Passo Fundo tem a terceira maior taxa de estupros de vulnerável entre as cidades brasileiras com mais de 100 mil habitantes. Os dados são de um levantamento inédito publicado no Anuário Brasileiro de Segurança Pública.
Conforme o relatório, foram 312 casos registrados em 2023. O município gaúcho só fica atrás das cidades de Dourados (MS), com uma taxa de 343 estupros, e de Sorriso (MT), onde foram 326 casos.
O crime se configura pela violação sexual de vítimas de até 13 anos de idade ou pessoas impedidas de consentir livremente, seja por enfermidade ou deficiência mental.
No ranking das 50 cidades brasileiros com o maior número de estupros notificados, Passo Fundo aparece em 14º lugar. Já no recorte estadual, o município do norte gaúcho é o que mais registra crimes do tipo, à frente de Viamão (80), Uruguaiana e Alvorada (72), e Gravataí (71).
Obrigatoriedade de notificação contribui para índice
O índice tem relação com a rede de combate a esses crimes que atua no município, disse Josiane Chapuis, coordenadora do Comitê de Gestão Colegiada da Rede de Cuidado e Proteção Social das Crianças e Adolescentes Vítimas ou Testemunhas de Violência de Passo Fundo.
Segundo ela, a obrigatoriedade da notificação dos casos contribui para subir os números, uma vez que o crime de violência sexual é um dos mais subnotificados.
— Esse é um assunto pouco falado e denunciado, às vezes fica invisível. Nós trabalhamos de forma articulada e incentivamos a comunidade a denunciar. Além disso, escolas e outros locais, públicos ou privados, que possuem crianças e adolescentes, são obrigados a informar situações suspeitas — explica.
A notificação é feita a partir de um formulário padrão. Quando um professor, por exemplo, identifica uma suspeita de criança que está sofrendo violência, deve preencher o documento e acionar imediatamente o Conselho Tutelar. A partir daí, a Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA) também passa a investigar o caso.
No entanto, nem sempre é tão simples. A questão cultural pesa e, segundo a especialista, com núcleos familiares pouco informados sobre o que é a violência e como agir, o problema ganha espaço, principalmente em locais de vulnerabilidade social — mas não só ali.
— A gente vive em uma sociedade patriarcal, com famílias que vêm de um pano de fundo sem educação sexual, o que facilita os crimes e dificulta a denúncia — acrescenta.
Qual o perfil das vítimas
Meninas e mulheres são a maioria das vítimas. Elas representam 88,2% do casos de estupro e estupro de vulnerável. O sexo masculino contabiliza 11,8% do total.
Em relação a faixa etária, a maior parcela entre quem sofre os abusos são crianças e adolescentes. A maioria acontece dos zero aos 17 anos, um percentual de 77,6% do total. A idade dos 10 aos 13 anos representa 32,5% dos casos.
Os agressores, por sua vez, são quase sempre familiares das vítimas até os 13 anos — eles representam 64% dos criminosos. Já 22,4% são conhecidos. A partir dos 14 anos, o perfil do agressor muda e os parceiros das vítimas passam a ser 28,1% dos agressores, contra 31,2% de familiares.
— A maioria dos agressores são pessoas do círculo de confiança da criança ou adolescente. Hoje não podemos só considerar que essas agressões ocorrem em núcleo de vulnerabilidade social, apesar dos índices maiores de prostituição de menores, por exemplo, ocorrerem mais nas regiões periféricas. Mas é um problema que perpassa todas as classes sociais — argumenta Josiane.
Como prevenir?
Para o coordenador da microrregião I do Conselho Tutelar de Passo Fundo, Alisson Pansera, a prevenção começa pela educação sexual desde a primeira infância, a fim de ensinar a identificar situações de abuso.
— Esse importante papel pedagógico deve ser desenvolvido dentro das unidades de ensino, por profissionais qualificados para abordar essa demanda — disse.
O coordenador destaca, ainda, que há demanda da criação de um terceiro conselho na cidade. Atualmente, Passo Fundo conta com duas unidades do órgão, das microrregiões 1 e 2.
— O trabalho do Conselho na esfera preventiva ainda é tímido. Não por falta de vontade, mas porque há falta de efetivo, estrutura administrativa e suporte técnico. há tempos já comportamos a necessidade de um terceiro conselho tutelar, visto a grande demanda.
Como denunciar a violência sexual em Passo Fundo
Conselho Tutelar
- Endereço: Rua Moron, 2624 — bairro Boqueirão
- Contatos: (54) 3317-1636 / 3312-3699 / 3312-1588
- Atendimento 24h da microrregião 1: (54) 9998-1051 ou e-mail conselhomicro1@pmpf.rs.gov.br
- Atendimento 24h da microregião 2: (54) 99975-9309 ou e-mail conselhomicro2@pmpf.rs.gov.br
Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (Comdica)
- Endereço: Rua Morom, 2968 — Ed. Becker Sala 3-5 — bairro Boqueirão
- E-mail: comdica@pmpf.rs.gov.br ou corregedoriactpf@pmpf.rs.gov.br
Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA)
- Endereço: Rua Bento Gonçalves, 720 — Centro
- Telefone: (54) 3318-1400