O cabelo encaracolado, do jeitinho que era antes, voltou a crescer. Também de volta está o sorriso que a pequena caxiense Alicia Carolinne Tabares, agora com sete anos, exibia quando vislumbrava o transplante que poderia encerrar sua exaustiva luta contra uma leucemia linfóide aguda (LLA), iniciada ainda em 2015, com recaída em 2017.
Um ano após ter sua história publicada pelo jornal Pioneiro (em 12 de julho de 2019), o abraço no irmão, Natanael Adalberto Tabares, de dez anos, que foi seu doador de medula óssea, tornou-se ainda mais simbólico. Inseparáveis como nunca, eles celebram agora o recomeço após o transplante — que ocorreu em 20 de agosto de 2019 — seguido por outras três internações hospitalares.
— Depois de todos estes anos, de tudo que ela passou, este período do transplante, com certeza, foi o mais difícil, mas também o mais vitorioso — afirma a mãe de Alicia e Natanael, Patricia Ribeiro Moura, 32.
Mesmo com o sucesso do transplante, que foi realizado no Hospital Moinhos de Vento, em Porto Alegre, Alicia teve que cumprir as sessões de quimioterapia e radioterapia, permanecendo internada por um total de 40 dias (a contar de sua internação, no dia 12 de agosto). Ela voltou pra casa no final de setembro, mas, logo após o Dia das Crianças, em outubro, adentrou em um ciclo de complicações — um problema na pele e depois uma bactéria — que foram motivo de outras três internações em Porto Alegre, ainda em 2019.
— Ela ficou muito abatida, perdeu peso, chorava bastante e ficava até transtornada, não queria falar com ninguém. Agora, aos poucos, está melhorando — relata a mãe, que depois de tantos momentos difíceis, se alegra ao ver a filha sorrir novamente.
Desde que voltou para casa, sob orientação médica, Alicia precisou ficar em isolamento por conta da baixa imunidade. O período, que duraria até abril de 2020, acabou sendo prorrogado, por tempo indeterminado, em função da pandemia do novo coronavírus, que representa alto risco à saúde da menina. A espera pela disponibilidade de algumas vacinas que ela precisa refazer também a impede de ter contato com pessoas que não sejam as de sua casa.
Por tudo isso, Alicia precisou adiar o sonho de comemorar seu aniversário com uma grande festa, restringindo-se a uma pequena, mas importante, comemoração em família, incluindo o pai, Josué Kolling Tabares, 33, e o irmão caçula, Arthur Vicente Tabares, de dois anos.
— Comprei um bolinho, fiz uma decoração, porque ela sempre dizia que queria uma festa de aniversário. Nunca conseguimos fazer, ou por ela estar doente, ou por não termos condições, mas ano que vem sai do jeito que ela sonhou, com certeza — projeta a mãe, que também guarda para 2021 os planos de rematricular a filha na escola.
Enquanto isso não ocorre, e as aulas presenciais de Natanael estão suspensas durante a pandemia, a convivência em casa tem demonstrado, para Patricia, o fortalecimento dos laços que já eram estreitos entre os irmãos e, até mesmo, deixado evidentes semelhanças que, segundo ela, não existiam antes do transplante.
— Eles brincam o dia inteiro, adoram ficar juntos e agora até brigam mais, mas isso porque estão muito parecidos. Dizem que quando a pessoa recebe a medula acaba pegando características do doador — aponta Patricia.
Natanael concorda, embora, quando questionado, ainda não saiba afirmar se as semelhanças são boas ou ruins para a relação dele com a irmã. De qualquer forma, ele conta que, muitas vezes, um chega a completar a frase do outro, principalmente quando planejam o que vão fazer juntos.
— A minha mana é a minha mana, sou bem amigo dela, um não vive sem o outro, é muito chato quando ela fica longe de mim — garante Natanael.
Entre as brincadeiras e até as receitas de bolo que os dois, eventualmente, resolvem fazer, Patricia conta que a lembrança dos dias difíceis, por vezes, volta à tona. Segundo ela, Alicia passou a entender melhor tudo que viveu até aqui e, de vez em quando, olha, emocionada, pra foto da menina careca, risonha, abraçada pelo irmão, que estampou a capa do jornal ainda antes dela saber que tudo daria certo. Com o passado assimilado, Alicia, otimista, agora tenta seguir em frente. Com jeito sapeca, ao telefone, ela garante:
— Tá tudo "de boas", vamos deixar tudo pra lá.
Doações fizeram (e fazem) a diferença
A colaboração de amigos e também de desconhecidos por meio da campanha virtual realizada pela família às vésperas da cirurgia chegou a R$ 13.750,00. Juntamente com o auxílio prestado pela Domus — Associação de Amparo à Criança e ao Adolescente com Câncer da Serra Gaúcha, que garante cestas básicas à família, o valor em dinheiro, de acordo com a mãe, foi fundamental para os deslocamentos e outros custos adquiridos durante o tratamento de Alicia. As contribuições permitiram, ainda, que parte de uma parede mofada da casa, que fica no bairro Cinquentenário II, fosse reformada.
— A gente agradece muito a todas as pessoas que nos ajudaram no momento em que ela mais precisou — afirma a mãe de Alicia.
Segundo ela, a família ainda arca com algumas despesas significativas, como a realização do exame que garante o acompanhamento das reações após o transplante, pois ainda há chance de rejeição. Inicialmente realizado a cada 15 dias, ele precisa ser feito, agora, a cada dois meses.
Sempre que realizado, o teste custa R$ 975 e, segundo Patricia, não há cobertura do Sistema Único de Saúde (SUS) e de nenhum convênio de saúde particular. Em agosto, a campanha de arrecadação online se encerra, mas colaborações ainda poderão ser feitas em contato direto com a família pelo Whats App (54) 9238-2826.