O cenário não é mais aquele bairro Bom Fim dos anos 1980, que respirava fertilidade artística (e etílica) habitado por figuras que se tornariam ícones do rock gaúcho, entre elas Wander Wildner e Jimi Joe. O cenário agora é um palco de teatro em Caxias do Sul, onde apesar dos cabelos brancos que denotam o ano atual, essa mesma dupla ainda desfila a atitude criativa que ajudou a forjar o rock gaúcho com a ousadia e o atrevimento que conhecemos. A clássica canção Sandina – escrita por Jimi e imortalizada na voz de Wander à frente dos Replicantes – é só uma das tantas particularidades que eles carregam em comum nessa trajetória. Talvez a mais importante delas seja a escolha dos palcos como um lugar para brindar o espírito inquieto que os une.
– A gente é como irmão, é muito legal tocar com ele porque não preciso dizer nem qual é a música. Só saio tocando, ele já sabe e vai atrás. Ele tem um estilo de tocar muito especial, são muito bonitos todos os fraseados que faz na guitarra e se encaixam muito nas minhas músicas – elogia Wander, sobre o parceiro com quem divide palco neste sábado, na Sala de Teatro Professor Valentim Lazzarotto, em Caxias.
A inquietude da dupla, nesse caso, tem a ver com não parar no tempo. Por exemplo, o show em Caxias deve ser aberto por Jimi Joe, cantando algumas faixas do disco solo Nenhum Dano Mental Grave Constatado, lançado ano passado, no auge dos 62 anos do músico. Depois, Wander deve se juntar a ele para também mostrar algumas novidades do disco recém saído do forno De gritar me cansei rouco e ao pensar no mundo eu me vi louco. Wander, aliás, lançou quatro discos nos últimos quatro anos. E, se a dupla vem a Caxias justamente para celebrar o Dia do Rock, essa energia de criação talvez seja o principal legado roqueiro que eles têm a ensinar.
– O rock pode até ficar careta e comercial para caramba, a gente vê hoje o que é o comércio do rock, com artistas e bandas que se tornaram só produtos, com músicas que não mudam. Acho isso muito chato. Para mim, o rock vai mais além, a arte é minha forma de me expressar para o mundo, na minha música vai ter tudo que eu penso, então eu tenho que renovar ela, não vou ficar parado no tempo – defende Wander.
Mesmo tido por muitos como um herói do rock gaúcho, Wander nunca ficou preso ao gênero, já surfou por ondas do punk, do folk, do brega, etc. Começa os dias sempre ouvindo música clássica e, atualmente, a casa onde vive no Campeche (praia de Florianópolis) não tem mais nem aparelho de CD, nem de vinil. É o Youtube o responsável por mostrar as novidades que ajudam a manter viva a criatividade do compositor.
– Eu vivo o meu tempo presente e aí descobrir coisas novas é fundamental para mim – justifica.
Outro ensinamento roqueiro bastante vivenciado pelo músico é o lema punk “faça você mesmo”. Em Caxias, por exemplo, foi ele mesmo quem contatou o Centro de Cultura Ordovás para oferecer uma apresentação. Escolheu o espaço como alternativa à escassez de bares, outro sintoma de nossos tempos. Além de driblar a falta de espaços para tocar, Wander também está, atualmente, desbravando o mundo das gravações caseiras, o que facilita o processo da composição. E tem usado a internet como aliada, já que não lança mais discos físicos.
– Já não temos mais aqueles mesmos espaços para tocar, mas hoje a nossa música viaja pela internet. Então, tem gente no mundo inteiro ouvindo a minha música e comprando ela de forma virtual. Vou vivendo essas mudanças, fazendo as coisas do meu jeito, me adaptando – ensina.
Programe-se:
:: O quê: show com Wander Wildner e Jimi Joe.
:: Quando: neste sábado, às 20h.
:: Onde: Sala de Teatro Professor Valentim Lazzarotto, no Centro de Cultura Ordovás (Rua Luiz Antunes, 312), em Caxias do Sul.
:: Quanto: ingressos, à venda na hora, custam R$ 30 e R$ 15 (estudantes e idosos).