Os últimos três anos foram os mais difíceis da história da economia caxiense. Depois da crise que atingiu em cheio a principal matriz econômica da cidade, o setor metalmecânico, Caxias do Sul sai do buraco, mas ainda cambaleando. Foram 39 meses de queda vertiginosa. O fundo do poço foi alcançado em janeiro de 2016. O índice negativo ultrapassou a casa dos 18% no acumulado dos 12 meses. De lá pra cá, começou o lento caminho de volta. Em setembro, finalmente, alcançou a borda e voltou a respirar: alta de 1,1%. A previsão dos economistas, porém, é de uma recuperação frágil e vulnerável. Isso significa que ela pode voltar ao vermelho.
O poder de compra do caxiense caiu e a inadimplência subiu. Em 2014, o PIB da cidade era R$ 22,3 bilhões — per capita de R$ 47.587. A previsão para 2017 é de R$ 26 bilhões — ou R$ 53.788 per capita , considerando a estimativa populacional de 2016, de 483.377. Alta de 13%. A inflação do período passa dos 26%. Em setembro, 77,5 mil caxienses estavam endividados.
O "inabalável" setor metalmecânico, que só tinha sentido na pele a passageira crise mundial de 2009, viu mais de 500 empresas fecharem as portas e um exército de trabalhadores ser demitido. Em 2015, o setor desligou, em média, 2 mil trabalhadores por mês. De 2013 a 2017, foram fechados 21 mil postos de trabalho. Os empresários da área viram o faturamento despencar pela metade. Em 2013, chegou a R$ 24 bilhões. Em 2017, a previsão (otimista) é de chegar a R$ R$ 10 bilhões. Comércio e serviços foram os últimos a sentir a crise. E estão sendo os últimos a sentir a retomada. Em setembro, o comércio fechou em 3% e os serviços - 1.
Em 2013, mais de 183 mil pessoas atuavam no mercado caxiense com carteira assinada. Hoje, o número é de 159,5 mil. São 23,6 mil postos a menos. Nestes dados não estão incluídos os profissionais que estão se formando e entrando no mercado. Não há dados oficiais sobre o assunto. Também não há estimativas, já que muita gente saiu da cidade por não conseguir voltar ao mercado de trabalho.
O Centro de Integração Empresa Escola (Ciee) de Caxias informa que conta com mais de 24 mil cadastros de pessoas procurando o primeiro emprego.
Qual a saída?
O que Caxias do Sul aprendeu com a maior crise de sua história? Os empresários estão voltando a andar com suas próprias pernas, diz a doutora em economia Maria Carolina Gullo. Ou seja, perceberam que o modelo esgotou e que não dá mais para depender somente das medidas de incentivo anunciadas pelo governo federal.
— Estão agindo por conta própria — destaca.
Para o economista Astor Milton Schmitt, a crise serviu para dar um sopro nas brasas que estavam apagadas.
— Nossas deficiências ficaram evidentes.
Os empresários também foram obrigados a sair da zona de conforto e a quebrar paradigmas. Já é possível perceber um movimento no meio empresarial de buscar novos nichos de mercado e tecnologias atualizadas. Também há empresas, mesmo em número ainda reduzido, que estão diversificando sua produção.
— Se a vocação de Caxias é a indústria, temos de buscar opções dentro deste setor e fornecer para outras áreas. Se o nosso entrave é a logística, precisamos vislumbrar alternativas para ganhar de outra forma. Não dá mais para ficar esperando por milagres. Está na hora de agir —alerta Maria Carolina.
Começar o processo de reindustrialização é uma das saídas. Com o atual valor do dólar (R$ 3,24), não está mais valendo a pena produzir na China e somente embalar o produto no Brasil. É uma esperança de que a produção interna retome e de que a capacidade ociosa de 28% seja reduzida.
A economista acredita neste movimento:
— O caminho é longo e árduo. Mas é preciso começar!
"A crise foi uma lição", diz presidente do Simecs
Se para muitos a crise foi a culpada pelo fim do negócio ou do emprego, para outros, ela representou uma lição. Ficou claro que a cidade não pode depender somente de um setor para crescer e desenvolver. Atualmente, 80% da indústria ainda são representados pelo automotivo pesado, que depende de renovações de frotas e linhas de financiamento federais. Nos últimos 12 meses, este segmento ainda acumula queda de 6%.
Segundo o presidente do Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico de Caxias do Sul (Simecs), Reomar Slaviero, são poucos clientes e, se eles param de comprar, a produção também para.
— Depender de poucas empresas é um perigo. O risco é muito alto — declara.
No final de 2010 e início de 2011, o setor metalmecânico deu um salto e cresceu 30,8%. Em janeiro de 2016, a queda chegou a 23,9%.
— Crescemos muito. Por causa disso, o tombo do setor foi maior e mais sentido.
Assim como Maria Carolina, ele também acredita que o caminho será longo e espinhoso. Slaviero prevê uma possível recuperação somente em cinco anos. Sendo otimista.
— Ainda é muito cedo para falar em crescimento. Precisamos ser otimistas, mas não tanto —revela.
A prova está na queda do setor em setembro, que recuou 3%. A esperança está nas exportações. Em setembro, elas recuaram 13% em relação a agosto. Mas, no acumulado dos últimos 12 meses, cresceram 0,8%.
"Comércio não é apenas vender"
O comércio e serviços representam 51% do PIB de Caxias do Sul. Foram os últimos a sentir a maior crise enfrentada por Caxias e ainda estão sentindo os reflexos. Em setembro, o comércio fechou em queda de 7,1% em relação a agosto. No acumulado dos últimos 12 meses, está 3% no azul. Para o presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Caxias (CDL), Ivonei Pioner, a crise está deixando um aprendizado:
— Aprendemos que o comércio é muito mais que vender. É preciso ter gestão e mecanismos de controle.
Quem não criou pontes, informa, não conseguiu se movimentar e não sobreviveu à crise. O perfil do consumidor também mudou. As necessidades são outras.
— É preciso se reinventar e se profissionalizar urgentemente. Muitos lojistas entenderam o recado.
O futuro presidente da CIC, Ivanir Gasperin, destaca que é preciso valorizar o que é produzido aqui. Ele diz que o grande desafio do setor está nas novas tecnologias.
— Quanto maior o sistema, menor o salário. Como vamos fechar esta conta?