Com seis projetos em quatro regiões vitivinícolas brasileiras, poucos grupos de vinho podem falar com tanta propriedade sobre a expansão do setor no cenário nacional como a Miolo, de Bento Gonçalves. Nos últimos 15 anos, a marca investiu em novas instalações e hoje está presente na Campanha, nos Campos de Cima da Serra, no Vale do São Francisco, além do Vale dos Vinhedos.
Líder no mercado nacional de vinhos finos, a Miolo Wine Group produz atualmente mais de 100 rótulos que, juntos, elaboram 12 milhões de litros de vinhos finos por ano. A empresa registrou crescimento de 96% nas exportações em 2013 e figura entre as maiores na categoria. Nessa semana, Adriano Miolo, superintendente do grupo, conversou por telefone com o Pioneiro e contou como o grupo enxerga o setor nesse momento de expansão. Confira alguns trechos:
Pioneiro: Qual a vocação vitivinícola do Brasil?
Adriano Miolo: O produto emblemático brasileiro é o espumante, que já está consagrado. Assim como o Chile tem o Carménère, o Uruguai tem o Tannat, a Argentina tem o Malbec, se a gente for buscar algo emblemático brasileiro, seria mais que uma variedade, seria um produto, que é o espumante. Isso porque o espumante fez um sucesso absoluto nesses últimos anos e teve uma resposta de mercado fantástica. Estima-se que 80% do consumo de espumante no Brasil é de produtos nacionais e apenas 20% é importado, o que é exatamente o inverso do que ocorre com o vinho fino. Quer dizer, o espumante brasileiro tem uma resposta de mercado, tem um reconhecimento do consumidor brasileiro e está começando a ter um reconhecimento no mercado internacional também. Além disso, em qualquer uma das regiões brasileiras se produz ótimos espumantes. Lógico que a vocação clássica do produto é na Serra, que é onde nasceu e quem tem o status de região produtora, mas todas produzem bons espumantes.
Pioneiro: Além da produção de espumantes, o que merece ser potencializado no setor vitivinícola?
Miolo: Não podemos deixar de lado toda a nossa produção de vinhos, pois ainda temos um caminho longo para percorrer, principalmente na conquista do mercado nacional. Hoje temos somente 20% do mercado brasileiro de vinhos finos ocupado por produtos nacionais, sendo que há 20 anos era o contrário. Claro que o cenário mudou, o mercado mudou, teve as questões cambiais... Mas temos um longo caminho de conquista de mercado. O vinho é, na minha opinião, um produto que temos que dar atenção na cadeia vitivinícola brasileira, sobretudo agora que se fala de novas regiões produtoras. Sabemos que antes tínhamos limitações, já que tudo era concentrado na Serra e aqui era necessário fazer todos os produtos, mesmo não tendo potencial para todos os produto. O advento das novas regiões vitivinícolas é um grande avanço na produção de vinho no país. Considero que temos hoje seis regiões vitivinícolas consolidadas (Vale do São Francisco, Campanha, Planalto Catarinense, Serra do Sudeste, Campos de Cima da Serra e Serra Gaúcha). Cada uma foi se especializando com o passar dos anos em algumas variedades e isso foi aumentando o leque de produção de vinhos finos. Então eu acredito muito, além dos espumantes, nesse mercado de vinhos finos brasileiro.
Pioneiro: Quais as principais diferenças dos polos produtores de uva?
Miolo: O Vale do São Francisco, que é uma região quente, gera produtos diferenciados pois lá se adaptaram variedades que talvez em outras regiões não tivessem grande potencial, como a Syrah, que para os vinhos tintos tem dado ótimos resultados e no Brasil praticamente não se produzia. Os próprios moscateis espumantes estão dando resultado fantásticos nessa região. Podemos citar ainda a região da Campanha, que conta com um leque muito maior de vinhos brancos, como o Pinot Grigio e o Sauvignon Blanc, varietais que não eram tão exploradas no país. O leque de vinhos tintos deles também é importante, como as castas portuguesas, Touriga Nacional, Tinta Roriz e o próprio Cabernet Sauvignon que se adapta muito melhor à Campanha. A gente pode citar ainda o Planalto Catarinense com a Pinot Noir, assim como os Campos de Cima da Serra, já que possuem terroir semelhante por serem as regiões mais frias do Brasil. Aqui na Serra temos o Merlot. Agora temos, portanto, vinhos diferentes de outras categorias e de novas variedades e estilos. Só que tudo isso é muito novo: começou nos últimos 10 anos e esses resultados estão chegando agora no mercado, porque o ciclo do vinho é de no mínimo 10 anos. Então todo investimento que se faz na produção, melhoria da qualidade, incorporação da tecnologia, tudo isso demora para chegar no mercado. Estamos vivenciando o novo vinho fino brasileiro. Há 10, 15 anos, 90% da produção de uva era de alta produtividade, sem tanta tecnologia e sem a qualidade que tem hoje. Saímos de um vinhedo que produzia em média 20 quilos por planta para agora ser 2 quilos por planta. A qualidade está começando a chegar na garrafa, falta agora o consumidor entender isso, porque ele ainda tem aquela velha lembrança do vinho fino brasileiro e foi por isso que se jogou com tudo no vinho importado. Temos que fazer ele voltar a provar e comprar.
Pioneiro: Essas novas regiões já foram criadas com foco na especialização de vinhos finos. E qual é a situação da Serra, também tem investido nesse mercado?
Miolo: Sim, também tem se especializado, porque em função dessas novas regiões com vinhedos de alta tecnologia, a própria Serra fez uma reconversão. Claro que não podemos esquecer que mais de 80% da produção da Serra é de uvas americanas e hibridas. Nesse segmento está ocorrendo uma reconversão no sentido de que muito do que era produzido para garrafão está indo para suco de uva. Hoje já se processa mais uva comum para suco do que para vinho comum. No caso das uvas finas da Serra a reconversão ocorreu para vinhos de melhor qualidade.
Leia o restante da entrevista no Pioneiro deste final de semana.
Expansão das videiras
'Estamos vivenciando o novo vinho fino brasileiro', destaca Adriano Miolo
Superintendente do grupo Miolo Wine Group conta como enxerga o setor vitivinícola nesse momento de expansão
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