O interesse de caxienses em fazer a próxima compra pela internet cresceu de 8,5% para 12,3%. A cada semana, a Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Caxias do Sul atende a 15 ligações de empresários interessados em aprender como fazer vendas por meio digitais. Os dois indicadores mostram a expansão do e-commerce na cidade em razão da pandemia de coronavírus e a restrição de acesso a lojas. O Sindilojas acredita que a crise sanitária antecipou a evolução do ramo em 10 anos.
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A resistência ao e-commerce na Serra sempre foi baseada na desconfiança: tanto do cliente, que tem medo de não receber o produto, quanto do comerciante, que vê uma loja virtual como um custo elevado. Esta barreira foi quebrada pela necessidade de evitar o contágio da covid-19. No Brasil, a média de consumidores realizando a primeira compra online dobrou e alcançou a marca de 45% dos clientes no dia 22 de março, segundo pesquisa da Ebit Nielsen.
— Com a pandemia, as pessoas se obrigaram a comprar pela internet. Quem vendia, também. Esse foi o primeiro ponto: a curva de crescimento de novos clientes explodiu e a tendência é de continuar — aponta Cleber Figueredo, coordenador de tecnologia e inovação da CDL.
O segundo ponto é que lojistas e consumidores descobriram que a compra não depende de um portal de vendas. A negociação pode acontecer pelas redes sociais, com pedidos e apresentação dos produtos, fotos das opções, acerto de preço e forma de pagamento. Ao final, o consumidor ainda pode escolher buscar o produto na loja.
— Quem não estava preparado para vender pela internet, o caminho mais rápido foi as mídias sociais. O Whatsapp estava na sua mão e muitas empresas já possuem uma lista de contatos ou seguidores em uma página. Foi a solução de curto prazo — explica Figueredo.
O Sindilojas estima que as vendas online aumentaram entre 20% a 25% na comparação com o mesmo período do ano passado. Só que o e-commerce representa apenas 12% do faturamento das lojas físicas. Mesmo diante da tendência de aumento de vendas até o o final de ano, a presidente Idalice Manchini salienta que um portal de vendas online exige a mesma dedicação de uma loja física, e a falta de resiliência foi um problema aos lojistas caxienses no meio digital.
— Aqueles que estavam se preparando nos últimos anos, estão colhendo os resultados. Outros estão investindo agora e aprendendo na prática. E há aqueles que estão estudando a melhor forma de colocar em prática. O fato é que todos os empresários do comércio estão considerando a possibilidade. Bem diferente do que era no ano passado, quando muitos não viam o comércio online como uma realidade. A pandemia foi um gatilho que antecipou este processo em 10 anos — comenta a presidente Idalice Manchini.
Dois a cada três clientes procuram produto online
A intenção de comprar pela internet foi demonstrada pelos caxienses durante pesquisa do CDL no Dias das Mães e na Páscoa. O levantamento, que ouviu mais de 800 clientes, é tradicional durante datas comemorativas que mobilizam o comércio. Em 2018, 7,3% responderam que pretendiam comprar online. A média aumentou para 8,5% no ano passado. Com a pandemia, a intenção saltou para 12,3%.
Para Cleber Figueredo, cada vez mais o consumidor caxiense está dizendo que quer comprar pela internet. A pesquisa também apontou que, antes de irem até as lojas, a maioria dos compradores pesquisa produtos e valores na internet: 28,5% responderam que fazem consultas nos sites das lojas, enquanto 25,5% buscam em redes sociais.
— Antes, tínhamos muitas que iam até as lojas físicas (verificar o produto) para depois comprar online. Agora, acontece o contrário. Os consumidores fazem uma visita online para depois comprar na física. Eles pesquisam e se informam, para depois ir na loja e ter uma melhor experiência na compra. Se tornou ainda mais evidente neste momento, porque deixa o processo mais rápido — corrobora Idalice Manchini, do Sindilojas.
Com as lojas fechadas, entre 20 de março e 17 de abril, muitos lojistas tiveram que aderir a esta reserva pelas redes sociais. O cliente procurava pelo produto, negociava o valor e combinava um horário para ir buscar e fazer o pagamento.
— Buscar na loja já acontecia, mas num número muito pequeno. Com os decretos, virou único meio para vender. Depois, foi autorizado (o cliente) entrar, só que o fluxo de atendimento continua reduzido. Até pela precaução do cliente, é preciso ser mais rápida a movimentação — aponta o coordenador de tecnologia da CDL.
Este processo de fazer a compra online e receber o produto no mesmo dia é a vantagem dos lojistas locais neste universo de alternativas que é a internet. Mesmo que as redes sociais tenham ajudado a manter contato com o cliente neste curto prazo, ambas entidades lojistas apontam que o próximo passo é buscar uma plataforma automática e com um catálogo mais acessível ao consumidor.
— A migração para o e-commerce é mais robusta porque não depende do seu tempo de atendimento e é mais transparente com o cliente, além de permitir compras de clientes de outras cidades. Pelas redes sociais, é apenas uma reserva, e pode acontecer a desistência. No e-commerce, a compra é finalizada e o cliente já pode dizer "o produto é meu". O consumidor já tem esta garantia de recebimento. Se fica um pouco mais caro (para o lojista) é porque profissionaliza o serviço. E o potencial de crescer é muito maior — conclui Figueredo.
Chamada de vídeo para apresentar tecidos e cores
A migração forçada para o mundo digital também afetou os pequenos negócios e públicos que, supostamente, têm mais resistências às nova tecnologia. É o exemplo da Dedal Miudezas, que tem como seu principal público idosos e costureiras. Em março, a loja ficava Rua Pinheiro Machado e tinha um cadastro de menos de 150 clientes. Agora, são mais de 500 contatos no aplicativo Whatsapp e uma operação exclusivamente online.
— Muito do nosso público pertence ao grupo de risco, então tivemos que dar atenção às redes sociais. Nossas clientes aprovaram, justamente porque não tinham como sair de casa ou alguém buscar, e começaram a gostar. Está sendo um diferencial para elas e fidelizando nossas clientes. Não atingimos o faturamento, mas o negócio se manteve. Estamos conseguindo ter boas vendas — comemora a proprietária Marina Muner, 35 anos.
Antes da pandemia, a loja mantinha páginas nas redes sociais e recebia alguns pedidos, mas mais de 90% das vendas aconteciam no balcão, onde as clientes podiam tocar no tecido e analisar cores. Com o risco de contágio, o atendimento passou para os aplicativos Whatsapp e Instagram: a cliente faz o pedido, a equipe envia fotos dos produtos e informa valores. A empresária define o processo como uma avalanche.
— Confesso que, no final de março, estava relutante, afinal tenho 8 mil itens cadastrados. Como colocar tudo isso quando as clientes pedem? Só que é o meu negócio, sobrevivo disso e tenho clientes de 30 anos. Não queria perder esse histórico. O volume foi muito grande de pedidos, não esperava tanto fluxo. É um trabalho manual, semelhante ao da loja: mando a foto, informo valor e acerto a quantidade. Para quem tem mais dificuldade com a tecnologia, usamos uma chamada de vídeo para mostrar o produto. As clientes também precisaram se readequar à pandemia, e nós entendemos.
Antes, a loja física recebia uma média de 120 clientes por dia. Pelas redes sociais, o atendimento caiu pela metade. Cada venda demanda um tempo maior, mas compensa, porque o tíquete médio (valor da compra) subiu. A cliente aproveita para fazer um pedido maior e compensar o valor da entrega.
Marina admite que o seu negócio foi beneficiado pela demanda, pois muitas pessoas passaram usar suas habilidades de corte e costura para fazer e doar máscaras. Com os bons resultados e a falta de previsão para redução do risco do coronavírus, Marina decidiu fechar a loja física e continuar somente virtualmente. Para o segundo semestre, a ideia é oferecer um modelo automático e ter um site com fotos e valores de todos os produtos.
— É o projeto, colocar todos os itens no e-commerce. Um site com fotos e valores, cálculo de fretes, forma de pagamento. Era uma ideia, mas daquelas de longo prazo. Em função de tudo isso, se tornou imediato. E-commerce é trabalhoso, mas as pessoas estão aderindo a esta cultura.
PARA AJUDAR OS VAREJISTAS
:: O Sindilojas anuncia uma plataforma coletiva para que estabelecimentos de pequeno e médio porte se façam a presentes online. O projeto, batizado de "Sindi Store", é uma loja virtual que já disponibiliza opções de pagamento e para retirada dos produtos. A iniciativa não tem custo de adesão, mensalidade ou desenvolvimento. O investimento acontece em percentual de cada venda, negociados pela entidade com a operadora financeira. A previsão é para junho.
:: A CDL pretende lançar um benefício para auxiliar os pequenos e médios varejistas a criarem as suas lojas virtuais em 10 dias ou menos. O objetivo é aumentar a participação do varejo de Caxias no meio eletrônico, ocupando um espaço que hoje é dominado por empresas de fora da cidade. O projeto, que está em fase final de testes, promete acompanhar o lojista em cada etapa do processo, desde a vontade de vender online até a loja virtual estar em operação.