A função social de uma biografia é imensurável. Mais do que perenizar a memória de personagens cujas trajetórias não podem ser esquecidas, as boas biografias assumem a missão de traduzir o ser humano por trás da personagem, por vezes como forma de jogar luz contra visões distorcidas ou reducionistas.
Nas 420 páginas de Júpiter Maçã - a efervescente vida e obra (Plus, 420 páginas, R$ 68), os jornalistas Cristiano Bastos e Pedro Brandt cumprem a missão de contar a história de um dos mais amados roqueiros gaúchos, Flávio Basso, revelando o que havia por trás de um músico genial, cujos demônios contra os quais lutou – o mais feio deles o alcoolismo – poderia encobrir uma pessoa digna de todo o amor recebido pela sua obra.
Vítima de um infarto aos 47 anos, em 2015, o ex-vocalista do TNT e dos Cacavelletes, que em 1996 assumiu a persona Júpiter Maçã (posteriormente Júpiter Apple) com a qual expandiu seus horizontes para todo o Brasil em uma carreira solo muito marcada pela psicodelia, nunca deixou de ser prolífico.
– O Flávio foi sobretudo um artista extremamente prolífico. Mesmo na fase mais avançada da sua doença, o alcoolismo, ele nunca deixou de ser produtivo, Existem muitas gravações dele guardadas em diversos acervos, discos nunca lançados, e cujos lançamentos ainda estão sendo preparados. Pelo lado humano, ele era um cara com muitas qualidades e defeitos, mas que era muito amoroso. Amava muito o filho e sofreu demais com a morte dele (Glenn faleceu em 2001, aos 11 anos, por complicações de uma hepatite autoimune) – ressalta Cristiano Bastos, que é natural de Caxias do Sul e assina também os livros Gauleses Irredutíveis: causos e atitudes do rock gaúcho e Julio Reny: histórias de amor & morte.
Além de escavações físicas e virtuais por entrevistas do biografado em jornais, revistas, fanzines e blogs ao longo da vida, os autores se socorreram das memórias de dezenas de pessoas que participaram da vida de Júpiter Maçã, como ex-colegas das bandas que o consagraram, músicos de fora do estado, como Thunderbird, e até de fora do país, como Tim Gane, guitarrista da banda franco-britânica Stereolab. Contudo, talvez o melhor tempero para o molho sejam histórias contadas pela própria família, que permitem conhecer melhor não apenas a intimidade do artista, mas curiosidades como o surgimento da alcunha Júpiter, que era um pseudônimo que o avô de Flávio usava para assinar colunas poéticas no jornal Serrano, de Passo Fundo. Outra descoberta saborosa envolve o expoente máximo da literatura gaúcha, Érico Verissimo:
– O pai do Érico Verissimo era um admirador da orquestra de Cruz Alta, que tinha o sargento Aparício Quadros, bisavô do Júpiter, como clarinetista. Era ele quem tocava o “solo de clarineta” que dá nome ao livro de memórias do Verissimo. Na infância, o escritor ouvia o solo da música A Força do Destino nos concertos que ia junto com o pai. Durante uma apresentação, o pai pediu para o Érico ir até o sargento e pedir para que a orquestra tocasse a música. Ele foi e pediu “A Força do Intestino”. E o mais legal é que tem a foto do Aparício, e ele é a cara do Júpiter – diverte-se Bastos.
O lançamento será nesta quarta-feira à noite, no Bar Ocidente, em Porto Alegre. Além de sessão de autógrafos, haverá show da Império da Lã, com a participação de diversos convidados. No domingo, também com autógrafos, a Cinemateca Capitólio Petrobras, na Capital, promove uma sessão gratuita com exibição de vídeos históricos de Júpiter Maçã.
Para comprar
Quem não estará por Porto Alegre nos dias de lançamento, pode comprar a obra pela internet, através deste link: bit.ly/2PKBFNM