Desde o início das flexibilizações para a retomada de funcionamento dos setores econômicos durante a crise do coronavírus, restaurantes foram um dos segmentos priorizados nas concessões para o retorno gradativo das atividades. Na última semana, os estabelecimentos foram permitidos a restabelecer o atendimento com até 50% do quadro de funcionários e autorizados a receber novamente clientes, com ocupação de até 50% da capacidade e adoção das medidas sanitárias determinadas.
Ainda assim, na avaliação de proprietários e gerentes, o movimento maior na primeira semana de "quase retorno" continua sendo em pedidos de entrega, que, entretanto, não compensam os prejuízos gerados pela restrição de público.
— As entregas amenizam, mas meu movimento está 70% abaixo de dias normais. À noite, o prejuízo chega a ser de 90%, dependendo o dia —comenta o proprietário do Q Restaurante, Vicente Perini, também presidente do Sindicato Empresarial de Gastronomia e Hotelaria (Segh).
Segundo ele, a primeira semana de volta ao público foi bastante reduzida e chega a ser motivo de comemoração de empresários quando conseguem ocupar metade (do espaço já reduzido em 50%) das mesas dos restaurantes.
Entre oito estabelecimentos consultados pelo Pioneiro, apenas dois informaram estar registrando quedas menores do que 70%, sendo que a metade atestou que o desfalque no faturamento alcança entre 90% a 95%
— Meu movimento caiu 95%. Não fossem as medidas que o governo oferece, a gente não tinha como se manter, mas com esses benefícios conseguimos levar por uns 30 dias. Mas, para não demitir, tem que abrir o comércio para movimentar a cidade. Caso contrário, de 30% a 50% do quadro têm de ser demitido — avalia o fundador do Di Paolo, Paulo Geremia, que administra 13 unidades do restaurante no Brasil, sendo sete na Serra.
Para Geremia, o momento da paralisação não poderia ser mais inoportuno:
— Fomos pegos no pior momento do ano. Janeiro e fevereiro são meses que a gente usa uma gordura financeira porque o pessoal vai tudo para a praia. Aí, nesses meses trabalhamos no negativo, usando a reserva, é normal. Mas de março em diante começa um monte de coisas, aulas, eventos. E dessa vez não... Já servimos mais de 20 mil refeições/mês em Caxias. Na Páscoa, que podíamos servir 300 refeições, deu 20 — ressalta.
As regras atualmente em vigor permitem a abertura de restaurantes e lanchonetes com 50% da capacidade de público e distanciamento entre as mesas. A regra não vale para praças de alimentação de shoppings, que seguem apenas com o sistema de telentrega autorizado. Segundo o Segh, 80% dos estabelecimentos da cidade decidiram aderir à abertura ao público e aumento de 50% de retomada de funcionários.
Impacto proporcional
O maior impacto inicial aponta-se a estabelecimentos que têm espaço físico maior para clientes e que dependem de ocupação maior e constante das mesas. Restaurantes com capacidade menor registram impactos proporcionais, conforme apurado pela reportagem. Mesmo assim, os prejuízos são evidentes.
— Os atendimentos estão 35% abaixo do que era. Já tiveram dias piores. Se continuar no ritmo que está e com essa autorização da abertura do salão, que não dá (movimento) nem perto do que dava, mas pelo menos é uma venda que não se tinha até então, acho que vou conseguir manter todo o quadro de funcionários. Claro que cortando o meu líquido. Mas a ideia é manter a empresa e manter os empregos, ganhar dinheiro nós temos a vida inteira para isso — destaca o proprietário do Tonico Lanches, Anderson Trevisan.
Apesar dos bons números de telentrega, Anderson aponta, entretanto, que atualmente atende uma média de 80 clientes ao dia, enquanto em dias movimentados, antes do coronavírus, chegava a receber 350 pessoas.
O QUE PENSAM
"Voltamos essa semana. O movimento foi horrível, caiu 90%. Mas precisamos abrir, caso contrário a roda não volta a girar. Gradativamente, claro, mas as coisas têm de ser retomadas. Já não tenho fôlego (financeiro). Esse tipo de crise faz ver teu próprio negócio com outros olhos. A gente tem que se reinventar, senão não sobrevive. Começa a dar atenção em detalhes que antes passavam despercebidos." Aline Bergonsi, gerente do Labaredas
"Não tem sustentabilidade sem o comércio. Essa proteção que se tem para supermercados, farmácias e outros serviços tem dado uma grande vantagem no sentido comercial, mas não anula o contato das pessoas. Não temos motivo para fechar o comércio e deixar supermercados lotados no final de semana." Paulo Geremia, fundador da Casa Di Paolo
"Ficamos 15 dias fechados. Abrimos para entrega e quem quisesse pegar aqui. Acredito que tenha diminuído uns 40% nos dias de semana, mas uns 70% no sábado, que era o dia que mais faturávamos. No sábado vem família, há consumo de vinhos, sobremesas, essas coisas, agora não existe mais. Mas dá para ir levando, pagar os funcionários e as contas. Nos programamos para aguentar três meses." Nelson Rech, proprietário do Restaurante Rech
"Diminuiu uns 70% o atendimento, mas para a nossa situação atual achei que seria bem pior. Acho que vai melhorar o movimento (com a volta do comércio), mas não sei se é o certo, principalmente porque agora vai começar o frio e essa doença deve surgir com mais força. Agora que vai começar o frio não seria momento de abrir tudo. Os casos podem aumentar e precisaremos fechar tudo de novo." Merielen Felippi Brehn, gerente do Felippi's Lanches
"Caiu 90% o movimento. Estamos atendendo 10% do que atendíamos, mas acredito numa melhora gradativa. Precisa ter gente na rua, colégio, comércio, indústria total, aí sim vai melhorar. Não é a liberação dos restaurantes que vai dar público." João Leidens, proprietário do Baita-Kão
"Abrindo o comércio já começa a ter mais gente na rua, mais consumo. Eu vivo um dia depois do outro, não faço planos para o futuro. Fechei mês no azul, beleza, vamos trabalhar mais um mês nesse mesmo ritmo. Eu não faço planos "se cair o movimento". Mas se eu fechar no vermelho um mês, aí analisaremos." Anderson Trevisan, proprietário do Tonico Lanches
"Os demais estabelecimentos podem ter a sua precaução, como os restaurantes têm. Acredito que (com a reabertura do comércio) pode ser que movimente, mas o movimento deve voltar de verdade só depois de liberarem as escolas. Mas aí pode ser um complicador maior para a pandemia." Vicente Perini, proprietário do Q Restaurante
"Não sou contra abrir, nós só decidimos manter fechado porque trabalho com pessoas que têm mais de 20 anos de empresa. A gente não é colega, a gente é amigo. E mesmo que não fosse, é uma questão de responsabilidade. Quando fechamos já começamos a calcular as despesas que ia gerar. Temos patrimônio, mas pouca liquidez. Tínhamos reserva técnica para capital de giro, para rescisões, mas já estamos usando. O faturamento é bem menor, diminuiu 90%. Mas não estou nem um pouco angustiado com isso. Dinheiro é detalhe neste momento, se todo mundo sair bem dessa é ótimo. Estando vivo, dane-se, o resto é detalhe. Não adianta dizer que precisa de dinheiro e estar morto mês que vem." Marcos Giordani, sócio-proprietário da Pizzaria Giordani