Por Luciana Temer, advogada, professora doutora da PUC-SP e presidente do Instituto Liberta
Os dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2024, referentes às ocorrências policiais registradas em 2023, nos mostram a seguinte situação: cinco crianças e adolescentes de até 13 anos estuprados por hora no Brasil. Mas como o cenário não é igual no país inteiro, vamos trazer o quadro geral para, na sequência, olhar para o Rio Grande do Sul.
Somados, os registros de estupro e estupro de vulnerável (aqueles contra menores de 14 anos e pessoas impedidas de decidir por incapacidade permanente ou temporária) subiram 6,5% em um ano, para 83.988, em 2023. Em 61,6% dos casos, a vítima tinha até 13 anos e, em 88% deles, era menina.
Como nos anos anteriores, a residência continua a ser o local mais perigoso para crianças e adolescentes no que tange à prática de violência sexual
Como nos anos anteriores, a residência continua a ser o local mais perigoso para crianças e adolescentes no que tange à prática de violência sexual — segundo os registros, 65% dos crimes aconteceram dentro de casa. Em relação à autoria, 63,3% dos crimes foram praticados por familiares.
Esses dados se viram tristemente refletidos na situação dos abrigamentos provisórios em razão das enchentes no Rio Grande do Sul. Quando houve denúncias de abuso sexual de meninas nesses espaços, verificou-se que os crimes eram praticados por familiares e seguramente já ocorriam na casa das vítimas.
O Estado teve 4.120 registros de estupro de vulnerável em 2023, contra 4.396 em 2022, o que dá uma taxa de 37,9 ocorrências por 100 mil habitantes, acima da média nacional (de 31,6 ocorrências).
O que precisa ser olhado com cuidado é se a queda de 6,3% dos registros representa de fato uma diminuição de casos ou se, por alguma razão, um maior silenciamento das vítimas. No Brasil, os únicos Estados com redução foram: Amapá (-3,4%), Maranhão (-0,6%), Rio de Janeiro (-5%), Rio Grande do Sul (-6,3%), Roraima (-6,9%) e Tocantins (-4,5%).
Fato é que, independentemente das variações entre Estados e de um ano para outro, os dados existentes deveriam ser suficientes para pararmos tudo e começarmos a discutir, verdadeiramente, como enfrentar essa violência. Vamos fazer isso?