À frente da Diocese de Caxias do Sul desde 2011, o bispo diocesano dom Alessandro Ruffinoni enviou uma carta ao Vaticano anunciando sua renúncia. O pedido ocorre porque ele completará 75 anos em agosto, idade em que os bispos são obrigados a abrir mão do cargo e aguardar o envio de um sucessor a ser definido pelo papa Francisco. O processo de transição entre Ruffinoni e o novo religioso que comandará a diocese pode ser demorado, mas corresponde ao item 401 do Código de Direito Canônico, que explica que "ao bispo diocesano que tiver completado 75 anos de idade, é solicitado apresentar a renúncia do ofício ao Sumo Pontífice, que, ponderando todas as circunstâncias, tomará providências". O próximo passo é o papa aceitar a renúncia, encaminhada no dia 16 de maio, e dar início à escolha do novo comandante da diocese.
— Quando o papa Francisco fez o Motu Próprio, em que explica melhor o artigo 401, ele diz que o bispo que precisa renunciar tem de se preparar espiritualmente para se despojar do cargo, até para não criar um trauma. Nós precisamos estar espiritualmente e psicologicamente prontos para quando chegar a carta do papa aprovando — admite.
Ainda que a decisão caiba exclusivamente ao Papa, dom Alessandro formulou uma maneira mais democrática para ajudar a escolher seu sucessor. Ele solicitou aos padres da diocese que se reúnam em suas cidades e enviem a ele uma espécie de perfil com as características que esperam do novo chefe da Igreja Católica em Caxias. Com essa breve descrição do perfil do cargo, elaborada pela própria equipe que o futuro bispo comandará, dom Alessandro poderá indicar nomes que correspondam à expectativa da comunidade. Além dele, outros bispos gaúchos, padres e até leigos da Serra serão consultados para que indiquem três nomes ao Vaticano. Por enquanto, o relato dos padres enviado a dom Alessandro adianta que eles esperam um bispo não-religioso (diocesano), ou seja, que não esteja ligado ao superior de uma ordem religiosa à que pertence outra comunidade onde vive, seja ela redentorista, franciscana, agostiniana ou josefina, entre outros.
— Eu pedi que se reunissem por cidades, e não recebi muitas ainda. Então são características que eles vão me contar, e que estão ainda chegando — adianta dom Alessandro.
Ainda que não tenha data prevista para a mudança, dom Alessandro admitiu no ofício enviado ao Papa Francisco, escrito em português, que nota-se que os padres da diocese gostariam de "novos ares", daí também a necessidade de mudança de comando. Depois de passar o bastão, dom Alessandro pode permanecer na diocese, como aconteceu com dom Paulo Moretto ao se tornar bispo emérito, ou mudar de região. Mas isto será planejado só depois de o novo bispo chegar, garante:
— Eu tenho duas escolhas: fico na diocese, e posso ter mais tempo para crismas, palestras, ajudar padres nas paróquias, ou volto para a congregação scalabriniana, que pode me mandar a Foz de Iguaçu, ao Paraguai, a diversos lugares. Tem de ver o que o novo bispo pensará também.
Bispo pode ser da Serra Gaúcha
É cedo para cogitar nomes que podem seguir ao trabalho de dom Alessandro, mas o bispo imagina que experiência possa ser um dos critérios que o papa Francisco usará para escolher entre os nomes indicados. Isto porque a Diocese de Caxias do Sul tem 73 paróquias, um santuário diocesano e 983 comunidades, firmando-se como uma das maiores do Estado. A possibilidade de transferir um bispo que já atue em outra comunidade é grande, cogita dom Alessandro.
— Pode ser alguém que já tenha bastante prática em uma diocese, alguém que seja daqui e atue em outro lugar. Nós temos quatro padres da nossa diocese que hoje são bispos — lembra.
Leomar Antônio Brustolin, Adelar Baruffi, Neri José Tondello e Vital Corbellini são os padres nascidos na Serra, ordenados pela diocese de Caxias do Sul e que atuam como bispos em outras comunidades. Um novo bispo gaúcho, portanto, é uma das alternativas que se desenha como provável. A consulta com os possíveis nomes só ocorre depois que o papa Francisco aceitar o pedido de renúncia de dom Alessandro, o que deve acontecer nos próximos dias.
— Houve um tempo em que o papa escolhia alguém com mais idade, próximo dos 60, mas agora é uma época em que se escolhem bispos bastante jovens — afirma.
Dom Alessandro, o bispo dos estrangeiros
Dom Alessandro é um bispo italiano em território de descendentes da Itália, ou seja, a identificação foi rápida. Até por ter nascido em Piazza Brembana, na província de Bergamo, que dom Alessandro acredita ter sido o escolhido para comandar a Igreja Católica na Serra:
— Eu penso no principal motivo que vim para cá: sou de origem italiana, e a maioria das pessoas daqui também é. Entre os padres também há muitos de descendência italiana. Então, no meu caso, foi um critério bom de escolha. Eu entendo o talian do pessoal, e só falo em dialeto quando sinto que gostam.
Dom Alessandro defende que na igreja, ninguém é estrangeiro. Este, aliás, é o lema de bispado que elegeu para sua vida religiosa e que, desde que chegou a Caxias do Sul, precisou reforçar diante da comunidade. Quando chegou à cidade, por exemplo, intensificou-se o desembarque de ganeses, haitianos e senegaleses, que buscavam o Brasil como um refúgio para a miséria que assola o continente africano e a ilha caribenha.
A migração é uma das causas que o religioso mais se envolve, já tendo atuado na Pastoral dos Migrantes enquanto esteve no Paraguai e sendo escalado pela Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) para acompanhar migrantes brasileiros pelo mundo.
É por isso também que no próximo mês ele irá para Londres celebrar missas, crismar e executar outros ritos católicos para brasileiros em situação irregular. Também é o momento que conclui as visitas pastorais em quase mil comunidades de Caxias, trabalho que liderou nos últimos cinco anos. Conheceu de perto a realidade de lugares onde as missas são celebradas sem sequer haver lâmpadas funcionando, mas que mantêm viva a devoção católica. Nas localidades dos 29 municípios que a Diocese agrega, já foi recebido com fogos de artifício, mesa farta com produtos coloniais, badalar de sinos ou apenas com um caloroso abraço.
— Existem capelas praticamente fechadas, em que só vivem duas ou três famílias, e que nem luz têm. Mas eu quis rezar igualmente lá. Eu faço porque acho interessante, e porque há muito tempo que o bispo não visitava essas comunidades. Agora, só falta no centro de Caxias, mas para pegar o pessoal em casa, só de noite — pondera.