O longa "Como Nossos Pais", de Laís Bodanzky, foi o principal premiado da noite de sábado durante o encerramento 45° Festival de Cinema de Gramado. A obra levou seis significativos kikitos para casa: melhor filme, direção, atriz (Maria Ribeiro), ator (Paulo Vilhena), atriz coadjuvante (Clarisse Abujamra) e montagem (Rodrigo Menecucci). A escolha avaliza o discurso feminino do longa, como a própria diretora fez questão de destacar fazendo um paralelo com a participação das mulheres nas cabeças de chave do cinema brasileiro:
– Eu sou mulher, sou cineasta e uma das poucas mulheres na direção do nosso cinema. Eu não tinha me dado conta disso. Nós somos poucas na direção e no roteiro que é justamente o espaço do discurso, onde a gente coloca o nosso ponto de vista, defende uma ideia e por isso dá tanto frio na barriga, a gente se coloca lá. Essa consciência de que nós somos poucas é muito recente na minha vida, eu acho que é porque eu faço parte de um grupo de mulheres do audiovisual que resolveu parar para pensar onde que acontece esse filtro, por que só 15% da indústria do audiovisual no roteiro e na direção são mulheres? –indagou.
A diretora lembrou ainda da sororidade como uma evolução de nossos tempos, citou o movimento "Mexeu com Uma, Mexeu com Todas" e firmou compromisso com um cinema que inclua mais as mulheres.
– Vamos fazer filme e vamos botar mais mulher para dentro, vamos fazer mais filmes do ponto de vista das mulheres. Então, eu tenho muito orgulho de estar aqui como cineasta e como mulher do cinema brasileiro, porque eu sei que represento e estimulo muitas outras que estão vindo – apontou, citando ainda a importância da chegada das mulheres negras à direção de longas.
O ponto de vista feminino, aliás, foi uma questão importante no trabalho de curadoria desta edição do festival. Outro longa bem premiado da mostra brasileira, As Duas Irenes também enfatiza a parceria inesperada que surge entre duas meninas filhas do mesmo pai, porém pertencentes a diferentes universos. O trabalho foi premiado com melhor roteiro, ator coadjuvante (Marco Ricca), direção de arte e júri da crítica. Já a poesia do Pela Janela ou a ousadia de Vergel, ambos também protagonizados por mulheres, não foram contempladas pelo júri.
Único representante gaúcho na mostra de longas brasileiros, Bio, de Carlos Gerbase, levou para casa os kikitos de desenho de som e júri popular. O prêmio especial do júri concedeu ainda condecoração ao diretor Carlos Gerbase, pela condução dos 39 atores e atrizes que integram o elenco do filme.
Ainda dando vazão às mulheres no cinema, o premiado como melhor filme latino, Sinfonia para Ana, também é conduzido por uma personagem feminina e carrega ainda a força política de retratar as obscuridades da ditadura argentina. Além de melhor filme, a obra levou melhor fotografia.
– Esse é um filme que traz para o presente um momento da nossa história e constrói uma ponte entre os jovens dos anos 1970 e os jovens de agora. Mais que nunca, na Argentina, não queremos viver mais momentos de obscuridade, de dor e repressão. Queremos viver momentos de diversidade, de integração, de pluralidade de vozes, não queremos mais desaparecidos. Por isso, não podemos ter hoje um desaparecido como Santiago Maldonado – criticou Virna Molina, responsável pela direção ao lado de Ernesto Ardito, citando o primeiro desaparecido político do governo de Maurício Macri na Argentina.
A noite ainda teve bastante diversidade de representação na escolha dos curtas premiados. O documentário A Gis, sensível registro sobre a trajetória de uma transexual brasileira que foi brutalmente assassinada em Portugal, levou o kikito de melhor curta brasileiro, montagem e júri popular. Já o filme Tailor, protagonizado por personagens trans e dirigido por um cineasta trans, levou importantes prêmios como direção (Calí dos Anjos) e o Prêmio Canada 150 de Jovens Cineastas, que concede ao diretor uma bolsa de estudos no Canadá. Cabelo Bom, que reflete sobre a relação de mulheres negras com seus cabelos, e O Quebra-Cabeça de Sara, protagonizado por uma empregada doméstica, também foram premiados, contribuindo para o destaque da pluralidade de representação no cinema.
Veja a lista completa de premiados:
LONGAS-METRAGENS BRASILEIROS
Melhor Filme: Como Nossos Pais, de Laís Bodanzky
Melhor Direção: Laís Bodanzky, por Como Nossos Pais
Melhor Atriz: Maria Ribeiro, por Como Nossos Pais
Melhor Ator: Paulo Vilhena, por Como Nossos Pais
Melhor Atriz Coadjuvante: Clarisse Abujamra, por Como Nossos Pais
Melhor Ator Coadjuvante: Marco Ricca, por As Duas Irenes
Melhor Roteiro: Fábio Meira, por As Duas Irenes
Melhor Fotografia: Fabrício Tadeu, por O Matador
Melhor Montagem: Rodrigo Menecucci, por Como Nossos Pais
Melhor Trilha Musical: Ed Côrtes, por O Matador
Melhor Direção de Arte: Fernanda Carlucci, por As Duas Irenes
Melhor Desenho de Som: Augusto Stern e Fernando Efron, por Bio
Melhor Filme - Júri Popular: Bio, de Carlos Gerbase
Melhor Filme - Júri da Crítica: As Duas Irenes, de Fabio Meira
Prêmio Especial do Júri: Carlos Gerbase, pela direção dos 39 atores e atrizes em Bio
Prêmio Especial do Júri – Troféu Cidade de Gramado: Paulo Betti e Eliane Giardini, pela contribuição à arte dramática no teatro, televisão e cinema brasileiros
LONGAS-METRAGENS ESTRANGEIROS
Melhor Filme: Sinfonia Para Ana, de Virna Molina e Ernesto Ardito
Melhor Direção: Federico Godfrid, por Pinamar
Melhor Atriz: Katerina D’Onofrio, por La Ultima Tarde
Melhor Ator: Juan Grandinetti e Agustín Pardella, por “Pinamar”
Melhor Roteiro: Joel Calero, por La Ultima Tarde
Melhor Fotografia: Fernando Molina, por Sinfonia Para Ana
Melhor Filme - Júri Popular: Mirando al Cielo, de Guzman García
Melhor Filme - Júri da Crítica: Pinamar, de Federico Godfrid
Prêmio Especial do Júri: Los Niños, de Maite Alberdi
CURTAS-METRAGENS BRASILEIROS
Melhor Filme: A Gis, de Thiago Carvalhaes
Melhor Direção: Calí dos Anjos, por Tailor
Melhor Atriz: Sofia Brandão, por O Espírito do Bosque
Melhor Ator: Nando Cunha, por Telentrega
Melhor Roteiro: Carolina Markowicz, por Postergados
Melhor Fotografia: Pedro Rocha, por Telentrega
Melhor Montagem: Beatriz Pomar, por A Gis
Melhor Trilha Musical: Dênio de Paula, por O Violeiro Fantasma
Melhor Direção de Arte: Wesley Rodrigues, por O Violeiro Fantasma
Melhor Desenho de Som: Fernando Henna e Daniel Turini, por Caminho dos Gigantes
Melhor Filme - Júri Popular: A Gis, de Thiago Carvalhaes
Melhor Filme - Júri da Crítica: O Quebra-Cabeça de Sara, de Allan Ribeiro
Prêmio Canada 150 de Jovens Cineastas: Calí dos Anjos (Tailor)
Prêmio Canal Brasil de Curtas: O Quebra-Cabeça de Sara, de Allan Ribeiro
Prêmio Especial do Júri: Cabelo Bom, de Swahili Vidal e Claudia Alves