A quantidade de empresas em recuperação judicial em Caxias do Sul teve um salto significativo recentemente. Das 26 companhias caxienses que no momento recorrem ao mecanismo, 18 tiveram a solicitação aprovada durante os últimos dois anos. No Foro de Caxias do Sul, que tramita os pedidos, chega a R$ 630,3 milhões o valor total das ações iniciadas a partir de 2015. O montante se baseia nas dívidas quirografárias, aquelas que os credores não têm garantia de recebimento.
O diretor do Foro de Caxias, Sílvio Viezzer, explica que a escalada recente no número de casos é reflexo do cenário de recessão econômica vivido pelo País.
– Como estamos em um período de crise, evidentemente há dificuldades maiores por parte das empresas e, como última solução, elas buscam a recuperação judicial – constata.
Criada em uma lei em 2005, a medida busca dar fôlego às companhias em má situação financeira. Ela é utilizada quando há dificuldade para honrar pagamentos, evitando que algum credor solicite a falência por conta de pendências superiores a 40 salários-mínimos. Nesse sentido, a empresa submete à justiça um plano de recuperação, no qual explica como fará para reestruturar suas dívidas. Após o deferimento do juiz, a proposta só é homologada caso haja aprovação dos credores em assembleia.
2017 soma três casos
Em 2017, até abril, três empresas ingressaram com o pedido de socorro na justiça de Caxias. A mais recente a engrossar a lista foi a Moda Viva, com dívidas na casa dos R$ 20 milhões. O panorama dos primeiros meses do ano é semelhante ao de 2016, período com recorde de solicitações. Só no ano passado foram 12, sendo uma delas a da metalúrgica Flantech.
Depois de pegar carona no boom econômico vivido pelo país no início da década, a Flantech foi atingida em cheio quando seu principal cliente, uma empresa do setor automotivo, parou de fazer pedidos no final de 2015. Com forte dependência de um único comprador, a metalúrgica começou 2016 em apuros. A falta de capital de giro e a escassez de compradores levou à inadimplência com fornecedores e bancos. A planta, que chegou a ter 110 funcionários, foi reduzida a 28 pessoas, o que ainda gerou um passivo com indenizações trabalhistas. Na segunda-feira passada, parte dos funcionários demitidos chegaram a realizar um protesto, pedindo o pagamento das verbas indenizatórias.
Para salvar a empresa da quebra, o sócio-proprietário Vicente Fadanelli decidiu ingressar com o pedido de recuperação judicial em março de 2016. O empresário reconhece que não é uma medida fácil de ser tomada, mas ressalta que é necessário deixar a vaidade de lado na hora de optar por essa alternativa.
– A recuperação judicial da Flantech foi o pior momento da minha vida profissional, como empresário. Foi um momento de frustração. Mas não dá para baixar a cabeça – lembra.
Desde que o plano de recuperação foi aceito pelo Foro, a Flantech vem se reestabelecendo gradativamente. Fadanelli conta que o mix de clientes foi diversificado. Agora a companhia atende 14 marcas diferentes e as contratações voltaram a ocorrer. No momento, a metalúrgica conta com 53 trabalhadores. A empresa agora aguarda a homologação do acordo na justiça para começar a pagar os credores. A expectativa é de que o passivo comprometa entre 3% e 5% do faturamento anual durante os próximos 10 anos.
Remédio amargo para superar as dificuldades
Imagine uma pessoa que esteja bastante doente e necessita passar por um tratamento intensivo para sobreviver e, em seguida, se curar. Essa é mais ou menos a situação de uma empresa que recorre à recuperação judicial, compara o advogado Alexandre de Souza, que conduz mais de uma dezena de processos do gênero. A situação de dificuldades, lembra Souza, exige uma série de medidas drásticas. Para ele, a recuperação judicial por si só não resolve todos os problemas.
– O principal efeito da recuperação é a suspensão das cobranças das dívidas, sobretudo para que se possa negociar com calma com os credores. Mas o tratamento pesado precisa ser em todas as áreas. A empresa tem que se renovar administrativamente – detalha.
O prazo para a finalização de um processo de recuperação varia conforme o passivo da empresa e a projeção de fluxo de caixa para as temporadas seguintes. Muitas companhias optam por reestruturar as dívidas em aproximadamente 10 anos. Caso se mantenha em dia com os pagamentos por dois anos seguidos, a empresa pode solicitar a saída da recuperação judicial.
Ainda que a crise econômica do País tenha contribuído para alavancar o uso do mecanismo nos últimos anos, ela não pode ser considerada a única responsável pela situação de dificuldades. Essa é a percepção do advogado Angelo Coelho, responsável pelos processos de recuperação de cerca de 40 companhias. O especialista destaca que os erros de gestão contribuem de maneira significativa para que a saúde de uma empresa se deteriore.
– Há empresas familiares com pouco profissionalismo, investimentos em produtos que não deram certo, erros na parte operacional. Se a empresa não fizer o dever de casa, vai ter dificuldade e isso vai gerar o endividamento –sinaliza Coelho.
Quem está em recuperação
Empresa (ramo de atuação)
ACF (Plástico)
Aguila (Vestuário)
Basa (Saúde)
Cedi (Saúde)
Construtora JK Ferreira (Construção civil)
Corsetti (Alimentação)
Dambroz (Metalmecânico)
Daico (Alimentação)
Eletrônica Central (Eletroeletrônico)
Flantech (Metalmecânico)
Grupo Voges (Metalmecânico)
Guerra (Metalmecânico)
Júpiter (Construção civil)
Maxitur (Transporte)
Megasul Cosméticos (Beleza)
Metalúrgica Metalcin (Metalmecânico)
Moda Viva (Vestuário)
Palandi (Agronegócio)
Raihsa (Informática)
Real Bebidas (Alimentação)
Realcenter (Eletroeletrônico)
Tedesco (Gastronomia)
Tomé (Metalmecânico)
Valdani (Construção civil)
Viação Giratur (Transporte)
Zanette (Agronegócio)