No final do ano passado, Alexandra Graauw era só desesperança. Vizinhos iam ao shopping, mas Alexandra e os três filhos tinham somente a preocupação da sobrevivência. Conhecidos comiam churrasco, Alexandra e os filhos nem sempre tinham pão. Ninguém lhe dava emprego e ela dependia de faxinas esporádicas, de catar papel e latinha.
Ela estava entregando os pontos, quase aceitou a ideia de que a mudança de vida só aconteceria por um intervenção maior. Não era bem uma resignação, mas constatação diante de fatos que dia após a dia afastavam a possibilidade de pular fora da extrema pobreza.
Leia mais
Vidas em desespero: Silva, Raquel e Milene contam como é viver com menos de R$ 3 por dia em Caxias
Caxias tem mais de 6 mil famílias em extrema pobreza, crescimento de 51% em relação a 2016
— Eu estava no limite de tudo, aluguel atrasado, vivia de faxina e tive quer parar por causa da minha filha pequena. Complementava a renda vendendo papelão, latinha — relembra.
O trabalho conjunto de assistentes sociais, psicólogo e outros profissionais reconduziram Alexandra. Hoje, aos 37 anos, ela trabalha com carteira assinada, tem salário fixo no início do mês e se considera feliz por ter como garantir o dia a dia dos filhos. A reviravolta exigiu esforço, mas indica a importância das iniciativas governamentais para incluir quem sobrevive com R$ 3 ou menos por dia em Caxias do Sul - são 6.381 famílias com renda de até R$ 89 per capita.
A trajetória de Alexandre traz as mesmas nuances de outras tantas famílias. A trabalhadora acessou o benefício do Bolsa Família durante anos, mas não conseguia conquistar a autonomia, apesar de ter passado por algumas empresas. Não era apenas a questão do desemprego ou da qualificação. Ficou claro que Alexandra precisava olhar para dentro de si e organizar a família e a rotina, como bem resume a gerente do Centro de Referência em Assistência Social (CRAS) Centro, Melisa Boz.
— A organização familiar vai além do emprego. É uma família que consegue a educação infantil ou colocar crianças em centro educativo para que os pais possam trabalhar — cita.
Separada desde 2015 e sem parentes em Caxias, Alexandra não dependia unicamente do desejo dela para mudar de vida, condição que muita gente, do conforto de casa ou com emprego garantido, não compreende. A necessidade era por apoio externo, o que significa uma grande diferença na superação da extrema pobreza.
Alexandra diz ter buscado o CRAS para ter orientação. Participou de palestras, conversou com terapeutas para superar problemas familiares, aprendeu a fazer currículo e recebeu dicas de como se comportar numa entrevista. A virada aconteceu quando a direção do Centro de Convivência Mãos Solidárias, no Diamantino, acenou com uma vaga de emprego, oportunidade que, para Alexandra, caiu do céu. A sincronia foi tanta que ela conseguiu uma escolinha para a filha de dois anos. Como auxiliar de cozinha, recebe R$ 1,5 mil, dinheiro suficiente para o aluguel e as demais despesas. Neste ano, levou os filhos pela primeira vez para passear num shopping de Caxias.
É uma escalada em tanto para uma família que já dormiu de barriga vazia em diversos momentos, mas permaneceu unida.
Saiba mais
* Pelo censo demográfico de 2010, Caxias do Sul teria 15 mil famílias de baixa renda, mas no cadastro aparecem cerca de 22 mil famílias. O endereço residencial é variado.
* Em Caxias, 8,7 mil famílias estariam aptas a receber o Bolsa Família. Até março foram pagos 8.254 benefícios. A transferência de renda em março deste ano foi de R$ 1,26 milhão na cidade, segundo o Portal de Transparência do governo federal.
* Conforme a percepção do CRAS Centro, quem busca ajuda da assistência social geralmente é porque perdeu algum benefício social ou emprego. Há também pessoas que trabalhavam na informalidade, ficaram doentes e sem renda, por exemplo. A lista inclui imigrantes e famílias que tiveram boas condições financeiras no passado e não dependiam da assistência social.
* Mulheres são as que mais aparecem na fila da assistência, pois assumem a frente de manter a família. Porém, são mães com filhos e com dificuldade para acessar o mercado de trabalho. Os homens, quando aparecem, geralmente moram sozinhos. Eles se queixam da dificuldade em arrumar trabalho por causa da idade.
* No acolhimento, é normal pessoas chorarem e assumirem o momento de grande fragilidade. Alguns ficam felizes até mesmo com o café e o biscoito oferecido pelos atendentes. Os relatos são variados, mas é comum o desânimo ou reclamações de que ninguém chama para o trabalho ou que uma empresa promete dar retorno sobre uma vaga e nunca mais procura o candidato.
Leia também
Cia. Garagem de Teatro estreia espetáculo infantil
Instituto de Leitura Quindim recebe a ilustradora portuguesa Mafalda Milhões
Filme italiano "A Garota na Névoa" estreia em Caxias
UCS Cinema prevê retomada das atividades em agosto