Se alguém perguntar para uma criança da cidade grande o que é um capitel, é bem provável que ela não saiba responder. Mas em Antônio Prado os pequenos estão bem ligados nessa e em outras questões que envolvem patrimônio histórico. Não só porque a cidade serrana é praticamente a capital dos capitéis - são 43 deles numa área de 348 quilômetros quadrados -, mas porque lá as escolas participam de um importante projeto de preservação da memória. Desde 2008, oito instituições de ensino da cidade incentivam a gurizada a reconhecer os prédios tombados de Antônio Prado por meio da iniciativa Nosso Patrimônio: Nossa História. A partir de 2016, os capitéis passam a integrar essa ideia, no formato de maquetes para recortar e montar.
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Os capitéis são pequenos oratórios, geralmente construídos na beira das estradas do interior como forma de devoção a algum santo, por graças alcançadas ou promessas feitas. O pesquisador pradense Fernando Roveda percorre o interior de Antônio Prado desde 1995 buscando desvendar a memória viva dos capitéis. Ele é o idealizador do referido projeto, justamente com o objetivo de não deixar morrer a tradição que foi para a cidade junto com os italianos, há 140 anos.
- Esse é um projeto que tem ligação direta com a história da imigração. A religiosidade, junto com a terra e o trabalho, forma o tripé de sustentação dos imigrantes aqui - aponta Roveda, que transformou a paixão pelos capitéis em livro, Caminhos da Fé (editado pela segunda vez em 2010), e documentário, Se Milagres Desejais (rodado em 2007 com direção de André Costantin e suporte do Edital de Apoio à Produção de Documentários Etnográficos sobre o Patrimônio Cultural Imaterial).
A partir de 2016, estudantes de Antônio Prado com idades entre oito e nove anos vão interagir com a cultura dos capitéis por meio de kits de recortar, pintar, colar e montar. Cada escola receberá as reproduções em papel dos 43 capitéis pradenses - ao todo, serão mais de 12 mil kits. Os alunos são incentivados a montar as maquetes e, claro, também aprendem sobre a história de cada um desses pequenos santuários.
- O caminho nas escolas é contínuo, a ideia é que as crianças entendam por que devem preservar. Quando eles (estudantes) montam uma maquete, logo querem ver aquele lugar de perto, ao vivo. Assim aconteceu com o projeto das maquetes das casas tombadas, provocava uma curiosidade sobre a história. Além disso, às vezes, as crianças levam as maquetes para montar em casa, envolvendo pai, mãe, nonno, nonna, o que agrega ainda mais informações ao projeto - explica Roveda.
A professora aposentada Norci Bortolotto Scopel era diretora da escola municipal Nossa Senhora Aparecida quando a primeira etapa do projeto (com os kits das casas tombadas) foi implantada como projeto piloto, em 2008.
- Os alunos sempre responderam muito bem, a criança tem um encantamento fácil, quando eles têm uma coisa palpável em mãos fica muito mais fácil de entender a história, que é tão viva - diz ela.
A professora do curso de Arquitetura da UCS Terezinha Buchebuan trabalhou por cinco anos no Escritório Técnico do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) de Antônio Prado. Por conta dessa aproximação com a cidade, acabou por dedicar sua dissertação de mestrado em Letras, Cultura e Regionalidade aos velhos casarões da cidade. Para ela, o envolvimento das crianças com a questão do patrimônio é primordial para a perpetuação da identidade.
- É de vital importância que esse temas sejam trabalhados com crianças, é a garantia de que os bens culturais continuarão sendo preservados, não só os materiais, tangíveis, como os imateriais, intangíveis - diz.
A pesquisadora cita Aloísio Magalhães, que foi presidente do Iphan na década de 1980, para sintetizar a importância da educação patrimonial: "só se preserva aquilo que se ama, só se ama aquilo que se conhece".
Memória para cortar e colar
Projeto incentiva crianças a montarem maquetes dos capitéis de Antônio Prado
Desde 2008, oito instituições de ensino participam do Nosso Patrimônio: Nossa História
Siliane Vieira
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