Por Gabriela Ferreira, consultora em inovação e professora da PUCRS
Sustentabilidade é algo que diz respeito à sobrevivência de todos nós, embora seja sabido que pessoas, empresas e países contribuem de forma diferente para a sustentabilidade e que as consequências da sua falta não afetam a todos da mesma maneira.
Pesquisa realizada pela Delloite em março de 2023, com 24 mil respondentes de 20 países, revelou que as pessoas mais pobres dizem ter menos condições de agir em relação à crise climática. Surpresa? Nenhuma, e vamos ver por quê.
As pessoas da metade mais rica do planeta são responsáveis por 86% das emissões de carbono
Enquanto 46% dos mais ricos estão dispostos a trocar de emprego, procurando uma organização com estratégias mais sustentáveis, apenas 20% das pessoas de baixa e média renda estão propensas a isso. Bastante lógico, pois é uma questão de oportunidade: no Brasil, dados do IBGE apontam que 81% dos desempregados há mais de dois anos são das classes D e E.
A pesquisa também avaliou a propensão a doar dinheiro: 24% entre as pessoas de renda alta e somente 10% entre as de renda baixa e média. Quando a realidade mostra, no exemplo do Brasil, que os 1% mais ricos receberam 39 vezes a renda da metade da população brasileira, isso também é previsível.
Enquanto 59% das pessoas de maior renda dizem optar por produtos sustentáveis, apenas 42% dos mais pobres relatam o mesmo, alegando o elevado preço dos tais produtos. Por outro lado, os indivíduos de renda alta são os menos dispostos a reduzir alguns confortos e mudar hábitos como viagens aéreas e alimentação. Eu considero o percentual dos mais pobres muito elevado, comparativamente, já que são pessoas com dificuldade de manter suas necessidades básicas.
É preciso muito cuidado ao avaliar qualquer tipo de pesquisa. Naturalmente, não é possível dizer que os mais pobres são menos sustentáveis, como uma leitura simplória dos resultados poderia apontar. Trata-se, sim, de falta de opção. Além disso, são exatamente os mais pobres os mais afetados pelo impacto da insustentabilidade, seja ela ambiental, social ou econômica. E, no entanto, de acordo com o portal especializado Carbon Brief, essas pessoas liberam apenas 14% dos gases poluentes no planeta, enquanto as que fazem parte da metade mais rica do planeta são responsáveis por 86% das emissões de carbono.
No lado dos que têm opção, segundo a Farfetch, a compra de produtos de luxo sustentáveis – sim, essa categoria já existe – cresceu 11% em 2022. A sustentabilidade parece estar se tornando mais um item de desejo no seletivo mundo do consumo. E, se for assim, tem algo muito errado que não está certo.