Uma mãe, que tem a identidade preservada para proteger o filho, procurou a Polícia Civil para registrar boletim de ocorrência por lesão corporal contra a escolinha que a criança frequentava em Caxias do Sul. O menino, de seis anos, é autista, e chegou em casa com hematomas no braço. A mulher de 46 anos registrou ocorrência em 29 de outubro, depois de perceber que o filho tinha voltado da escola com ferimentos, como arranhões e hematomas roxos nos braços.
O menino frequentava uma escolinha administrada pela Educaxias, que tem convênio com o município. O administrador das escolas da entidade, que tem gestão compartilhada com a Secretária Municipal de Educação (Smed), nega que o menino tenha sido ferido por funcionários. O caso é investigado pela Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPPA).
— Já ouvimos o depoimento da mãe, agora estamos intimando as professoras da escola e vamos realizar diligências para apurar os fatos — explica a titular da DPPA, delegada Thalita Giacomitti Andrich.
A mãe da criança relata que essa não foi a primeira vez que percebeu machucados, mas os ferimentos começaram a ficar cada vez mais visíveis, o que a levou a pensar que não eram feitos por outras crianças, e, sim, por adultos. As agressões teriam ocorrido no dia 27 de outubro:
— Eu cheguei na escola para buscar ele às 11h30min e a coordenadora estava me esperando. Ela me disse que ele havia arranhado duas coleguinhas no rosto, mas que só haviam conversado com ele. Quando ela me disse, senti um baque. Por que ela usou essas palavras: "Nós só conversamos?" — questiona a mãe.
O advogado da família da criança, Rodrigo Schinzel, afirma que o menino fez exame de corpo de delito e o resultado mostra que, de fato, houve lesão:
— O laudo relata o tamanho das lesões e durante o processo e os interrogatórios, será apurado quem as provocou. Vamos ingressar com processo e estamos tomando todas as providências legais para apurar a autoria.
Segundo o laudo médico, o menino tem uma escoriação de oito por três milímetros na lateral externa na parte superior do braço direito e um hematoma medindo 30 por 20 milímetros na lateral do braço direito.
"Estou sem chão e ele está transtornado", conta a mãe do menino
A mãe do menino conta que no último dia 27 ela levou o filho para casa. Quando chegaram e foi tirar a criança da cadeirinha no carro, ele se queixou de dor e ela viu uma marca de unha no braço do filho.
— Era uma marca profunda, de unhada no bracinho dele. Perguntei quem fez isso e ele disse: "Dodói! Plofe, feio feio" e apontava para a marca.
Ela afirma que contatou a escola, mas não obteve retorno. Foi até lá no dia seguinte para falar com a coordenadora, mas ela não estava na escola. A mãe queria descobrir se havia sido outra criança que havia machucado o menino ou o que havia acontecido. No final do dia, viu dois hematomas roxos no braço dele:
— Quando enchi a banheira para dar banho nele, que ele tem medo do chuveiro, eu vi um hematoma roxo no braço e meu filho se queixava que doía. Mandei uma mensagem questionando o que tinha acontecido com o meu filho e mandei as fotos do braço dele. Eu quero saber quem fez isso com ele. Aguardei o posicionamento da escola o dia inteiro antes de fazer o boletim de ocorrência e de procurar a Smed porque não queria ser injusta.
A mãe lamenta o fato de que até o momento a escola não tenha se pronunciado sobre o assunto:
— Eu não quero cometer uma injustiça porque eu não sei quem fez isso. Quando ele fala "profe" eu sei que é uma adulta, mas não sei quem foi. Ele vinha roxo, beliscado, um dia estava com a perninha sangrando. Eu nunca tomei uma providência porque achava que era um colega. Mas quando levei ele no plantão para saber se passava alguma coisa nos hematomas até a pediatra me disse: "Mãe isso aí não é um beliscão de criança".
O menino faz terapia e tem acompanhamento de equipe multiprofissional, mas a mãe percebe que ele está regredindo devido ao episódio:
— Está muito difícil para mim, como mãe, que estou sem chão, estou destruída. E para ele, que está regredindo. Ele só chora, não quer comer e está transtornado. Não quer ir na terapia — desabafa a mãe.
Contrapontos
O administrador das escolinhas vinculadas a Educaxias, Carlos Alberto Bender, é responsável por 15 instituições conveniadas e com gestão compartilhada com a prefeitura. Ele explica que as escolas têm o apoio pedagógico da Smed e também profissionais de pedagogia e psicologia nas escolas. Ele ressalta que tem convicção que os ferimentos do menino não aconteceram na escola:
— Nunca tivemos nenhum relato assim. Eu te afirmo com todas as letras que se alguma coisa aconteceu não foi aqui. Ele é uma criança muito querida por todos e era bem cuidado. A coordenadora tem 10 anos de experiência e a professora, que chamamos de educadora, tem quatro anos, então uma centena de crianças já passaram pelas mãos dela. Ela era apoiada por uma monitora, que tem especialidade em crianças autistas. Com toda a certeza, temos a convicção que isso não aconteceu aqui dentro —afirma Bender.
Ele ressalta que o menino estava evoluindo na escola:
— Nesse tempo ele teve uma evolução muito boa. E é isso que me preocupa, porque agora ele muda de escola e sempre dá um revés.
A secretária de Educação de Caxias do Sul, Sandra Negrini, explica que a Smed já foi até a escola e as medidas necessárias no âmbito administrativo foram tomadas.
— A mãe pediu a transferência da criança, e isso foi feito. Nós fizemos os levantamentos de todas as questões, mas não cabe sindicância, porque não são funcionários públicos. Agora temos que aguardar a apuração dos fatos, que estão sendo investigados pela Polícia Civil e vamos aguardar o processo correr, para não cometermos injustiças. Foi um caso isolado e está sendo investigado — afirma Sandra.
Câmara de Vereadores emitiu nota sobre o assunto
A Frente Parlamentar de Conscientização e Defesa dos Direitos dos Autistas do Legislativo Caxiense emitiu nota para informar a comunidade que está acompanhado o caso. A presidente da Frente, vereadora Tatiane Frizzo (PSDB), ressalta que entrou em contato com a Secretária de Educação, Sandra Negrini e com a delegada Thalita Andrich.
—Nos colocamos à disposição para intermediar uma reunião com a Secretária da Educação para entender o que vem sendo feito para uma conscientização e até uma humanização de um atendimento mais especializado a essas crianças que estão frequentando o ensino regular, e que sabemos que precisam de uma atenção diferenciada — explica ela.