Definir uma data de retorno de milhares de estudantes às escolas e universidades e garantir a segurança sanitária dos alunos, professores e funcionários na futura operação de recomeço têm tirado o sono dos gestores da educação e colocado pais em grupos opostos. Mas tudo indica que a retomada das aulas presenciais em Caxias do Sul não será no dia 4 de maio, como previsto no atual decreto estadual, uma vez que a pandemia de coronavírus ainda estará na fase de expansão no Rio Grande do Sul.
O fechamento das escolas segue, em tese, até o dia 30 de abril, uma quinta-feira. A Secretaria Estadual da Educação (Seduc) informa que não há definição sobre a data de retorno e frisa que nos próximos dias será realizada uma reunião com entidades representativas da educação estadual, municipal e particular para a discussão, em conjunto, sobre as novas ações a serem tomadas. O governador Eduardo Leite já reiterou que a retomada das aulas em solo gaúcho está distante.
- Embora as crianças e os jovens não sejam no grupo de risco, eles são propagadores. Não estarão com a vida ameaçada em função do vírus, embora não estejam imunes. Existem casos de crianças e jovens que agravam a situação de saúde, podem levar para casa, para os avós, para um amigo da família, podem comprometer a saúde de outras pessoas. Considerando que temos 20% da população gaúcha em escolas e universidade, pode ser que fique mais distante a retomada - disse o governador, em entrevista à jornalista Kelly Mattos, da GaúchaZH.
Caxias do Sul cogita deixar a reabertura para um segundo momento. Por ser a segunda cidade com mais casos de covid-19 no Estado, a tendência é que as redes pública e privada do município, que reúnem cerca de 100 mil estudantes, só tenham condições de retomar as atividades em junho, desde que o contágio esteja sob controle. É um cenário diferente de outras cidades da Serra, em que a decisão mais provável tende a ser pela reabertura gradual dos estabelecimentos de ensino em regiões com zero ou baixíssimo nível de contágio e com boa capacidade de atendimento hospitalar na retaguarda, caso o setor da educação encontre uma saída nas propostas que estão sendo debatidas pelo governo do Estado e pela sociedade em torno do distanciamento controlado.
O secretário da Saúde de Caxias, Jorge Olavo Hahn Castro, acredita que é preciso muita cautela nesse movimento de liberação das escolas. Ele lembra que a decisão não cabe apenas ao Gabinete de Crise do município.
- A liberação impacta muito na circulação de pessoas, não tem como regrar. Mas não está definido, o governo está recebendo sugestões até o dia 23 (hoje). Há uma série de itens no distanciamento controlado, que tem uma discussão mais no sentido econômico e não está muito claro em relação à educação. Também não adianta o município liberar as aulas em suas escolas e o Estado não - opina Castro.
O Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS), que tem unidades em diversas cidades na Serra, ampliou a suspensão das atividades letivas até o dia 3 de junho de 2020.
Prazo para equipar colégios
A secretária municipal da Educação, Flávia Vergani, ressalta que a fase agora é de construir esse retorno, mesmo sem uma data. Numa análise preliminar, a rede estaria pronta somente na metade de maio. Não há, no momento, um plano definido para uma reabertura no início do próximo mês. Essa constatação se deve à mobilização necessária para receber os alunos de volta, uma vez que é imprescindível pensar nas questões sanitárias.
- As discussões estão bem no início, pois até agora estava se debatendo a questão pedagógica das aulas a distância. Estamos monitorando de acordo com o resultado da saúde. O fechamento desta semana e o início da próxima serão cruciais. Precisamos responder como funcionaria essas questões de higiene num espaço com 200, 300 alunos? Estamos em contato com o setor de infectologia, com conselhos, discutindo a compra de materiais como termômetros de gatilho, máscaras e álcool gel. Quais são os movimentos que vamos ter de adotar para ingressar na escola? É uma logística a ser pensada por várias pessoas - pondera Flávia.
A discussão plural citada pela secretária é confirmada pelo presidente do Conselho Municipal da Educação, Lucas Caregnato. Na próxima terça-feira, dia 28, o colegiado reúne-se para avaliar o cenário com a crença de que já haverá resolução e calendário definidos pelo governo gaúcho.
- Como cidadão, tenho preocupação com o retorno. São questionamentos meus, particulares.
Os 38 mil alunos matriculados nas escolas do município estão de férias desde o dia 16 de abril e retomam as aulas a distância no dia 30.
"Caxias do Sul talvez demore um pouco mais"
Assim como a rede municipal, as escolas estaduais aguardam uma posição por parte da Seduc. A titular da 4ª Coordenadoria Regional da Educação (4ª CRE), Viviani Devalle, diz que a rede estadual está preparada para duas possibilidades. Um delas é a volta imediata no pós 30 de abril, mesmo sem a confirmação se haverá uma retomada gradual ou total.
- Já definimos como será o acolhimento para aluno e professor. Cada escola participou da redação de um documento sobre os cuidados e recebeu orientações para higienização de espaços. Cada aluno terá de ter sua garrafa de água já que os bebedouros serão interditados. Além disso, fizemos complementação da autonomia financeira para a aquisição de álcool gel e água sanitária - cita Viviani.
No cenário de novo adiamento das aulas, as escolas estaduais continuarão distribuindo conteúdo por meio das aulas programadas, conforme a coordenadora da 4ª CRE. A diretora do Instituto Cristóvão de Mendoza, Roseli Maria Bergozza, confirma o recebimento de recursos para a aquisição de materiais e espera receber hoje a remessa de álcool gel para toda a escola, máscaras para professores e desinfetantes. A diretora ainda tem dúvidas de como proceder em relação ao movimento dentro do prédio e sobre a data de reinício.
- No último memorando, a escola ficaria fechada até 30 de abril. Considerando que no dia seguinte é feriado e tem o final de semana, abriríamos no dia 4 de maio. Não sei ainda como as autoridades vão proceder em relação a essa questão de aglomeração dentro das escolas - diz Roseli.
A titular da 4ª CRE acredita que os estabelecimentos estão organizados para um eventual retorno de alunos.
- Distanciamento (entre estudantes) é difícil. Mas estamos mapeando as escolas e a grande maioria já vinha adquirindo álcool gel e fazendo medidas de precaução. Acredito que não haverá problema.
Também regradas pelo decreto estadual, as escolas privadas tentam agendar um encontro com o secretário estadual da Educação, Faisal Karam, para estabelecer um plano de retorno. Na avaliação do presidente do Sindicato do Ensino Privado (Sinepe), Bruno Eizerik, há municípios que podem reativar as atividades escolares aos poucos. A intenção é chegar a um consenso e estabelecer protocolos de prevenção ao coronavírus com a reabertura, também sem data definida.
- Não queremos que todo mundo volte. Caxias do Sul talvez demore um pouco mais, assim como Porto Alegre. Mas há cidades sem casos que poderiam retomar. Teremos de fazer um calendário. A única certeza hoje é que o decreto estabelece o fechamento até 30 de abril - frisa Eizerik.
Escolas infantis vivem crise
A direção do Sindicato das Instituições Pré-Escolares Particulares (Sinpré) de Caxias do Sul torce para que o decreto não seja prorrogado. A entidade diz que o setor emprega na cidade 1.490 profissionais com carteira assinada e 668 trabalhadores terceirizados. Segundo o sindicato, 70% do faturamento é para pagar a folha salarial. A rede tem sob sua responsabilidade 8,7 mil crianças, sendo pouco menos da metade atendida por meio de parceria com a prefeitura.
- Esperamos que possamos reabrir as escolas, respeitando as normativas das autoridades. Nossa preocupação é com as crianças que não têm onde ficar com a volta dos pais de formal gradual ao trabalho. As escolas de Educação Infantil, diferentemente das escolas de Ensino Fundamental, seguem o regramento do CME e suas especificidades quando ao número de crianças por faixa etária, metragem, entre outras - ressalta a presidente do Sinpré, Christiane Welter Pereira.
Uma sondagem com donos de escolinhas indica que boa parte aprova a reabertura. Patrícia Pasquali, diretora da Toca dos Tocos, ressalta que são poucos os estabelecimentos que querem permanecer fechadas e uma crise está instalada no setor.
- Todos sabemos que educação infantil até 3 anos e 11 meses não é obrigatório. Muitas escolas recebendo cancelamento de matrícula porque os pais não vão ficar pagando babá mais mensalidade de escola. Tem muita gente que vai fechar as portas - alerta Patrícia.