Mesmo tendo sido realizado no final de 2014, o concurso público que amenizaria a falta de fiscais de trânsito em Caxias do Sul não atingiu os objetivos como se imaginava e ainda rende discussões na Justiça. A vigência do certame se encerrou no dia 15 de janeiro, o que impede a nomeação de candidatos aprovados naquele ano. Parte do grupo se sente trapaceado, pois cumpriu os ritos que levaram à aprovação e agora vê a chance ser desperdiçada num momento em que o efetivo da Fiscalização está abaixo do ideal e terá mais atribuições a partir deste ano como o monitoramento de ciclistas e pedestres.
Nove pessoas tentam obter o direito de prorrogar o prazo para nomeação. A ação movida pelos advogados Lauri Romário Silva e Natália Reginini e Silva considera que os candidatos foram prejudicados por outro processo aberto em 2014, quando o Ministério Público questionou a ausência de vagas para deficientes físicos. As nomeações ficaram suspensas de 7 de outubro de 2014 a 16 de julho de 2016, o que correspondeu a quase dois anos. No período, houve protesto de candidatos, reclamações sobre a falta de fiscais para orientar no trânsito e manifestações na Câmara de Vereadores. Numa audiência pública, o município revelou a intenção de contratar 30 novos agentes de trânsito. Com ação judicial encerrada em 2016 a favor do município, a prefeitura teve condições de chamar os concursados, mas nomeou 10 candidatos (como já previa o edital). Diante da promessa de chamar mais aprovados, muita gente nutria a expectativa de ingressar no serviço público até o início deste ano, o que não ocorreu.
— Aquela ação congelou as nomeações. Então, pedimos esse tempo (de quase dois anos) seja contado também — alega a advogada Natália.
Se a tese for aceita na Justiça, o prazo venceria possivelmente no final de 2020. Além disso, houve duas desistências de candidatos nomeados, mas a administração não preencheu as vagas. A defesa, portanto, requer esse chamamento via liminar. Não há prazo para a conclusão do processo e um novo concurso só poderia ser aberto quando a questão for decidida.
A longa espera de Queli
Queli da Silva Cidade estava grávida de 26 semanas quando fez um teste físico no Centro Esportivo Municipal Antonio Barroso Filho no dia 26 de novembro de 2014. Era uma prova de corrida que avaliaria a condição física dela no concurso para o preenchimento de vagas de fiscais de trânsito. Foi incomum uma mulher arriscar a gestação de um filho para participar de uma prova física, mas Queli tinha grande vontade de vencer, conseguiu atestado com um médico particular, fez o percurso de 1.450 metros e passou.
Para sua decepção, soube em abril do ano seguinte que as nomeações estavam interrompidas devido a uma ação do MP. Os candidatos se uniram então para tentar garantir as vagas via Justiça. No meio do caminho, a prefeitura já acenava na Lei de Diretrizes Orçamentárias a previsão de chamar de 30 novos fiscais por ano, o que nunca ocorreu.
Miguel, o bebê que Queli carregava no ventre, tem hoje quatro anos. As perspectivas são desanimadoras, mas o otimismo é maior.
— Daniel Guerra na campanha prometeu que chamaria os candidatos. Até hoje não consegui falar com ele ou com o secretário, mas não vamos desistir — desabafa Queli.
Ela e outros candidatos enumeram as necessidades que a população enfrenta com a falta de fiscais, como dificuldade de obter uma resposta para os pedidos solicitados via plantão no telefone 118. Eles também citam a lei para ciclistas e pedestres, que entra em vigor em março e define as regras de multas para quem circular fora das áreas permitidas, o que trará ainda mais trabalho à fiscalização
— No meu caso, me arrisquei durante a gravidez. Assinei um termo de responsabilidade, fiz e fui aprovada. Só queria entender porque não nos chamaram ou o concurso era só para arrecadar dinheiro? — questiona Queli.
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Sem previsão de novos agentes
O titular da Secretaria Municipal de Trânsito, Transportes e Mobilidade, Cristiano de Abreu Soares, reconhece que o quadro de agentes de fiscalização é baixo, mas o município não tem intenção de contratar novos agentes tão cedo sob a alegação de contenção de gastos. Atualmente, são 74 agentes lotados na secretaria. Cerca de 10% deles atuam em serviços internos e os demais estão distribuídos em quatro turnos de trabalho. Na parte da manhã e da tarde, os 308 mil veículos em circulação são monitorados por uma média de 20 agentes por turno. À noite, esse quadro reduz para 10 agentes. O ideal seria um fiscal para cada 1 mil veículos, o que exigira 308 servidores, mas é uma composição que dificilmente será alcançada nos próximos anos.
Atualmente, faltam agentes para controlar o fluxo de pedestres e carros no entorno de escolas, para orientar motoristas em apagões do sistema de semáforos (comuns em temporais) ou regrar o tráfego nos bairros. Por outro lado, mesmo com efetivo abaixo do ideal, a secretaria conseguiu reduzir pela metade o número de mortes em acidentes desde 2010 e registrou 18% a menos de autuações em 2018 na comparação com 2017, reflexos de uma fiscalização mais inteligente.
— O que a gente busca é trabalhar com a máxima de eficiência usando mais com o que se tem. Algum ponto fica desatendido, é claro. Mas estamos presentes por meios das blitze, das viaturas com giroflex ligado e também com ações educativas — ressalta o secretário.
Em 2017, a prefeitura cogitou usar guardas municipais para reforçar o monitoramento do trânsito em Caxias, mas a ideia foi descartada porque os servidores têm formações diferentes.
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