Neste domingo, 7 de janeiro comemora-se o Dia do Leitor, e o Almanaque resolveu trazer algumas dicas para quem quer colocar a leitura em dia. Afinal, janeiro é também mês de férias, e com elas vem o tão precioso tempo livre — e a falta de tempo é o principal motivo para aqueles que gostam de ler lerem pouco, segundo a 4ª edição da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil (supera em seis vezes o preço do livro).
Então, vale aproveitar a "folga" e levar livro para a praia, para o interior, para aqueles momentos em que estiver descansando na rede, pegando um bronzeado na areia, viajando de ônibus/avião... Nestas sugestões que selecionamos para você, tem best-seller, obra premiada e lançamento de autor local.
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Ah: os preços indicados são os de tabela, mas se pesquisar, você pode conseguir bons descontos. Confira as dicas, e lembre-se de que estas são apenas sugestões — o que vale é ler.
Outra sugestão é aproveitar as férias e se associar à Biblioteca Municipal Dr. Demetrio Niederauer, de Caxias do Sul, que fica junto à Casa da Cultura, na Rua Dr. Montaury, 1.333, no Centro. Para se associar, basta apresentar documento com foto e comprovante de residência e pagar uma taxa de R$ 10, que pode ser substituída pela doação de um livro. A biblioteca abre das 8h às 18h, de segunda a sexta, sem fechar ao meio-dia.
Vamos às dicas:
Em Águas Sombrias
Mesmo que você não reconheça de imediato o nome da autora, Paula Hawkins, provavelmente já ouviu falar de seu livro anterior, o best-seller A Garota no Trem, que virou filme com Emily Blunt em 2016. Pois seu novo livro, Em Águas Sombrias (Record, 364págs., R$ 42,90), leva ao leitor o mesmo clima de suspense e de incerteza.
Um ponto interessante é que a trama — que envolve a morte suspeita de Nel Abbot, uma mãe solteira cujo corpo é encontrado no rio que corta a cidade — é contada de dez diferentes pontos de vista. Cinco deles são em primeira pessoa: os de Jules, a irmã que não falava com ela há anos; de Lena, a filha adolescente de Nel; de Sean, o policial encarregado de chefiar a investigação sobre a morte; de Erin, a outra detetive; e de Josh, irmão de Katie, jovem que morreu meses antes no mesmo local, conhecido como Poço dos Afogamentos. Os outros cinco, em terceira pessoa, são de Louise, mãe de Katie; de Patrick, pai de Sean; de Mark, um professor da escola; de Helen, mulher de Sean; e de Nickie, uma vidente considerada louca.
Por vezes, o relato de um e outro não fecham, e a impressão inicial do leitor é de que foi um deslize da autora. Não é o caso. Como já entrega uma das epígrafes do livro, a trama trabalha com segredos do passado e com a noção de que a memória, por vezes, nos trai, nos confunde. Essa característica amplia o suspense: será que os fatos, do presente e do passado, aconteceram realmente como estão sendo contados?
A Resistência
Aquela velha advertência que vinha impressa na folha de rosto dos livros décadas atrás, de que "esta é uma obra de ficção; qualquer semelhança com pessoas ou fatos reais é mera coincidência", definitivamente não se aplica ao romance A Resistência (Companhia das Letras, 139págs., R$ 37,90), de Julián Fuks. Sim, trata-se de ficção, mas mais precisamente de autoficção, gênero bem em voga na atualidade e em que as linhas entre o real/autobiográfico e o "inventado" por vezes são tão tênues que somem da vista do leitor.
Laureado com vários prêmios — Livro do Ano de Ficção no Jabuti 2016, 2º lugar no Oceanos 2016 e José Saramago 2017 —, o romance tem como narrador o filho de um casal de intelectuais argentinos que se exilaram no Brasil durante a ditadura naquele país. Esse é o primeiro ponto em comum com a biografia de Fuks, mas não o único. Logo na primeira linha da história, o narrador anuncia: "Meu irmão é adotado, mas não posso e não quero dizer que meu irmão é adotado". Isso também é transplantado da vida real, pois o autor, nascido em São Paulo, tem um irmão mais velho, adotado pelos pais antes de deixarem a Argentina.
Assim, nada mais natural do que ver nos relatos do livro um enredado de memórias reais, que remetem a relações familiares, política, violência e identidade, passando ainda pelas Mães da Praça de Maio, pela resistência à ditadura e pela sensação de pertencimento (ou não pertencimento).
Eu Sei Onde Você Está
Thrillers costumam ser vistos como mero entretenimento, e não há nada errado em ler um livro apenas para espairecer. Mas há aqueles que vão além e, sem deixar de ser uma leitura instigante, tocam também num tema importante e delicado. É o caso de Eu Sei Onde Você Está (Intrínseca, 304págs., R$ 44,90), de Claire Kendall, que traça o retrato de uma mulher perseguida por um admirador não desejado.
Não importa onde vá ou o que faça, Clarissa, a protagonista, sempre esbarra em Rafe, um colega de trabalho que parece sempre saber onde ela estará. Ele também a sufoca com telefonemas, está sempre do outro lado da rua quando ela sai de casa, cumula-a de presentes que ela não quer. Sem conseguir levar uma vida normal, ela pensa em denunciá-lo à polícia, mas esbarra na falta de provas. A única saída parece ser participar de um júri, que a manterá afastada do trabalho por sete semanas — mas nem isso dá certo.
Em conformidade com o título original em inglês, The Book of You, acompanhamos parte da história como se estivéssemos lendo um diário no qual Clarissa relata tudo o que acontece, sempre se dirigindo ao próprio perseguidor (a intenção é manter um registro das situações ameaçadoras, para ser usado como prova). A outra parte é contada por um narrador impessoal, distanciado, contextualizando tudo o que não se refere a Rafe.
E para quem gostar da história, o segundo livro de Claire Kendal, The Second Sister, acaba de ser lançado, mas por enquanto ainda não tem tradução no Brasil.
Correr com Rinocerontes
O passado é presença constante no romance Correr com Rinocerontes (Não Editora, 288págs., R$ 39,90), de Cristiano Baldi, lançado via Financiarte. A trama, que vai e vem no tempo, é narrada em primeira pessoa pelo protagonista, um jovem que cursa mestrado em São Paulo e que, já no início da trama, precisa voltar com urgência a Porto Alegre, devido a um incidente envolvendo sua mãe (o que só vamos saber bem mais adiante na história).
Os fatos presentes, embora marcantes, não o são mais do que aqueles do passado, que vão sendo aos poucos desvelados enquanto o retorno à capital gaúcha se transforma num retorno a memórias não muito agradáveis. Desde as primeiras páginas o leitor toma consciência de que algo muito grave aconteceu, embora não fique claro o que é. Ao mesmo tempo, é possível ir construindo uma imagem do protagonista, que não tem uma visão muito abonadora de si próprio — além de relatar as desculpas esfarrapadas que usa para se eximir do contato com a família, ainda afirma que "um bom infortúnio coloca a vida em perspectiva e que às vezes ser um canalha é a única opção". Mais adiante, se diz um "sujeito refratário a qualquer convocação da dignidade". Talvez não o seja, mas, passivo, apenas vai levando a vida para ver no que vai dar.
A história também envolve o avô intelectual, a mãe abnegada, o irmão com problemas mentais e uma antiga colega que despertava os hormônios do narrador (e que estava com ele quando do primeiro ato trágico de sua vida). Há ainda altas doses de sarcasmo e autoironia, que servem para mascarar angústias e traumas profundos.