O Otto que sobe ao palco para fechar o Festival Brasileiro de Música de Rua neste domingo, pela primeira vez em Caxias do Sul e após hiato de cinco anos sem shows no Sul, é uma versão mais romântica e aprazível do cantor enérgico e indomável que saiu do interior de Pernambuco para se tornar um dos artistas mais queridos da música brasileira recente. Não é nada, contudo, que os fãs devam estranhar. Para o ex-percussionista das bandas seminais do movimento Manguebeat, Nação Zumbi e Mundo Livre S/A, o público que o acompanha em duas décadas e meia de carreira percebe a sua transformação como um processo evolutivo.
— Numa carreira você se apresenta de uma forma e vai se modificando. Hoje estou com 49 anos e sinto que está mais fácil fazer música, acho que já estou bastante curtido pela vida. O público já se acostumou com as minhas nuances. Quando dizem que estou mais palatável, considero um sinal de que eu estou evoluindo — resumiu, ao atender a reportagem por telefone na última quarta-feira.
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O show no estacionamento da UCS terá principalmente o repertório do sexto álbum solo, Ottomatopeia (2017), lançado cinco anos após The Moon 1111 e oito depois do fundamental Certa Manhã Acordei de Sonhos Intranquilos, obra-prima cujas letras transbordam a fossa após o fim do casamento com a atriz Alessandra Negrini, em 2007. Neste trabalho mais recente, Otto se afirma como crítico contundente da desigualdade social ("passei três anos analisando para onde o mundo ia com essa fascistada toda", revela) e compositor de versos que se lê como poesia e rapidamente se espalham como mantras nas redes sociais. Ao mesmo tempo, ressignifica-se como cantor mais próximo de suas influências mais remotas, como Odair José e Roberta Miranda, com quem canta em dueto na faixa Meu Dengo.
— Sou um cara que nunca teve um estilo definido. Se eu disser pra você que só ouvi música internacional cabeça, vou estar mentindo. Vim do interior do Pernambuco e brinquei em todos os ambientes, da festa de rock ao baile do interior. Se não fosse isso, seria um cabeça dura. Acho a Roberta Miranda uma intérprete e compositora incrível, que conhece o Brasil todo, assim como o Andreas Kisser (do Sepultura, outro convidado do álbum) é um puta guitarrista. Na minha colcha de retalhos brasileira tem de tudo, e essa música popular traz de volta a minha infância. Talvez com o tempo eu tenha escutado um pouco menos, mas sem nunca deixar de gostar — avalia.
Em meio ao elenco de bandas e artistas independentes da sétima edição do FBMR, o pernambucano elogia o momento atual desta cena no país. Considera que é deste universo no qual está inserido desde o início dos anos 90 que têm saído o Brasil produz de melhor em música atualmente:
— Tudo o que é feito comercialmente hoje em dia é um saco, é muito igual. A diversidade e o novo cabem muito ao independente. É uma cena forte no mundo todo, que se expande baseada na troca: os shows, as viagens. Não tem mais os padroeiros que representavam as gravadoras. Acho que ser independente ajuda o músico a estar mais preparado.
Acompanhado da instrumentação completa de Ottomatopeia, com baixo, bateria, percussão, guitarra e teclado, Otto celebra a oportunidade de voltar ao Sul. Especialmente por se tratar de um evento que promove a ocupação das ruas pela arte.
— Este é um show que a turma tem se divertido e gostado bastante. Faz muito tempo que não vou ao Sul e agora esse novo disco está me dando a oportunidade. Ser convidado para um festival de rua e que celebra a música independente me deixou muito honrado. Quando falam em festival de música de rua, me vem essa ideia de resistência, de afinidade política, de visão social bem parecida. O que eu mais gosto é isso de ver a turma toda reunida e eu estar junto. É da rua que saem a liberdade, os nossos protestos e as poesias mais lindas — filosofa.
AGENDE-SE
O quê: últimos dias do Festival Brasileiro de Música de Rua.
Quando: sábado e domingo, a partir das 14h30min.
Onde: estacionamento da Universidade de Caxias do Sul (UCS).
Quanto: entrada gratuita.
Programação
Sábado
14h30min: Viv Limberger (Caxias do Sul)
15h: Laura Murcia (México)
15h30min: Magabarat (Caxias do Sul)
16h: Yangos (Caxias do Sul)
16h30min: Vitor Ramil (RS)
17h30min: Avuô (PB)
18h10min: Lucas Estrela (PA)
19h: Cuscobayo (Caxias do Sul)
Domingo
15h: Araucana (RS)
15h30min: Hique Gomez (RS)
16h10min: Melanie Lusraschi (Uruguai)
17h: Banda do Cristóvão
17h20min: Baque dos Bugres (Caxias do Sul)
17h40min: Catavento (Caxias do Sul)
18h20min: Otto (PE)