Não são apenas os seus 14,3 mil funcionários ao redor do mundo que comemoram. Caxias do Sul e seus cerca de 500 mil habitantes também aplaudem. E agradecem. Pois são 70 anos em que a Marcopolo imprime sua velocidade à história da cidade. E não só: do país e do mundo.
Sete décadas em que a maior fabricante de carrocerias de ônibus da América Latina gera emprego, receita e desenvolvimento. Não é exagero dizer que, sem o conglomerado fabril, dificilmente o município teria se projetado com essa intensidade.
Tantos empregos assim – só na cidade, são 8 mil – refletem em dinheiro irrigado na economia e em mais faturamento e vagas criadas, respingando como uma engrenagem em todos os setores.
Pudera: em 2018, a companhia alcançou receita líquida consolidada de R$ 4,197 bilhões, avanço de 45,9%, voltando a integrar o restrito time das organizações brasileiras com faturamento acima de US$ 1 bilhão. Tem capacidade de produzir 240 ônibus por dia.
Portanto, o tamanho da Marcopolo também dimensiona o peso da responsabilidade de conduzir uma marca que leva o nome de Caxias e o orgulho de seus habitantes ao mundo.
Quem sabe do desafio de levar adiante esse legado, tão bem sedimentado por Paulo Bellini, um dos fundadores da Marcopolo, falecido em junho de 2017, é seu filho e sucessor de comando: James Eduardo Bellini, que desde 1º de maio acumula os cargos de diretor geral (CEO) e presidente do Conselho de Administração da fabricante.
– Por um lado, muito orgulho e, por outro, o enorme peso da responsabilidade de dar continuidade a esse indiscutível legado – define.
A seguir, entrevista concedida por James ao Pioneiro.
Com a saída de Francisco Gomes Neto, como foi o desafio de acumular as funções de CEO e de presidente do Conselho de Administração?
Na verdade, desde que voltei à ativa, em meados de 2017, sempre acompanhei muito de perto o dia a dia da empresa. Quando assumi a presidência do Conselho de Administração, em março de 2018, definimos uma mudança no modelo de governança da empresa. Adotamos a figura do “Executive Chairman”, um modelo usado por muitas empresas de sucesso no mundo todo, que permite mais liberdade ao presidente do Conselho para circular pela companhia e mergulhar mais a fundo na operação, tendo livre acesso a qualquer informação. Esse novo modelo de governança, somado aos mais de 14 anos atuando como representante comercial e executivo da empresa, no período de 1992 a 2006, me deixou bastante confortável para acumular as funções de CEO e presidente do Conselho de Administração da Marcopolo.
Como é seguir o legado deixado por seu pai, Paulo Bellini, um dos fundadores da Marcopolo?
Creio que os principais ensinamentos deixados pelo pai estão relacionados à valorização das pessoas. Ele entendia como ninguém a relação indiscutível que existe entre pessoas motivadas e sucesso. Se as pessoas saírem de casa para trabalhar por pura obrigação, certamente teremos uma empresa medíocre. No entanto, se as pessoas vierem trabalhar felizes, motivadas e se sentindo parte da empresa, com certeza o sucesso estará garantido. É o que sempre aconteceu e ainda acontece na Marcopolo.
A sua família edificou uma empresa que se perpetuou e chega forte aos 70 anos, conhecida no mundo. Qual a responsabilidade?
Não é apenas uma questão de manter as coisas como estão, isso até seria relativamente fácil. O difícil será reinventar-se para poder crescer nesses novos e desafiadores tempos de inovação. Os novos modelos de negócios disruptivos que estão surgindo todos os dias ameaçam a própria existência dos negócios tradicionais.
Qual a previsão de faturamento da empresa em 2019?
Na verdade, em termos de mercado, não estamos vislumbrando aquela retomada na atividade econômica do país que estava prevista no final do ano passado. O que se vê, na realidade, no setor de transporte de passageiros é um nível de atividade bastante conservador, sem grandes expectativas por parte dos empresários em relação a crescimento para o segundo semestre deste ano. No fretamento, por exemplo, as compras ainda estão represadas por conta de uma indefinição jurídica na questão da obrigatoriedade do elevador para deficientes físicos. Tudo isso somado à crise na Argentina, um dos nossos principais mercados de exportação, não nos permite prever um crescimento significativo no faturamento em relação a 2018.No entanto, estamos fazendo nosso dever de casa e o que estamos buscando é um incremento na rentabilidade da empresa, por conta de uma gestão focada na melhoria da eficiência dos processos, principalmente em algumas áreas como produção, engenharia e logística.
Qual a equipe atual de funcionários?
Nosso quadro atual é de 14,3 mil colaboradores somando as fábricas do mundo todo. São 9,8 mil pessoas no Brasil e, dessas, 8,07 mil em Caxias. Estamos trabalhando nesse momento com um cenário de manutenção de quadro de pessoal, utilizando recursos como férias e banco de horas para equilibrar eventuais momentos de produção mais baixa. Não deveremos ter contratações pelo menos nos próximos três meses, mas já conseguimos enxergar um quarto trimestre mais promissor com uma carteira de pedidos bastante positiva.
A crise econômica dos últimos anos deixou qual legado?
Essa crise foi uma das mais duradouras e talvez uma das mais severas que já enfrentamos nesses 70 anos de vida. Porém, como tudo tem o seu lado positivo, certamente aprendemos muito com ela. Um dos principais antídotos para superar esse momento foi a criatividade do nosso pessoal, que entendeu a gravidade da situação e não se acomodou simplesmente aceitando a realidade. Buscamos novos negócios no Exterior, criamos oportunidades em novos mercados e fundamentalmente nos reinventamos internamente, trabalhando fortemente na melhoria dos processos. Com isso, conseguimos atravessar sem maiores danos esse difícil momento de grande turbulência na história da empresa.
O momento é de otimismo ou a cautela dita as regras?
O momento demanda uma certa cautela. Não estamos pensando em enxugamento de quadro e seguimos otimistas em relação a uma retomada econômica a partir do último trimestre do ano. Mas temos de ser cuidadosos nesse momento de transição para não comprometer os resultados do ano.
O que a Marcopolo tem a festejar nessas sete décadas?
Em 70 anos de história tivemos muitos momentos marcantes e decisivos que contribuíram para a Marcopolo ser o que é hoje. Entre os mais importantes, destaco a primeira exportação da empresa para o Uruguai, em 1961, que deu início à cultura da exportação. Depois disso, acabamos exportando ônibus para mais de 100 países, sendo que hoje o mercado externo tem uma participação fundamental no resultado da empresa. Outro momento decisivo foi a viagem do Seu Paulo Bellini para o Japão, que deu origem à filosofia que até hoje, revitalizada, faz parte do DNA da empresa. Destaco também a primeira parceria concretizada no México com a empresa Dina, que deu origem à Polomex que, além de ser muito lucrativa, serviu de base para a internacionalização da Marcopolo, hoje com fábricas em nove países.
Quais os maiores desafios?
Os principais desafios da Marcopolo nos próximos anos, sem sombra de dúvida, estarão relacionados à busca de seu espaço no mundo da mobilidade. Precisamos encontrar a forma de fazer uma transição suave entre o modelo de negócio atual e o novo modelo de negócio que certamente se consolidará nos próximos anos. O grande desafio será fazer essa transição sem perder a nossa essência.
Há planos de expansão em fábricas e mercados?
Temos forte presença nos principais mercados mundiais, no entanto, ainda temos ajustes a fazer em alguns deles, como Índia e, principalmente, China. Em termos de novos mercados, estudamos alternativas nos EUA e na Europa, mercados onde historicamente não conseguimos nos consolidar.
Defina, na sua visão, a Marcopolo para Caxias do Sul?
Creio que a Marcopolo é um motivo de muito orgulho para a cidade. Não apenas pelo que ela representa em termos de geração de empregos diretos e indiretos, mas principalmente por ter no seu DNA a busca pelo bem-estar social, preocupando-se com a comunidade e contribuindo diariamente para fazer a vida de muita gente um pouco mais digna.