Entre os entes federados, são os municípios, com seus órgãos e autoridades, os mais próximos da população, sentindo suas demandas e sendo pressionados no dia a dia para atendê-las em áreas essenciais como saúde, educação, assistência social e obras necessárias para oferecer uma infraestrutura adequada, nas áreas urbanas ou rurais. Mas, a despeito do tamanho de suas atribuições, são os que ficam com a menor parte da distribuição do bolo tributário, criando uma situação contraditória e injusta. Enquanto a União abocanha 50% dos impostos recolhidos no país, os Estados ficam com 31%, e os municípios, com apenas 19%.
A promessa de menos Brasília e mais Brasil, um dos compromissos do então candidato à Presidência Jair Bolsonaro, precisa ser colocada em prática
Se essa distorção já se mostrava nociva e ilógica, caminha para se transformar em uma adversidade ainda maior a partir de 2021. As novas gestões – mesmo no caso de prefeitos reeleitos – devem assumir sob a ameaça de enfrentar um cenário desafiador composto por uma queda de arrecadação causada pela crise gerada pela pandemia, associada à possível necessidade de maiores gastos pelo aumento da procura por serviços. Entre eles, uma maior busca por atendimento em especialidades de saúde represadas por conta da prioridade ao combate ao novo coronavírus e, na educação, pela inevitabilidade de recuperar os prejuízos à aprendizagem decorrentes do longo fechamento das escolas.
Esta dura realidade batendo à porta dos gestores locais torna ainda mais urgente a necessidade de descentralizar, ao lado das responsabilidades, os meios para que os municípios possam fazer frente à pressão que se avizinha. A promessa de menos Brasília e mais Brasil, um dos compromissos do então candidato à Presidência Jair Bolsonaro, precisa ser colocada em prática. Um caminho mais curto entre os impostos recolhidos e a sua destinação final está a serviço da eficiência e amplia as possibilidades de os anseios e necessidades da população serem melhor atendidos. A política do pires na mão que hoje tem de ser praticada pelos prefeitos abre brechas para conchavos, corrupção e clientelismo, práticas cada vez mais rechaçadas pela sociedade. A reforma tributária a ser levada adiante, portanto, precisa obrigatoriamente aumentar a fatia dos municípios na repartição do arrecadado e, na revisão do pacto federativo, é imperioso fazer justiça entre atribuições e distribuição de recursos.
Enquanto essas pautas estruturantes não avançam, é essencial ao menos que a Câmara vote logo, em segundo turno, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 391, que prevê elevação escalonada de 1% nos repasses de tributos ao Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Sabe-se que é apenas um atenuante, mas, de qualquer forma, é uma maneira de garantir algum aumento de repasse no curto prazo. É indispensável ainda a pronta aplicação da lei que regulamenta a nova forma de cobrança do principal tributo municipal, o ISS, que prevê os recursos de certos serviços sendo recolhidos na cidade onde o consumidor reside, e não mais na praça da sede da empresa prestadora. Beneficiará, especialmente, as pequenas comunidades.
Um recente levantamento do Tribunal de Contas do Estado (TCE) detectou, entre 2015 e 2019, avanços significativos na gestão dos municípios gaúchos em indicadores importantes. No período, o percentual de prefeituras com superávit subiu de 71% para 80%. A quantidade de gestões com as despesas com pessoal acima do aceito pela Lei de Responsabilidade Fiscal caiu de 37% para 16%. Todo esse esforço corre agora riscos diante das incertezas nascidas da pandemia. A busca por aprimorar a eficiência e a racionalização dos gastos se impõe, mas será insuficiente se Brasília continuar procrastinando reformas basilares para o justo e indispensável fortalecimento dos municípios.