Por uma década a historiadora bento-gonçalvense Cristine Tedesco pesquisou a vida e a obra de uma pintora italiana pouco conhecida. Na verdade, o mote para se debruçar sobre a história de Artemisia Gentileschi (Roma, 8 de julho de 1593 - Nápoles, 1656) foi o fato de pouco se saber sobre o trabalho de artistas mulheres em alguns dos períodos mais férteis da história da arte, como o Renascimento e o Barroco, dos quais fez parte a biografada no recém lançado livro Artemisia Gentileschi: Trajetória biográfica e representações do feminino.
O estudo começou no mestrado e se estendeu pelo doutorado de Cristine pela UFRGS, que pôde viver um ano na Itália com bolsa paga pelo programa europeu Erasmus Plus. A pesquisa joga luz sobre a primeira mulher a ser aceita pela Academia de Belas Artes de Florença, cuja produção artística tem como característica marcante, segundo Cristine, tem como característica marcante a aparição de mulheres em situações de protagonismo.
– Era uma época em que pintores se expressavam em uma linha tênue, correndo risco de serem considerados promíscuos ou hereges. Dizer que a Artemisia foi uma mulher posicionada seria uma idealização, prefiro considerar que ela “negociava” em sua obra, pintando mulheres protagonistas, mas sem ferir a moral vigente ou correr o risco de desagradar o mecenato, de onde vinham as encomendas. Artemisia pintou para as cortes mais importantes da Europa – explica a autora.
Além de mostrar que, mais do que pintora, Artemisia era uma intelectual atenta aos conhecimentos de literatura, filosofia e ciência da época (seus quadros são repletos de referências a Ovídio, Dante Alighieri e Galileu Galilei, de quem foi aluna), a obra também aprofunda o episódio de “desvirginamento” – termo que se usava para o estupro no século 17 – sofrido por Artemisia em 1612, pelo qual foi condenado o também pintor Agostino Tassi (Perugia, 1578 – Roma, 1644).
Cristine teve acesso, na Itália, aos relatórios do processo, com interrogatórios, acareações de testemunhas, exames ginecológicos e descrição da tortura a qual a pintora foi submetida, como ré (pasmem!), para que dissesse a verdade. Escritos em italiano antigo e latim, foi preciso contar com uma força-tarefa de tradução e interpretação de termos jurídicos da época, da qual participaram os freis Celso Bordignon e Vicente Pasinatto.
– O crime não era o estupro em si, mas a desonra da família pelo desvirginamento da filha. O processo foi movido pelo pai de Artemisia e, se ela não fosse virgem, talvez nem tivesse sido aberto o caso – destaca Cristine.
Viabilizado pelo Fundo Municipal de Cultura de Bento Gonçalves, o livro tem tiragem de mil exemplares, dos quais 100 foram doados para a secretaria de Cultura de Bento Gonçalves e outros 400 serão enviados para instituições de ensino brasileiras e italianas, além dos arquivos históricos italianos que Cristine visitou (muitos sequer sabiam que guardavam documentos sobre Artemisia, segundo a autora).
– Foi uma pesquisa a qual me dediquei tanto, que não quero que esse conhecimento sirva apenas a mim. O principal objetivo com a publicação do livro é que ele possa incentivar novos estudos e a descoberta de outras artistas que tiveram sua história e importância obscurecida.
Lançado pela editora Oikos, o livro tem 318 páginas e mais de 70 imagens, e pode ser adquirido por R$ 35, nas livrarias Dom Quixote (Bento) e Do Arco da Velha (Caxias), ou pelas plataformas digitais Amazon e Vemdelivery.
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