Guardo uma certa compaixão silenciosa para com as pessoas que sonham com o possível, aqueles que buscam a ética, o legítimo, o próximo. Os que sonham o grandioso, o impossível, o grande feito, a grande revolução ou são malucos, completamente fora do contexto social ou são felizes, uma vez que a realidade não os toca. Quem sonha com o possível, com aquilo que está perto e que demanda de um pouco mais de trabalho, de leitura, de consciência, de tempo, de compreensão, esses têm a real possibilidade da desilusão. Eu não me importo com as viagens para o estrangeiro que fulano ou sicrana fez, se saiu na coluna social, se o espumante na festa tinha uma ou duas fermentações, mas me dói saber que o tio Berto, na altura de seus 70 anos ainda acorda todo dia às 7 horas da manhã para consertar geladeiras e máquina de lavar roupas; que a dona Nena trabalhou uma vida toda como empregada doméstica e que além de não ter carteira assinada , envelheceu e tem o corpo todo cheio de problemas por conta do serviço pesado; que o Gringo, um baita pedreiro, teve de parar de trabalhar por que uma doença lhe levou embora a chance de terminar de construir a própria casa.
Opinião
Adriana Antunes: o possível
Nunca foi crime sonhar com a possibilidade da vida e de repente ela se torna insuportável
Adriana Antunes
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