Um dos principais fenômenos recentes da música brasileira, a cantora paulista Liniker desembarca em Caxias do Sul acompanhada da banda Os Caramelows – que a acompanha desde 2015 – para show da turnê Remonta (nome do álbum de estreia, lançado no ano passado). Parte do projeto Noites Morrostock, a apresentação será no Shiva Music Club, numa noite que terá os caxienses da Cuscobayo como anfitriões.
Negra, trans e travesti, em entrevista ao Pioneiro Liniker frisou que a ascensão aparentemente meteórica (fáceis de medir em 10 milhões de visualizações de um único vídeo no youtube, o convite para o próximo Rock In Rio ou a turnê recente pela Europa) esconde um processo árduo que iniciou na adolescência e envolve muitas lutas, intrínsecas às bandeiras da música independente e da diversidade de gênero que ergue.
Aos 22 anos, trata-se de uma artista que vive seu discurso com a mesma intensidade que canta o repertório cheio de influências do soul e do R&B, com potência e versatilidade impressionantes. Confira a seguir a entrevista:
Pioneiro: O que os caxienses podem esperar do teu show?
Liniker: O repertório é o nosso disco Remonta, lançado no ano passado. É um disco bem livre, e quando a gente gravou queria muito que o show fosse uma coisa pra além do disco. É um show dançante, poético, teatral. A gente está levando um espetáculo pra Caxias.
Quais foram as tuas principais influências como cantora?
Eu sempre gostei de ouvir cantoras que cantavam com verdade, que mudaram minha vida depois de ouvir elas cantar. Uma das minhas maiores referências é a Etta James, que pra mim é uma das maiores cantoras do mundo. Ver ela cantar com toda aquela ousadia, mostrando que era a dona do palco e se empoderando através da canção. Outra grande referência é a Elza Soares, uma cantora que está ultrapassando o tempo, conseguindo se ressignificar depois de tudo o que ela já fez de tão importante. Poder ser contemporânea e ouvi-la de perto é um grande privilégio.
Tu tiveste uma ascensão bastante rápida. Como tem sido lidar com o sucesso?Acho que não foi rápido, não. Pode ter sido rápido no sentido de acontecimento para o público, mas antes de tudo acontecer, a banda e eu já estávamos trabalhando muito. Eu componho desde os 16 anos. Foi uma coisa que aconteceu, sim, mas acho que rápido, não. Senão a gente torna tudo muito fácil e não é, sabe? Ainda mais quando você faz música popular brasileira independente; quando você é uma mulher trans; uma mulher negra; uma pessoa periférica; acho muito importante falar do processo desde o início e percebê-lo como um trabalho.
Qual a importância da reverberação do teu trabalho para o empoderamento das minorias?
Esse discurso sou eu. Eu sou a Liniker, uma mulher trans, travesti, preta e meu discurso é o que eu sou e respiro no dia a dia. Quando a gente fala de representatividade no Brasil, é sobre nunca ter se visto em lugar nenhum. Chegar hoje com toda a potência e a força do meu trabalho e saber que eu me vejo nas pessoas, e elas também se veem em mim, é um processo que mostra que a representatividade está acontecendo, que a gente está alcançando novos espaços, embora ainda seja pouco.
Muitas pessoas conhecem a pessoa Liniker antes da artista. Isso te incomoda?
Às vezes as pessoas esquecem que eu sou uma cantora e tenho o meu trabalho, que é a minha música. Queria falar mais sobre música e menos sobre a violência no Brasil ou o processo da minha transição. Poder abordar minha poesia, meu processo criativo, o que estou escutando, minhas parcerias.
Para onde pretendes levar tua carreira nos próximos anos?
Eu tenho vivido meus momentos, sendo livre na minha arte e na construção de ser quem eu sou. Poder reinventar minha poesia, colocar o que eu acredito no papel e na música, ter uma interação muito forte com a banda, pra mim é o que mais vale. Uma questão legal é não ter pressa, nem uma urgência que faça passar por cima dos meus processos criativos.