A Serra gaúcha vivenciou o final de semana mais inquietante de sua história recente, com ruas esvaziadas, decretos, comércio fechado, toques de recolher e confirmações de novos casos de coronavírus.
A semana que se inicia caminhará ainda mais no oposto de tudo o que já se viu em termos de relações sociais e econômicas, com famílias em casa, indústrias e repartições públicas paralisadas. É imperativo: o confinamento precisa ser levado a sério. Não se trata de entrar em pânico, mas de buscar a adaptação pelas próximas duas semanas. Especialistas entendem que é urgente chegar a quase totalidade da população em quarentena para diminuir as chances de contágio. A exceção nas ruas é apenas para integrantes de serviços essenciais.
Os dados divulgados até as 17h desde domingo (22) indicavam um total de 11 pacientes com coronavírus na Serra considerando informações da Secretaria Estadual da Saúde e da prefeitura de Bento Gonçalves, que fez uma contagem à parte da situação na cidade. Caxias do Sul continuava com dois casos. Bento Gonçalves, por sua vez, teria a situação mais crítica, pois confirmou no final de semana quatro novos casos de um total de cinco na cidade. No Estado, o contágio subiu para 77 pacientes. Até as 21h de sexta-feira, eram 56 casos confirmados. Conforme o boletim divulgado pelo Ministério da Saúde, o país registrava ao todo 1.546 casos e um total de 25 mortes. Como a pasta informou que há transmissão comunitária da doença em todos as regiões do país, o governo não irá divulgar mais o número de casos suspeitos. É uma curva de contágio parecida com a da Itália, epicentro da pandemia na Europa e com quase 5 mil mortos.
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A dificuldade maior é controlar a circulação de pessoas em cidades muito povoadas, caso de Caxias do Sul e Bento Gonçalves. No Brasil, a pandemia está concentrada nos grandes centros, segundo o secretário de Vigilância em Saúde, Wanderson Oliveira, o que exige atenção e conscientização. Somente no sábado, a maior cidade serrana identificou mais de 330 estabelecimentos não essenciais com as portas abertas para receber o público. Donos de mecânicas, salões de beleza, quadras de esportes, bares e lancherias simplesmente ignoraram o decreto que determinou o fechamento dos locais a partir da meia-noite de sexta-feira.
Apesar da enorme redução de pessoas nas ruas, também era possível ver homens, mulheres e crianças passeando nas ruas como se a quarentena fosse um mero feriado. Houve denúncias de reuniões em cultos religiosos, mas como ainda não há impedimento, apenas uma recomendação, a prefeitura de Caxias do Sul diz que a alternativa é alertar os fiéis sobre o grave risco que estão submetendo a si mesmos e seus familiares.
Foi essa impossibilidade de controlar cada passo de seus cidadãos que levou São Marcos e Flores da Cunha, que sequer tinham casos confirmados até este domingo, a determinar um toque de recolher entre 21h e 6h. Nesse período, quem for flagrado nas ruas pode ser detido pela polícia. Seguindo os passos de Caxias do Sul, Garibaldi mandou fechar as fábricas, permitindo o funcionamento apenas das empresas que produzem alimentos. Bento Gonçalves adotou a mesma postura.
A quarentena obviamente mexe com a cultura do trabalho na região. As grandes empresas da Serra, casos de Randon, Marcopolo e Tramontina haviam anunciado por conta própria férias coletivas para milhares de trabalhadores. Até a semana passada, havia resistência de parte das empresas se iriam aderir ou não à quarentena. Como a suspensão das atividades já foi decretada por diversas cidades, as fábricas vão atuar apenas com funcionários de áreas essenciais. Somente em Caxias, 37 mil trabalhadores do setor metalmecânico ficarão em casa.
— O pico no país vai do início de abril até o dia 20 do mesmo mês. Mas temos de lembrar que estamos falando do achatamento da curva de contágio. Caso venha a ter casos, para que não sejam todos de uma vez como ocorreu na Itália. O isolamento evita que se transmita a doença para outros. Se não adota as medidas de isolamento, vai ter um pico de muitos doentes ao mesmo tempo. Também servirá para que a capacidade de atendimento não entre em colapso — alerta a médica infectologista e diretora das vigilâncias em Saúde de Caxias do Sul, Andréa Dal Bó.