem contatou as 56 escolas estaduais de Caxias do Sul. Dessas, 48 atenderam a ligação ou solicitações. O levantamento, que foi realizado da manhã de segunda-feira (21) até as 11h30min de quarta-feira (23), constatou que 21 das 48 instituições precisam de reformas. Entre as principais demandas estão infiltrações, troca de fiação elétrica, construção de quadras cobertas, pinturas e manutenção de banheiros e pintura.
:: Abramo Eberle- tem problemas no telhado e quando chove entra água em salas de aula e no corredor. Já tem processo em andamento para trocar todo o telhado da escola, mas ainda não tem data prevista.
:: Abramo Randon - desde o furto de fios, as turmas estão em ensino remoto . A licitação foi encerrada e está em fase de verificação de documentação. Ainda sem data para início da reposição da fiação. A previsão de retorno informada pela Seduc seria 45 dias a 60 dias.
:: Alexandre Zattera - saguão interditado desde junho de 2021 devido à infiltração no telhado.
:: Aristides Germani - parte do telhado está com problemas e. quando chove. alaga saguão e corredores do segundo pavimento. Também há goteiras em algumas salas.
:: Professor Clauri Alves Flores - precisa de melhorias na iluminação para a entrada e saída dos alunos do noturno.
:: Cristóvão de Mendoza - aguardam reforma da escola inteira. O ginásio e auditório seguem interditados.
:: Engenheiro Dario Granja Sant'Anna - há demanda por uma quadra coberta.
:: Érico Veríssimo - a comunidade escolar solicitou orçamento para colocação de piso antiderrapante em frente às salas e para pintar o prédio II. Também vai enviar para a Coordenadoria Regional da Educação solicitação para encaminhamento de troca de fiação elétrica.
:: Galópolis - precisa de quadra coberta e também da reforma do piso da quadra que está deteriorado e do refeitório.
:: Henrique Emílio Meyer - a quadra foi reformada, mas o prédio ainda precisa de reparos e também há necessidade de finalização de instalação elétrica.
:: Imigrante - tem um muro caído há muito tempo. A demanda está em Porto Alegre para resolver junto à Casa Civil.
:: João Prataviera - necessidade de pequenas reformas de calçadas e pintura.
:: João Triches - precisa de manutenção no telhado, pequenos ajustes na infraestrutura e no banheiro com troca de válvulas.
:: José Generosi - muro da escola tem rachaduras e foi solicitado o reparo há quatro anos. A escola recebeu verba para pequenas reformas e pretende melhorar banheiro, salas com problemas no piso e pintar o prédio.
:: José Otão - tem vazamento de água há três anos. Quando falta água na rua fica sem abastecimento na escola.
:: José Venzon Eberle - a instituição recebeu a verba extraordinária, mas a direção afirma que não tem condições de encaminhar porque não há equipe para auxiliar nos pedidos de orçamentos necessários para encaminhar as licitações.
:: Kalil Sehbe- com a verba da autonomia, escola vai realizar obras de manutenção, organizar o parquinho com a instalação de brinquedos e organizar a caixa de luz.
:: Presidente Vargas - prédio tem goteira no telhado, problema em piso de salas, infiltração de água, esgoto da cozinha. Reforma do banheiro é aguardada.
:: Província de Mendoza- precisa de reforma da parte elétrica.
:: São Vírgilio - necessita de cobertura da quadra.
:: Dr. Theodósio Rocha Netto - precisa trocar a rede elétrica e há rachaduras no prédio, mas o governo enviou verba que poderá ser usada para esses ajustes.
O que diz a 4ª CRE
A 4ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE) se manifestou por meio de nota:
"Na última terça-feira (22), estiveram na EEEF Dr. Renato Del Mese, o engenheiro da Coordenadoria Regional de Obras e o proprietário da empresa que ganhou a licitação e que executará o projeto de reforma da escola para a assinatura do início de obra, que tem previsão para o próximo dia 28. A partir desta data a empresa tem três meses para concluir a obra. O investimento de R$ 606,042,38 será utilizado para realização de pintura interna e externa, troca de todo piso, drenagem do pátio no entorno do prédio, colocação de áreas externas para proteção das paredes da chuva, vedação com telas na parte superior do corredor para evitar entrada de pássaros e outros amimais, recuperação de rampas e escadas de acesso, entre outros pequenos reparos. A escola também recebeu um recurso extra do projeto Avançar no valor total de R$ 42.910,25 para aplicação em melhorias na infraestrutura e aquisição de mobiliário.
Também nesta semana haverá uma visita à escola Abramo Randon para uma avaliação geral das necessidades. A reforma da rede elétrica está orçada em R$ 59.513,72, com liberação do recurso orçamentário em 17/03 e agora segue para aprovação da CAGE para posterior elaboração da minuta de contrato. Além disso a escola recebeu um recurso extra do projeto Avançar no valor total de R$ 88.420,36 para aplicação.
Quanto à escola Alexandre Zattera, a reforma do telhado está orçada em R$ 413,281,76, com liberação do recurso em 16/03 e agora segue para aprovação da CAGE para posterior elaboração da minuta de contrato. Além disso a escola vai receber um recurso extra de R$ 154.168,25 também pelo Projeto Avançar. A escola tem também um empenho liberado do FNDE no valor de R$ 441.000,00 à disposição para construção de uma subestação de energia elétrica e manutenção dos pisos das quadras externas. Este corre via SGO e a CROP vai iniciar a elaboração dos projetos."