Lourinha Bombril, Cuide Bem do Seu Amor!, Aonde Quer que Eu Vá, Vital e Sua Moto (de) Óculos (de) Caleidoscópio. Ela Disse Adeus, Meu Erro! (Mesmo) Tendo a Lua, (vista com a) Lanterna dos Afogados.
São tantos sucessos d'Os Paralamas do Sucesso, que falam de amor, de partida, do maravilhoso mundo do Brasil e da triste realidade da desigualdade social a qual o país sempre viveu. Todos esses hits, que embalam todas as gerações, nos streamings, nos karaokês, nas festas, estarão no palco do UCS Teatro, em Caxias do Sul (UCS), nesta sexta-feira (1º), a partir das 20h30min.
Herbert Vianna, João Barone e Bi Ribeiro trazem à cidade a turnê que celebra os 40 anos de estrada d'Os Paralamas. E engana-se quem pensa que as quatro décadas entre palcos, estúdios e viagens cansou o trio. A animação com que Barone conversou com a reportagem, na última terça-feira (29), é a de um guri que está começando a carreira musical.
— Um encontro feliz entre pessoas que ficaram ainda mais felizes —resume o baterista.
A demonstração de admiração a um amigo (neste caso, de Barone a Herbert), análise do retorno dos vinis, histórias de bastidores com o saudoso Renato Russo e a primeira visita a Caxias, em 1985, além de quando o trio fez dois shows em uma mesma noite, em 1995 — com direito a tour no extinto Teatro de Lona, no Enxutão — foram alguns dos assuntos que surgiram nesse delicioso bate-papo.
Que memória tu tens daqui de Caxias?
A gente tem um retrospecto maravilhoso. Em 1983, a gente começou a fazer um showzinho aqui outro ali nas capitais e com o tempo a gente foi vendo como o rock brasileiro ganhou esse status de poder levar as bandas, os artistas, para fazer mais shows em mais lugares. Foi mais ou menos em 1985, depois do Rock'in'Rio, que a gente começou a fazer turnês em que a gente passava 15 dias na estrada. Quando chegava na região Sul, era uma alegria, porque era muito bacana a qualidade dos lugares onde a gente se exibia, como o Teatro de Lona aí em Caxias. Então era sempre um momento de extrema alegria a gente poder fazer a nossa turnezinha, anualmente, pelo Sul e esse circuito da Serra sempre foi muito bacana, sempre foi um lugar muito bonito e a plateia sempre muito receptiva. Então a gente tem as melhores lembranças.
Após um show no Teatro de Lona, em 1995, na turnê "Vamo Batê Lata", vocês foram a casa noturna Incitatus onde tocaram por três horas. Tu lembra disso?
Isso acontecia muito. Depois do show a gente ia jantar em algum lugar e muito provavelmente tinha algum lugar com música ao vivo. E, naquela época, a gente era muito empolgado. A gente viu o pessoal levando um som, uma coisa levou a outra, pediram para a gente dar uma canja. A gente foi, tocou e acabou fazendo quase um outro show. Isso aconteceu inúmeras vezes ao longo desses tantos anos de estrada. A gente gosta muito de interagir um pouco, conhecer o lugar. Quando isso acontecia, era só alegria.
Tu falaste agora sobre a questão da empolgação. Tu achas que isso é um dos elementos que faz com que vocês tenham 40 anos de estrada?
Eu acho que tem um dado que permanece exatamente o mesmo de quando a gente começou. A gente se conheceu em 1981. Se reencontrou em 1982, quando o Herbert e o Bi me chamaram mesmo para a banda. Aí a gente gravou o nosso primeiro álbum em 1983, está completando 40 anos do início formal. Eu acho que, para a gente, é muito claro esse compromisso com o que gostamos de fazer, de tocar mesmo e de como a gente foi construindo uma relação muito sentimental. Nós três somos muito unidos, nós quatro, com o Zé Fortes, nosso empresário que virou o quarto paralama, que também é uma razão para a gente estar aqui hoje. Ele nunca deixou a gente entrar em alguma roubada, sempre preservou muito a banda para a gente fazer o que tem que fazer sem se preocupar com dinheiro, contrato.
E como é este "casamento" de 40 anos?
A gente fica sabendo de questões internas de bandas, que vão desgastando, e nosso caso foi justamente o contrário, a gente foi se solidificando, confiando cada vez mais um no outro, então é uma soma de fatores. Acho que o principal é a vontade de fazer o que a gente realmente gosta de fazer e manter isso é realmente um privilégio. A gente sabe que poucas pessoas, poucas associações, poucos profissionais conseguem ficar 40 anos fazendo alguma coisa com essa vontade de seguir adiante. O Herbert sempre fala que a gente está começando um novo ciclo, de 40 anos.
Vocês seguem conquistando novos fãs, de diferentes faixas etárias. Como é esse sentimento, vendo jovens, na adolescência, escutando músicas lançadas nos anos 1980?
Uma boa parcela das nossas músicas continua valendo. Parece que as músicas não expiraram o prazo de validade. Seja para falar algo pessoal, como o Herbert fala de amor e ao mesmo tempo para falar de coisas tão comuns para tanta gente, como é o caso de Alagados, a questão toda da desigualdade social que a gente vive. Acho que a gente deve muito à maneira como o Herbert conseguiu fazer essas letras tão incríveis. Porque grande parte do que acontece se deve a essas letras e histórias incríveis nas músicas, e a gente consegue, coletivamente, dar esse formato musical para essas histórias incríveis que o Herbert canta com aquela voz.
E o Herbert é o compositor consolidado da banda, né?
Ele (Herbert) sempre falou que ele não é um cantor, ele é um guitarrista que canta. Mas a voz dele é uma voz superidentificável, todo mundo vê ali como o Herbert é a voz da banda. Não tem Paralamas se não tiver nenhum dos três, mas o Herbert é o cara que é responsável pelo que a gente fala. É um negócio seriíssimo a coragem dele. Me lembro de conversas dele com o Renato Russo, a gente ali naquela época do início, depois o sucesso, como é que você vai lidar com o sucesso. O Herbert impressionado como a Legião virou aquela coisa da Religião Urbana e o Renato falava "Herbert, você é muito corajoso, como você consegue falar sobre essas suas histórias tão pessoais? Eu não teria coragem de fazer uma letra". Incrível, né? Dois gênios da nossa geração falando ali. É sempre uma coisa muito difícil você explicar de uma forma muito matemática, porque passa muito pelo sentimental, pelo sensorial das pessoas. Não existe uma fórmula de bolo para fazer uma música boa, para fazer sucesso. São coisas muito imponderáveis e Os Paralamas, no final, eu acho que é isso, foi um encontro feliz. A gente se encontrou há tanto tempo e continua junto até hoje, com essa confiança mútua, o Herbert sempre foi um cara muito generoso comigo e com o Bi. O Herbert é um cara muito dono da coisa musical, da teoria. Ele sabia tocar Bossa Nova, um cara requintado, toca guitarra como poucos e, ainda por cima, começou a escrever músicas que a gente canta até hoje. Eu e o Bi somos aqueles moleques, músicos intuitivos, que a gente foi construindo a nossa reputação junto com a banda, se esforçando, se esmeirando sempre, para fazer o melhor sempre. Os Paralamas são isso, pode-se resumir em um encontro feliz entre pessoas que ficaram ainda mais felizes.
Tu falas muito que o Herbert trouxe as histórias dele para as composições. Tu nunca te arriscou a trazer alguma tua?
Acho que o papel preponderante de um compositor em uma banda, ele acontece espontaneamente. Acho que se o Bi ou se eu estivéssemos esse dom, a gente estaria explorando esse dom também. Acabou que, eventualmente, houve alguma parceria do Bi e do Herbert, mas ali sempre foi preponderante o Herbert. Eu posso me orgulhar de ter feito uma música que, desde o início, mostrou ao que veio, que era fazer as pessoas morrerem de rir, que é a história do marinheiro, a Melô do Marinheiro, eu fiz essa música de brincadeira, num dia lá que o Herbert e o Bi não tinham chegado para o ensaio e aí eu fiquei brincando lá no gravador do Herbert e quando eu mostrei para eles, caíram sentados de rir. Depois a gente transformou ela no que virou, foi melhorando, mas a letra, que é minha, foi uma história engraçada, que não necessariamente aconteceu comigo, mas foi apenas uma história engraçada e que eu tive a felicidade de virar uma das músicas mais conhecidas d'Os Paralamas e isso atesta a nossa diversidade, porque a gente fala de coisas muito sérias, como a violência e as dores do amor, que o Herbert canta tão bem, e a gente também contou essa história engraçada.
A gente está com o retorno dos vinis. Qual é a sensação de ver pessoas que querem voltar a essa origem da banda?
Isso é interessantíssimo, porque já faz alguns anos, antes da pandemia mesmo, a gente tinha ouvido essas histórias de como o vinil voltou a ser procurado pelo grande público, aumentou a demanda, até as fábricas não estão dando conta da produção. A gente vai entrar na fila, para sair os vinis, destas reedições dos nossos três primeiros álbuns que saíram lá nos anos 80. Eu acho isso interessante, que também demonstra como o rock brasileiro está num nicho muito grande, muito considerável.
Falando em rock brasileiro... Ele é imortal, né?
A maneira que a gente vê aí quando tem um grande festival de rock ou até mesmo essa turnê dos Titãs com a formação original. Está dando uma demonstração de força muito grande do que a gente conseguiu com o rock brasileiro. E aí quando a gente vê, às vezes, equivocadamente, as pessoas comparando de uma forma muito errada que o rock brasileiro não existe mais. É muito pelo contrário. Ele está ali onde sempre esteve. O Bi costuma dizer muito isso. Nos anos 80 a gente estava muito em evidência, mas depois outras coisas populares foram ganhando um pouco mais, até do interesse comercial. E o rock ficou ali, não significou que ele foi abafado ou que ele acabou, mas ele ficou para o seu público especifico. E isso é fácil de entender hoje em dia, como a gente vê, até a facilidade que você tem, hoje em dia, de ouvir qualquer música pelo streaming. Tem um lado bom também, um lado facilitante disso tudo, mas você vê como o público de nicho vai atrás. Muita gente boa foi ajudando nesta reputação do rock, a nossa inesquecível Rita Lee, Raul Seixas, Mutantes, enfim, muita coisa aconteceu antes da geração dos anos 80, mas ainda era uma coisa um pouco setorizada demais e a nossa geração dos anos 80, Cazuza, Blitz, Legião, Titãs, a gente ancorou o rock na música brasileira. Isso é digno de nota mesmo.
Além do rock brasileiro, a gente tem muito forte, aqui no Rio Grande do Sul, o rock gaúcho. Como vocês veem essa cena musical?
O rock gaúcho se firmou como um grande manancial da música dos anos 80. A gente é da mesma geração. A gente vem na mesma leva. O que aconteceu aqui no Rio de Janeiro, nos anos 80, com a Blitz, que era uma banda que, praticamente, abriu a porteira para as gravadoras irem atrás de todas as bandas que poderiam representar esse mercado que estava surgindo, também estava acontecendo em São Paulo, em Porto Alegre, em Belo Horizonte, Curitiba, Salvador, acabou, inevitavelmente, trazendo esses talentos e essa demanda tão importante. O rock gaúcho virou uma marca presente nessa geração que ancorou o rock como uma coisa pertinente. Até com um pouco da sua linguagem regional. Em vários momentos a gente cruzou linha com essa turma toda. Thedy (Corrêa, do Nenhum de Nós) tem parcerias com o Herbert, a gente, volta e meia, faz show com o Humberto (Gessinger, do Engenheiros do Havaii) pelo Brasil afora e vê como a música deles ainda é representativa e leva essa gente toda para os shows. A gente ficou muito feliz de dividir esses trunfos com essa turma toda aí do Sul que tem o seu valor.
E qual o recado d'Os Paralamas para os caxienses para esta sexta-feira? Como está a expectativa para o show?
Bom, a gente está na regressiva. Contagem regressiva para estar aí. É sempre uma alegria voltar para Caxias e a gente está realmente com o gás redobrado aqui. A nossa turnê é a Paralamas Clássicos, que é um show onde a gente enumerou uma grande parte, talvez 99% das músicas mais conhecidas do nosso repertório, da nossa discografia e a gente apresenta essas músicas em grande estilo, com uma empolgação redobrada. Vai ser lindo chegar aí em Caxias. A gente espera que todo mundo curta muito o show e que a gente realmente entregue aquela música que a gente quer ouvir d'Os Paralamas. Acho que vai ser uma festa muito bonita.
Nesta hora, a repórter já fez o pedido da favorita da banda: Meu Erro.
— Essa aí não pode faltar, se não o pessoal processa a banda.
Confira momentos da banda em Caxias do Sul
Paralamas Clássicos 40 anos
Quando: Sexta-feira (1º)
Onde: Teatro da Universidade de Caxias do Sul (UCS) (Rua Francisco Getúlio Vargas, 1130 - Petrópolis)
Horário: abertura 19h30min e início 20h30min