Maria é a filha de artista, mas sua filha virou cientista. Não é poesia, mas a rima mais do que um desatino é a demonstração real de que na arte contemporânea não há padrão que não possa ser quebrado ou rompido. Maria é do Carmo, de sobrenome Verdi, caxiense, mas radicada em São Paulo há 30 anos. Ela está em Caxias em curta temporada para a abertura da exposição Plastic Babel 2019, que ocorre segunda-feira no Campus 8 da UCS, sob curadoria da doutora em Artes Visuais e professora Silvana Boone. A mostra contempla duas instalações, Flood - O Manto da Visibilidade e Babel Baby.
Enquanto planejava como dispor a obra no espaço da exposição, Maria do Carmo discorreu acerca da arte e da perseguição que arte e ciência têm sofrido recentemente no Brasil. Aquela menina que sonhava ser arqueóloga, hoje escava em solo estético e desvela tesouros a partir de objetos aparentemente não-artísticos como madeira laminada, dessas de fazer tapumes em construções, ou brinquedos comprados em lojas de bugigangas da Rua 25 de Março, em São Paulo.
— O Marcel Duchamp (1887 - 1968) tem uma frase interessante: "Arte é um jogo entre todos os homens de todas as épocas". Não é por nada que o cara é a espinha dorsal da arte contemporânea. E o artista realmente joga. Ele joga consigo mesmo, joga com o espectador, tenta jogar com o mercado, é difícil, mas ele tenta... — ensina Maria do Carmo, graduada em Artes Plásticas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e pós-graduada em Produções Simbólicas pela UCS. Sua produção artística envolve desenho, pintura, escultura, instalação e vídeo.
— Mas se a arte é um jogo, por que tem sido tão atacada? — pergunto.
— Eu entendo que arte e ciência não existem sem liberdade. Não é possível fazer arte, nem fazer ciência, sem liberdade. Toda vez que alguém disser: "É aqui dentro deste quadrado que você tem de estar, e você tem de se comportar assim", sabe o que artista vai dizer? "Hmmm, aqui é a borda? Então, eu vou para lá". — explica, ficando de pé e dando alguns passos à direita, como quem vai além do limite pré-estabelecido.
— Há quem critique a arte porque não enxerga utilidade, o que a senhora pensa a respeito?
— Um espírito pobre não pode ver utilidade nenhuma na arte, como não vê utilidade nenhuma na ciência. É um negacionismo absolutista de gente que não vê utilidade sequer da escola. Porque é um espírito que não tem capacidade de reconhecer valores no outro, é uma pessoa cega que não enxerga o outro, só a si mesmo.
Maria do Carmo não vende certezas. Ela distribui conteúdo simbólico e poético. Suas bonecas com cabeças de frutas de plástico são a materialização da sua utopia em meio a um tempo polarizado e sombrio, porque divide as pessoas em blocos excludentes. Bebês híbridos, nascidos em uma Babel contemporânea, que é tão subversiva que ao invés de confundir e dividir as pessoas em grupos distintos, sonha com uma sociedade em que será possível conviver e coexistir, apesar das diferenças.
Tirania é cortar a cabeça-fruta desses bebês e extingui-los, porque são aberrações. Mas a arte sublima, abraça o híbrido e destila poesia ao invés de raiva.
Confira a seguir, detalhes das instalações que estarão à mostra do Campus 8, a partir do dia 9 de setembro.